Adoção de tecnologias de reprodução assistida pode favorecer resultados técnico-econômicos da cria

Acompanhamento do rebanho no âmbito do Projeto Campo Futuro mostraram que é possível expandir a margem por área deste sistema de produção.

Diante da crescente competição pelo uso de terras e os desafios que os altos custos de produção trazem ao bolso dos pecuaristas brasileiros, a adoção de tecnologias que auxiliem no aumento da eficiência produtiva se torna cada vez mais necessária. Algumas ferramentas podem ajudar a garantir a rentabilidade dos sistemas pecuários.

No contexto da pecuária de cria, os produtores enfrentam ainda um fator complicador: com a grande oferta de animais desmamados, decorrente da recomposição do plantel de matrizes nacional, os valores dos bezerros desmamados caíram nos primeiros meses de 2023, afetando de forma negativa a remuneração obtida por estes pecuaristas.

O Indicador do Bezerro Esalq/BM&FBovespa encerrou o mês de março cotado a R$ 2.450,66 (ou R$ 11,87/kg), sendo 15% abaixo do mesmo mês de 2022, em termos nominais. Do lado dos custos de produção, dados do Projeto Campo Futuro apontam que, entre março/22 e março/23, houve queda de 0,69% no Custo Operacional Total (COT, referente aos desembolsos e depreciações) dos sistemas de produção de cria, na “média Brasil”.

Vale ressaltar que a redução dos custos foi bem menos intensa do que a observada na receita bruta (RB) no período, indicando que as margens deste perfil de sistema continuam pressionadas.

A despeito da redução das margens, observadas nos últimos meses, é notável o espaço para crescimento que os sistemas de cria ainda possuem em território nacional.

Em termos de capacidade produtiva, as propriedades amostradas pelo Projeto Campo Futuro apresentaram, em média, uma produtividade de 2,2 arrobas por hectare. Aliado a isso, a ponderação dos gastos neste sistema aponta um impacto dos custos fixos, com os pagamentos de colaboradores representando 21% do COT, e as depreciações de benfeitorias, máquinas e outros itens de inventário, sendo responsáveis por mais 20% do valor total.

Com isso, pode-se afirmar que é possível expandir a margem por área destes sistemas de produção ao diluirmos estes custos com uma maior capacidade produtiva. Para tal, é necessário maior investimento com insumos para a produção animal.

Dentre as tecnologias aplicáveis à cria, a reprodução assistida se destaca como uma das mais difundidas. Quando corretamente aplicada, traz benefícios como a melhoria do material genético da propriedade (através de touros geneticamente superiores), a redução do intervalo entre partos (através do controle sobre estações de monta) e a produção de animais de maior valor.

Tomando por base os custos médios de insumos amostrados pelo Projeto Campo Futuro, estima-se que a despesa média com aquisição de insumos seja de R$ 87,50/ matriz, para um protocolo com duas tentativas de inseminação em 32 dias de duração (Gráfico 1). Adicionalmente, acrescenta- -se à estimativa R$ 25,00 com o pagamento do serviço de veterinários para a execução e acompanhamento dos protocolos no rebanho.

Com isso, o custo médio em março foi estimado em R$ 112,50/matriz. Apesar do aumento observado nos últimos meses com o custo de insumos, observa-se que, ao estimar a relação de troca entre o preço do kg do bezerro e o custo com a adoção de protocolos de IA, o peso adicional para se pagar os insumos e a mão de obra está próximo da média dos últimos cinco anos (Gráfico 2).

Com o manejo correto, a expectativa de taxa de desmame após o protocolo e o repasse com touros atinge os 80%, elevando ainda mais o número de arrobas comercializadas por área.

Em termos de retorno direto com o uso do material genético de touros melhoradores, dados do sistema integrado de avaliação genética 2023 da Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ) apontam que na bateria de 498 touros top 10% avaliados, estes apresentaram um efeito direto para a DEP de peso à desmama de, em média, 13,4 kg.

Buscando simular os efeitos da adoção de um protocolo de IATF em sistema de cria, tomou-se por base a propriedade típica de Três Lagoas (MS), amostrada pelo Projeto Campo Futuro. A propriedade apresenta um rebanho de 350 matrizes em 525 hectares de pastagem, sem estação de monta, e com uma taxa de desmame média de 60,6%.

