
O médico-veterinário desempenha um papel essencial na garantia da segurança e da qualidade dos produtos de origem animal consumidos pela população
Muito além do cuidado com pets, sua atuação percorre toda a cadeia produtiva – da criação ao consumo final.
A médica-veterinária especialista em Tecnologia e Inspeção de Produtos de Origem Animal, mestre em Produção Animal e doutora em Clínica Médica e Epidemiologia, Dúnia Ibrahim Campos, fala sobre a atuação estratégica do profissional veterinário na garantia da segurança alimentar, na prevenção de zoonoses e na proteção da saúde pública, especialmente no contexto da fiscalização de alimentos de origem animal.
Como é a atuação do médico-veterinário na segurança dos alimentos?
Dúnia Campos: Na produção, somos responsáveis pela saúde dos rebanhos, elaborando programas de vacinação, controlando doenças, promovendo o bem-estar animal e garantindo práticas sanitárias adequadas. Isso evita a transmissão de zoonoses e assegura a qualidade de carnes, leites e derivados.
Na inspeção, realizamos exames rigorosos antes e depois do abate, identificando alterações sanitárias e impedindo que produtos impróprios cheguem ao consumidor. Nossa análise técnica garante que apenas alimentos seguros sejam comercializados.
Na fiscalização, atuamos em órgãos públicos para assegurar o cumprimento da legislação sanitária. Inspecionamos estabelecimentos, coletamos amostras para análises laboratoriais e combatemos práticas irregulares como o abate clandestino e fraudes alimentares.
O médico-veterinário é peça-chave na promoção da saúde pública, sendo a espinha dorsal da segurança alimentar. Sua atuação técnica, ética e social contribui diretamente para a qualidade dos alimentos e o bem-estar da população.
Quais são os principais riscos à saúde pública quando não há a presença de um médico-veterinário na inspeção de produtos de origem animal?
Dúnia Campos: A ausência de médicos-veterinários na inspeção de produtos de origem animal (POA) representa um risco gravíssimo à saúde pública, impactando diretamente a segurança alimentar. Sem a fiscalização e o conhecimento técnico desses profissionais, uma série de problemas pode surgir:
- Contaminação microbiológica: microrganismos patogênicos como Salmonella, Escherichia coli (E. coli), Listeria monocytogenes e Campylobacter podem estar presentes na carne, leite, ovos e derivados. A falta de inspeção adequada permite que esses agentes contaminem os produtos, causando intoxicações alimentares severas, com sintomas que vão de diarreia a complicações neurológicas e, em casos extremos, à morte.
- Resíduos químicos e farmacológicos: o uso inadequado de medicamentos veterinários, hormônios e agrotóxicos pode deixar resíduos nos alimentos, que sem inspeção, não são detectados. Isso causa danos à saúde humana a longo prazo, como resistência antimicrobiana, distúrbios hormonais e alergias.
- Doenças zoonóticas: enfermidades como tuberculose, brucelose, cisticercose, hidatidose e toxoplasmose podem ser transmitidas por alimentos contaminados. A inspeção veterinária identifica e retira da cadeia produtiva os animais ou partes doentes.
- Adulteração e fraude: a ausência de fiscalização favorece práticas irregulares, como o uso de corantes proibidos, substituição de ingredientes e aditivos em excesso, prejudicando o consumidor economicamente e sanitariamente.
- Condições higiênico-sanitárias precárias: sem a supervisão de um profissional capacitado, as instalações podem operar com equipamentos sujos e manuseio inadequado, aumentando o risco de contaminação cruzada.
Como a atuação veterinária contribui para o combate ao abate clandestino e à comercialização de produtos impróprios?
Dúnia Campos: A presença do médico-veterinário é central nesse combate:
- Inspeções ante e post mortem: a análise dos animais antes e depois do abate garante que apenas carnes seguras cheguem ao consumidor.
- Controle de qualidade e rastreabilidade: o veterinário assegura que os processos estejam documentados, padronizados e que os produtos possam ser rastreados até a origem.
- Fiscalização de estabelecimentos: frigoríficos, laticínios, granjas e comércios são vistoriados quanto às condições sanitárias, higiene e conformidade legal.
- Combate direto à clandestinidade: participa de ações conjuntas com órgãos de segurança, apreensão de produtos e interdição de estabelecimentos.
- Educação e conscientização: campanhas informam a população sobre os riscos dos produtos sem inspeção e incentivam a aquisição de alimentos com selos oficiais (SIF, SIE, SIM).
Quais os desafios enfrentados pelos veterinários nas etapas de fiscalização e inspeção em regiões afastadas?
Dúnia Campos: Os principais desafios incluem:
- Falta de profissionais: muitos municípios carecem de veterinários fiscais, o que sobrecarrega os que estão na ativa.
- Infraestrutura deficiente: ausência de laboratórios, veículos e equipamentos adequados limita a fiscalização.
- Logística precária: dificuldade de acesso a regiões remotas compromete a atuação regular.
- Pressão e ameaças: profissionais enfrentam riscos ao fiscalizar redes clandestinas.
- Baixo acesso à informação: a população em áreas isoladas desconhece os riscos dos produtos não inspecionados.
- Legislação defasada: normas desatualizadas dificultam a atuação eficaz dos veterinários.
Como a atuação veterinária se conecta ao conceito de Saúde Única?
Dúnia Campos: A Saúde Única (One Health) é a integração entre a saúde animal, humana e ambiental. Os veterinários têm papel essencial:
- Prevenção de zoonoses: sua atuação impede que doenças passem dos animais aos humanos.
- Segurança alimentar: fiscalizam e garantem alimentos livres de contaminação e resíduos.
- Controle da resistência antimicrobiana: monitoram o uso de antibióticos e evitam práticas que aceleram a RAM.
- Proteção ambiental: atuam na prevenção da poluição e no controle de doenças em animais silvestres.
- Vigilância epidemiológica: são essenciais para a identificação precoce de surtos com potencial pandêmico.
Em resumo, o médico-veterinário não cuida apenas da saúde animal, mas também protege e conecta a saúde das pessoas e do meio ambiente.
VEJA MAIS:
- Cidade mais fria do Brasil tem sua economia sustentada pela pecuária e agricultura
- Já testou? Carne maturada com mel virou a nova tendência da maturação
ℹ️ Conteúdo publicado pela estagiária Ana Gusmão sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira
Quer ficar por dentro do agronegócio brasileiro e receber as principais notícias do setor em primeira mão? Para isso é só entrar em nosso grupo do WhatsApp (clique aqui) ou Telegram (clique aqui). Você também pode assinar nosso feed pelo Google Notícias
Não é permitida a cópia integral do conteúdo acima. A reprodução parcial é autorizada apenas na forma de citação e com link para o conteúdo na íntegra. Plágio é crime de acordo com a Lei 9610/98.