Um homem e sua varinha de peroba mudaram a Pecuária Nacional

Homem de visão transformou a pecuária nacional; confira parte da grande trajetória de Celso Garcia Cid, visionário espanhol foi até a Índia buscar o zebu que conhecemos

Ele foi um grande empresário no setor de transportes, fundou a Viação Garcia em 1934 – empresa de ônibus do Parará vendida por R$ 400 milhões em 2010 – mas na pecuária ele teve um papel transformador. Apaixonado pelo Gir, Celso Garcia Cid importou da Índia gado na década de 1960 e formou um dos mais importantes criatórios de nelore do Brasil.

Atualmente a criação está sob responsabilidade da filha Beatriz Garcia Cid e dos netos Gustavo, Guilherme e Gabriel Garcia Cid, que aos 48 anos administra a fazenda que era do avô, falecido em 1972. “Sempre tive como meu maior desafio a responsabilidade de um dia tocar o trabalho que meu avô iniciou”, disse Gabriel.”

Os animais que contribuíram para formar a base de criação da fazenda Cachoeira 2C, foram os touros importados em 1960 o Arjun (Nelore), Krishna (Gir) e Parev (Guzerá).

Sonho de criar gado Zebu

No auge dos seus 50 anos, o visionário espanhol ainda tinha como sonho criar raças zebuínas em sua propriedade, a Fazenda Cachoeira em Sertanópolis no Paraná. Mas, ele queria zebuínos autênticos.

Para realizar esse sonho, Celso viajou para Minas Gerais, porém, na época, os que encontrava em solo brasileiro não eram tão puros e causavam frustração a cada aquisição. Foi então que, em uma conversa com um velho amigo e colaborador da fazenda, Ildefonso Santos, soltou a famosa frase que despertaria ainda mais o desejo do pecuarista em adquirir aquela raça: “Fora de Minas, Zebu só mesmo buscando na Índia”.

Decidido a comprar gado zebu de qualquer jeito para melhorar a genética do gado nacional, Celso Garcia Cid, viaja para a Índia com Ildefonso em 21 de novembro de 1958, sem ter nenhuma ideia de quando poderia voltar ao Brasil. Os homens então, iniciam na Índia, uma busca por animais reprodutores e suas matrizes, encontrando após muita procura, os melhores zebuínos na criação do famoso Marajá de Bhavnagar, cuja família criava zebus há pelo menos 7 séculos.

Importante ressaltar a resiliência do Seo Celso, mesmo sabendo que naquela época não estava liberado a importação de animais vivos. Na terceira edição do livro No tempo do Seo Celso – Não Existe Impossível, Pellegrini detalha a odisseia e a teimosia de Seo Celso em importar da Índia – apesar do pesadíssimo lobby dos fazendeiros de Uberaba – novas matrizes de gado Nelore, Gir e Guzerá, alguns com linhagem registrada por mais de 300 anos.

Celso e seu parceiro Ildefonso dos Santos iniciaram em 1955 uma peregrinação que durou mais de ano por diversas regiões indianas, procurando, escolhendo e comprando as melhores matrizes e abrigando-as em locais arrendados enquanto esperavam para uma viagem épica ao Brasil.

Depois de tudo, vendo que o gado era bom e que nunca houvera ameaça sanitária, os próprios mineiros, antes ferrenhos inimigos, iriam até a fazenda do Seo Celso para ver se conseguiam alguns exemplares. Idealista, Celso não só abriu-lhes as porteiras como vendeu animais e sêmen a preços abaixo do mercado. Criadores latinamericanos e de outros países vieram a Londrina para ver a grande conquista e encomendar crias e sêmen. A pista de pouso da Fazenda Cachoeira ficou tão movimentada que chegou a receber mais de seis aviões em um só dia.

Pecuarista de visão

Todo o trabalho realizado por ele, desde a primeira ida à Índia em 1958 transformou a pecuária nacional e até internacional. Essa primeira importação gerou a aquisição de 113 cabeças, mas, mais da metade – exatamente 60 – foram destinadas a outros pecuaristas, o que segundo ele era uma forma de possibilitar a formação de linhagens, algo indispensável para o melhoramento genético do rebanho.

