Abate de javalis atinge mais de 500.000 animais em 2025, mas controle da praga continua ineficaz

Especialistas alertam que o número real do abate de javalis pode ser até cinco vezes maior e apontam falhas nas políticas públicas de combate à espécie invasora, que já ameaça lavouras, rebanhos e a saúde pública em várias regiões do país.

A crescente invasão de javalis no Brasil atingiu proporções alarmantes em 2025. Segundo dados do Sistema de Informação de Manejo de Fauna (Simaf), operado pelo Ibama, mais de 511 mil javalis foram abatidos entre janeiro e agosto, estabelecendo um novo recorde histórico de controle populacional da espécie.

Apesar do volume expressivo, especialistas alertam que os números estão subnotificados. De acordo com o professor Paulo Bezerra, da USP/ESALQ-LOG, o total real pode ser até cinco vezes maior. “Os relatórios são autodeclaratórios e os caçadores, por questões de burocracia e tempo, frequentemente omitem a quantidade real abatida”, afirma.

Avanço da espécie e impactos diretos

Originário da Europa e da Ásia, o javali não possui predadores naturais no Brasil, o que, somado à sua rápida taxa de reprodução, tornou o animal uma praga fora de controle, especialmente nas regiões Centro-Oeste, Sul e Sudeste.

Em Mato Grosso do Sul, os prejuízos são amplamente relatados por produtores rurais e ambientalistas. Lavouras de milho, soja, cana-de-açúcar e pastagens estão entre as mais afetadas, sendo destruídas durante o deslocamento e alimentação dos animais. Além das perdas econômicas, há riscos sanitários sérios, como a transmissão de doenças que ameaçam diretamente cadeias produtivas da agropecuária brasileira.

Segundo Fernanda Lopes de Oliveira, consultora técnica da Famasul, “eles representam um risco sanitário para diversas cadeias produtivas, por poderem transmitir doenças e comprometer a bioseguridade”. A Embrapa também alerta para danos ambientais e a possível veiculação de patógenos, o que aumenta os riscos à saúde humana e animal.

“Eles representam um risco sanitário para diversas cadeias produtivas, por poderem transmitir doenças e comprometer a bioseguridade”, disse Oliveira.

Estimativas futuras preocupam

Números, mesmo que sejam verídicos os dados divulgados pelo Ibama, ainda estão muito abaixo da necessidade. Para 2025, a previsão é de que mais de 1 milhão de javalis precisem ser abatidos, segundo a Associação Brasileira de Caçadores Aqui Tem Javali. O presidente da entidade, Rafael Salerno, aponta que a situação atual é resultado da “incompetência e complacência das autoridades brasileiras”, destacando que a erradicação total da espécie já é considerada inviável. O foco, agora, deve ser em reduzir ao máximo os danos causados.

abate de javalis - ibama
Gerado pelo Compre Rural com informações e dados do IBAMA,USP/Esalq

Estudos da entidade indicam que até 40% das plantações são perdidas em regiões infestadas, e doenças como peste suína clássica e febre aftosa representam riscos diretos à pecuária nacional.

Entraves legais e burocráticos

Apesar da urgência, o controle efetivo da praga esbarra em burocracias. Caçadores enfrentam lentidão na liberação de licenças, além de crescente fiscalização. Mais de mil licenças teriam sido suspensas, e processos de autorização para armas estariam parados há meses no Exército.

Na Câmara dos Deputados, o debate ganhou força. Durante audiência pública realizada em agosto, a Comissão de Agricultura ouviu produtores, caçadores e pesquisadores. O Projeto de Lei 4.253/2025, proposto pelo deputado Alceu Moreira (MDB-RS), busca descentralizar a competência do controle para estados e municípios, permitindo também o uso comercial da carne e subprodutos, desde que com fiscalização sanitária adequada.

Contudo, há resistência de entidades ambientais. Pesquisadores como Virgínia Santiago (Embrapa) e representantes do Fórum Animal alertam que a caça desregulada não resolve o problema populacional e pode agravar riscos sanitários. A liberação da carne para consumo também foi questionada por falta de garantia de inocuidade.

Caminhos possíveis e o que está em jogo no combate e abate de javalis

Diante da ameaça crescente, especialistas apontam que ações coordenadas, baseadas em ciência, com diagnósticos, metas, investimentos em pesquisa e uso de tecnologias como rastreamento e anticoncepcionais devem ser priorizadas. A diretora do Ibama, Lívia Karina Martins, afirmou que o órgão trabalha em um novo sistema informatizado para agilizar as autorizações de controle e melhorar a rastreabilidade.

Enquanto isso, produtores seguem enfrentando a invasão de manadas cada vez maiores, que já alcançam áreas urbanas e colocam vidas em risco, inclusive com relatos de ataques a animais domésticos e pessoas. “Para cada javali abatido, nascem dez”, resumiu Osny Zago, do Sindicato Rural de Sacramento (MG).

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