No atual sistema, é possível desmamar em média 212 bezerros, entre machos e fêmeas. A fim de garantir a reposição de suas matrizes, são retidas 69% das fêmeas desmamadas. Por fim, é realizada a comercialização de 106 machos e 33 fêmeas, pesando 190 kg e 170 kg respectivamente.

Devido à falta de padronização dos lotes desmamados, e ao peso inferior ao desejado pelo mercado de recria, a remuneração obtida no sistema avaliado se encontra abaixo do indicador do bezerro, sendo equivalente a R$ 10,27/kg para machos, e R$ 9,50/kg para fêmeas.

No cenário de queda de preços de bezerros, o sistema tem como principal receita o descarte de matrizes, representando 45% da sua RB. Com isso, ao levarmos em consideração o COT da propriedade, em março/23, observou-se uma margem líquida (RB menos COT) foi calculada em R$ 59,95/ha de pastagem.

Ao ser considerada a adoção do protocolo de IATF no sistema, observa-se um acréscimo de R$ 75,00 no COT/ha. Caso consideremos apenas o aumento na taxa de desmame, dos 60,6% amostrados para os potenciais 80%, observaríamos um aumento de 23% no total de cabeças desmamadas. Por sua vez, isso seria equivalente a um acréscimo de 37% na receita bruta do sistema, considerando-se a manutenção da taxa de descarte anual de 20% das matrizes e maior disponibilidade de fêmeas desmamadas para comercialização.

Em mais um possível cenário, ao considerarmos também o acréscimo potencial de 13,4 kg ao peso de desmama destes animais, além do aumento na taxa de desmame, a adição é de 44% na receita bruta do sistema.

Por fim, se considerado ainda o ajuste sobre o valor de comercialização dos bezerros, passando a adotar o valor do indicador do bezerro Easlq/BM&F/Bovespa como balizador (e mantendo o diferencial de 8% entre o valor por kg de machos e fêmeas), a receita bruta potencial com a adoção do pacote tecnológico é 59% superior ao atualmente observado pelo sistema (Tabela 1).

Destaca-se aqui, que o resultado obtido pelos diversos sistemas pecuários nacionais depende de um número grande de variáveis, que podem ser avaliadas apenas com o auxílio de profissionais qualificados. Os modelos aqui discutidos têm por finalidade demonstrar o potencial da tecnologia, quando corretamente aplicada.

Como qualquer mudança estrutural em um sistema de produção, a adoção da IATF demanda que outras intervenções ocorram para que o potencial genético dos animais possa ser expresso.

Estima-se que o aumento na suplementação das matrizes no rebanho, responsáveis por gerar os animais comercializados, elevaria em 7,4% o COT do sistema. Ao adicionarmos o gasto com os insumos e a mão de obra para a IATF, o COT por hectare para a cria é estimado em R$ 1.033,05, contra os originais R$ 891,86.

Com isso, a margem líquida da Cria passa dos R$ 59,95/ha para um potencial de R$ 477,32/ha, ou uma lucratividade (margem líquida dividida pela receita bruta) de 31,6%, contra o original de 6,3%.

Desta forma, temos um aumento de quase 7 vezes sobre a margem do sistema amostrado. É importante frisar que a intensificação do sistema produtivo também traz seus riscos, que devem ser avaliados de forma a garantir o sucesso da atividade.

Sobretudo em regiões onde a competição pelo uso de áreas se faz crescente, a longevidade dos sistemas de produção pecuários depende da obtenção de resultados economicamente atrativos.

Na análise aqui descrita, objetivou-se avaliar o resultado da adoção de uma tecnologia que eleva o potencial produtivo individual dos animais do rebanho, que trouxe indícios da alta capacidade de escalonamento do sistema de produção.

Quando aplicada em conjunto com técnicas que permitam a verticalização da propriedade, elevando-se a capacidade de suporte no sistema, há sinergia entre os investimentos, com potencial para elevar-se, ainda mais, os índices obtidos.

Fonte: Assessoria Cepea

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