As raças escolhidas foram Guzerá, Gir e Nelore, porém, na época vigorava uma proibição de importação de animal e, foi somente em 1960 que ele conseguiu realmente trazer as cabeças de gado zebuíno ao Brasil, o que provocou o maior e mais importante choque de sangue na pecuária do país.

De acordo com seus contemporâneos, Garcia Cid sempre foi um homem à frente de seu tempo. Em meados de 1970, por exemplo, ele começou a promover a inseminação do gado, época em que a técnica, hoje corriqueira, era uma grande novidade. O mesmo ocorreu com as transferências de embriões, logo incorporadas à rotina da fazenda. 

celso garcia cid - com sua varinha de peroba
Foto: Fazenda Cachoeira 2C

Outro que retratou Celso Garcia Cid foi o zootecnista José Otávio Lemos, produtor rural, jurado e conselheiro técnico da ABCZ. Segundo ele Celso era uma vara de condução, pois realmente ele mostrou-se um que sabia dirigir os negócios que tocava. “Como curiosidade: Seu Celso usava uma varinha de peroba.”

“Na pecuária, um transformador. A ida dele à Índia no dezembro de 1957, e toda a força empreitada para a importação feita em 1960 de zebuínos criou uma nova e forte etapa para a zebuinocultura nacional e internacional.” – disse o zootecnista.

Nelore e Gir Cachoeira 2C

Neto de Celso, o pecuarista Gabriel Garcia Cid, é o atual presidente da entidade máxima do Zebú, a Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ). Gabriel faz parte da 3ª geração de criadores que, há mais de 64 anos, se dedica à seleção das raças Nelore e Gir na Fazenda Cachoeira 2C. Apesar da reverência, para o neto Gabriel, o segredo da evolução constante na seleção de bons animais não está apenas na herança deixada pelo avô.

melhoramento genético
Montagem CompreRural

“Nesses anos todos, fizemos dois movimentos: preservamos as linhagens POI e passamos a trabalhar no seu melhoramento genético”, diz. Há 25 anos, tanto o rebanho Nelore quanto o Gir são avaliados, em programas oficiais. O Nelore faz parte do programa PMGZ da ABCZ, uma ferramenta que auxilia no processo de seleção em busca de animais superiores. O Gir também está no programa de melhoramento da raça para animais produtores de leite, coordenado pela ABCZ.”

“O objetivo é manter o equilíbrio entre as características raciais dos animais e a sua produtividade”, diz Gabriel. Para ele, os animais POI servem muito bem aos criadores que necessitam refrescar o sangue em seus rebanhos, em razão de acasalamentos consecutivos entre animais aparentados. “Mas não basta apenas ser um animal POI, ele precisa ser superior”, afirma. “De nada adianta ter uma vaca fértil que crie um bezerro leve.”

A fazenda Cachoeira 2C tem uma área de 242 hectares onde são mantidas 250 fêmeas nelore PO e 20 doadoras POI. O resultado dos acasalamentos é de 300 nascimentos por ano. Em outra propriedade bem próxima da 2C, a fazenda Barra Mansa, de 1.400 hectares, estão mais 200 fêmeas Nelore criadas a campo. “Nossa intenção é aumentar o número de animais desse rebanho, para produzir uma quantidade maior de tourinhos e de fêmeas mais rústicas”, diz. Hoje, na maior parte dessa fazenda há cultivos de milho, soja e mandioca.

Herança genética nacional

Foto: Fazenda Cachoeira 2C

Graças ao trabalho árduo e incansável de Celso Garcia Cid, as raças trazidas da Índia sobreviveram e se espalharam por todo o país. Para se ter uma ideia da importância dessa importação, atualmente, cerca de 80% do gado nacional tem genética zebuína composta pelas raças Gir, Nelore e Guzerá. O gado, que se adaptou perfeitamente ao clima brasileiro, hoje é premiado internacionalmente pela qualidade e desponta no cenário internacional com cerca de 1,50 milhões de toneladas exportadas por ano o que rendeu aproximadamente uma receita de US$ 7.966,48 bilhões em 2023.

O gado se adaptou perfeitamente ao clima brasileiro e desponta no cenário internacional.

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