Abate de fêmeas supera o de machos pela primeira vez desde 1997; o que esperar?

Pressão de custos levou produtores a liquidar matrizes em 2025, ou seja, aumento no abate de fêmeas; efeito imediato foi recuperação dos preços e, para 2026, o setor projeta menos oferta de bezerros e carne, com tendência de valorização.

Depois de um período prolongado de margens apertadas, a pecuária de corte brasileira viveu em 2025 uma virada importante, especialmente na segunda metade do ano. A recuperação dos preços do boi gordo e do bezerro veio acompanhada de um movimento estrutural que não se via há quase três décadas: o abate de fêmeas superou o de machos pela primeira vez desde 1997, segundo dados oficiais.

De acordo com o IBGE, mais de 15 milhões de fêmeas (entre vacas e novilhas) foram abatidas ao longo do ano, alterando a composição do rebanho e sinalizando mudanças relevantes para a oferta futura de animais e de carne. O fenômeno reflete decisões tomadas no campo em resposta a custos elevados, necessidade de caixa e readequação do sistema produtivo.

“Esse ano, tivemos um abate de fêmeas muito alto, porque o produtor rural precisava reduzir despesas e fazer caixa para o custeio da fazenda. Houve um abate de fêmeas recorde no país, que responderam por aproximadamente 50% do total de bovinos abatidos”, explica Manoel Lúcio Pontes Morais, coordenador técnico estadual de Bovinocultura da Emater-MG.

Números que explicam a virada

O levantamento mais recente do IBGE, divulgado em setembro, mostra que no segundo trimestre de 2025 o abate de fêmeas cresceu 16,0%, totalizando 19,35 milhões de cabeças, na comparação com o mesmo período de 2024. Dentro desse volume, as novilhas representaram 33% do total, com 5,05 milhões de cabeças, avanço expressivo de 23,1% em relação ao ano anterior.

Esse descarte elevado de matrizes tem um efeito claro para o ciclo pecuário. Com menos fêmeas disponíveis para reprodução, a projeção para 2026 é de redução na oferta de bezerros, o que tende a apertar a disponibilidade de animais para engorda e, na ponta final, diminuir a oferta de carne no mercado, sustentando preços mais altos.

Eficiência ajuda a mitigar perdas no rebanho

Apesar da redução do número de matrizes, especialistas avaliam que parte desse impacto pode ser compensada por ganhos de eficiência dentro da porteira. A pecuária brasileira avançou em genética, nutrição e manejo, encurtando ciclos produtivos e melhorando índices reprodutivos.

“As fêmeas estão parindo mais cedo e com melhor intervalo de partos; isso é resultado do melhoramento genético e dos ganhos em nutrição, reprodução e manejo, refletindo em melhoria para toda a cadeia”, avalia Manoel Lúcio Pontes Morais.

Outro fator relevante é o avanço da terminação intensiva. A engorda em confinamento cresceu em 2025 e deve continuar ganhando espaço em 2026, favorecida por maior previsibilidade e estabilidade no custo dos grãos, o que ajuda a reduzir a idade de abate e aumenta a produtividade por área.

Pecuária competitiva sustenta exportações

No cenário externo, a pecuária brasileira manteve forte competitividade ao longo de 2025. Mesmo diante de restrições em alguns mercados, como o embargo dos Estados Unidos, o país diversificou destinos e acelerou os embarques.

Em novembro, o Brasil exportou 356 mil toneladas de carne bovina, crescimento de 36,5% frente ao mesmo mês de 2024, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços, compilados pela Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes.

Em receita, o desempenho foi ainda mais expressivo: alta de 51,9%, com vendas de US$ 1,87 bilhão e 318 mil toneladas de carne in natura exportadas. A China manteve-se como principal destino, respondendo por cerca de metade da receita, seguida por União Europeia e Rússia.

“O Brasil nunca exportou tanta carne em termos de volume e saldo de vendas, embora já tenhamos tido épocas com a cotação da arroba mais alta. Isso mostra o nível de eficiência e competitividade da nossa pecuária”, destaca o coordenador da Emater-MG.

O que esperar para pecuária em 2026

Com mercado interno mais cauteloso, mas demanda externa firme e um cenário de oferta mais restrita de animais, as projeções para 2026 indicam preços consistentes e tendência de valorização tanto para a arroba do boi gordo quanto para o bezerro.

Mesmo no primeiro semestre — período tradicionalmente marcado por maior oferta —, a expectativa do Departamento Técnico da Emater-MG é de manutenção de patamares remuneradores, sustentados pela menor disponibilidade de fêmeas, pelo ajuste do rebanho e pela eficiência crescente dos sistemas produtivos.

Em síntese, o abate recorde de fêmeas em 2025 marcou uma inflexão no ciclo pecuário. O movimento ajudou a reorganizar o mercado no curto prazo e lança as bases para um novo momento da pecuária brasileira, com menos oferta, maior eficiência e preços mais sustentados nos próximos anos.

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