Belagrícola pede recuperação extrajudicial e propõe forte deságio da dívida de R$ 3,8 bilhões

O novo pedido da Belagrícola tem escopo mais restrito: trata da renegociação de parte das dívidas com credores quirografários, categoria que engloba todos os produtores rurais prejudicados na safra 2024/25 e que somam R$ 2,2 bilhões em créditos sem garantias.

A Belagrícola, tradicional distribuidora de insumos agrícolas com sede no norte do Paraná e controlada pelo grupo chinês Pengdu, protocolou na madrugada do dia 11 de dezembro de 2025 um plano de recuperação extrajudicial. O pedido ocorre logo após o vencimento da tutela cautelar de 60 dias, que havia suspendido execuções e pagamentos de dívidas junto aos credores.

O caso volta à análise do juiz Emil Tomas Gonçalves, da 11ª Vara Cível e Empresarial de Londrina, que agora avaliará a concessão de uma nova suspensão por 90 dias para que a companhia avance nas negociações com seus credores. Plano propõe pagar integralmente apenas quem seguir negociando com a empresa; especialistas apontam riscos e pressão indevida sobre os credores.

A proposta marca uma nova e controversa etapa na reestruturação da empresa, que acumula uma dívida estimada entre R$ 3,2 bilhões e R$ 3,8 bilhões, dos quais R$ 2,2 bilhões se referem a créditos sem garantia, concentrados em produtores rurais que comercializaram com a companhia na safra 2024/25 .

Entenda o que está em jogo

A recuperação extrajudicial é um instrumento previsto na legislação brasileira que permite à empresa renegociar parte de suas dívidas de forma privada com os credores, evitando o trâmite mais complexo e custoso da recuperação judicial. Para que o plano avance, a Belagrícola precisa comprovar a adesão inicial de pelo menos 33,33% dos créditos sujeitos, patamar que já teria sido superado, com 35% do passivo já apoiando a proposta. Entre os credores já favoráveis estão Província de Securitização, Basf, Santander, Citibank, Syngenta, entre outros.

Se o juiz homologar o plano e a empresa conseguir ampliar o apoio para 50%, a proposta poderá ser imposta a todos os credores da mesma classe, inclusive os dissidentes.

Dois caminhos, duas consequências: quem apoia x quem resiste

O plano da Belagrícola cria um forte contraste entre os produtores que aceitarem o acordo e os que o recusarem:

  • Para os apoiadores:
    • Pagamento integral do crédito, sem deságio;
    • Correção pelo IPCA;
    • Quitação em cinco parcelas semestrais, com início em maio ou outubro após a homologação;
    • Contrapartidas exigidas:
      1. Entregar ou originar grãos à Belagrícola em volume equivalente a 50% do comercializado na safra 2024/25;
      2. Comprar insumos da companhia no mesmo percentual da última safra.
  • Para os dissidentes:
    • Recebimento de apenas 25% do valor total;
    • Deságio de 75%;
    • Início de pagamento apenas sete anos após a homologação;
    • Quitação também em cinco parcelas semestrais.

Especialistas alertam: plano desequilibra a relação e transfere riscos ao produtor

Para Raphael Condado, advogado especializado em agronegócio, o plano representa uma pressão indevida sobre produtores já prejudicados pela inadimplência da companhia. Ele alerta que a proposta “amarraria o produtor a uma relação comercial futura” como condição para receber aquilo que lhe é de direito. “É praticamente transformar um prejuízo em definitivo”, avalia.

Condado também destaca o risco operacional da proposta, especialmente num ambiente em que os agricultores dependem de previsibilidade e confiança. “Ninguém entrega sua produção futura com segurança se não confia que a revenda vai fornecer os insumos na hora certa”, afirma.

Comparações com o caso AgroGalaxy e busca por investidores

A proposta da Belagrícola foi comparada ao plano da AgroGalaxy, homologado no primeiro semestre de 2025, que não impôs deságio aos produtores rurais, mesmo aos que votaram contra o plano. A escolha de uma estrutura mais punitiva pela Belagrícola gerou críticas e aumentou o debate sobre o uso do instituto da recuperação extrajudicial como instrumento de pressão comercial.

Paralelamente à negociação com os credores, a empresa também busca novos aportes financeiros. A Belagrícola já havia negociado uma venda de participação minoritária para a Bunge, mas a operação foi adiada. Agora, a direção estaria em diálogo com outros investidores, inclusive estrangeiros.

Estrutura da companhia Belagrícola e impacto da crise

Fundada há mais de 40 anos, a Belagrícola atua na distribuição de insumos, originação de grãos e produção de sementes por meio da Bela Sementes. Também integra o grupo a DKBR Agro, que importa defensivos pós-patente da China. A companhia possui 52 unidades de revenda e 58 silos com capacidade de 1,5 milhão de toneladas, sendo 40 próprios.

A crise financeira teria sido agravada pela inadimplência de clientes no agronegócio, somando R$ 1 bilhão em créditos vencidos nos últimos dois anos, além de uma queda de receita registrada em 2024, com prejuízo líquido superior a R$ 400 milhões.

Próximos passos e pressão sobre o Judiciário

Com o plano protocolado, o juiz da 11ª Vara Cível e Empresarial de Londrina avaliará o pedido de suspensão das execuções por mais 90 dias. Durante esse período, a empresa buscará consolidar apoio de 50% dos credores sujeitos. Caso não consiga, a via judicial poderá ser acionada.

O processo tende a mobilizar o setor nas próximas semanas, com forte atenção de produtores rurais, fornecedores, bancos e instituições de crédito agrícola, que observam o desfecho como precedente importante para o setor de insumos e revendas agrícolas no Brasil.

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