
O manejo inteligente na transição seca-águas é o divisor de águas entre manter e multiplicar a produtividade do rebanho
A pecuária de corte depende diretamente da qualidade do pasto, e cada fase do ano impõe desafios diferentes ao produtor. Entre setembro e outubro, ocorre a chamada transição seca-águas, marcada pelo fim do período de estiagem e pelo retorno gradual das chuvas. Nesse momento, inicia-se a rebrota do capim e a recuperação das pastagens, processo que depende fortemente da intensidade e regularidade das precipitações, da temperatura ambiente, da fertilidade do solo e do manejo aplicado.
Embora traga perspectivas de melhoria na oferta de forragem, essa fase exige atenção redobrada. Isso porque, até que o capim esteja plenamente estabelecido, a pastagem apresenta características que podem limitar o desempenho dos animais.
Entendendo o Cenário da Transição
Durante a transição, o pasto passa por mudanças que impactam diretamente o desempenho animal:
- Persistência de material morto: talos secos e folhas mortas com baixa digestibilidade (<45% de FDN digestível).
- Brotos jovens: folhas verdes, com até 75% de água, alto teor proteico, mas baixo teor de matéria seca — exigindo maior volume de consumo para suprir energia.
- Baixa densidade de bocados: dificuldade de colheita suficiente em cada mordida, aumentando o tempo de pastejo.
O resultado é um déficit nutricional combinado: energia insuficiente, proteína de liberação rápida e baixo aporte de fibras, comprometendo ganho de peso, reprodução e imunidade.
Efeitos Diretos no Desempenho Animal
Estudos recentes da UFV (2025) mostram que, sem suplementação estratégica, a média de ganho de peso vivo diário (GPD) no período seca-águas pode cair de 0,650 kg/dia para 0,280 kg/dia em sistemas extensivos. Além disso:
- Vacas em lactação têm queda na produção de leite de até 22%.
- Bezerros desmamados apresentam maior incidência de diarreia nutricional.
- Animais de engorda perdem condição corporal, elevando o tempo necessário para o abate.
Prevenindo Perdas
Suplementação Proteica-Energética
- Oferecer suplementos com 16% a 20% de proteína bruta e energia adequada para compensar o déficit de carboidratos estruturais.
- Utilizar fontes de proteína verdadeira (farelo de soja, farelo de algodão) combinadas com ureia protegida, para garantir liberação gradual de nitrogênio.
- Ajustar a proporção mineral-proteica para não exceder consumo voluntário e evitar sobrecarga ruminal.
Estratégia “Sequestro/Resgate”
- Manter o gado em piquetes de suporte ou cocho, alimentando com volumoso conservado (silagem, feno ou pré-secado) até que o capim esteja bem enraizado.
- Reduzir pressão de pastejo inicial, permitindo recuperação mais uniforme do pasto.
Fibras de Apoio
- Incluir volumosos fibrosos de alta digestibilidade para melhorar a mastigação e a produção de saliva, evitando acidose ruminal causada por excesso de folhas novas.
Cuidados Especiais na Transição
Ureia
Durante a seca, a ureia é essencial como fonte de nitrogênio. Porém, com o início das chuvas:
- Risco: acúmulo de água no cocho transforma ureia em amônia, causando intoxicação.
- Prevenção: cochos cobertos, furos de drenagem, vistoria diária e descarte de suplementos deteriorados.
Água
- Bovinos de corte consomem 50 a 70 litros/dia no período quente.
- Água limpa e com temperatura inferior a 25°C otimiza ingestão de matéria seca.
- A análise da água deve incluir condutividade elétrica (indicador de sais totais dissolvidos) e presença de coliformes.
Monitoramento de Sanidade
- Aumento de parasitos internos e externos é comum com a umidade inicial.
- Programar controle estratégico de verminoses e carrapatos.
- Observar sinais de clostridioses e doenças entéricas.
Gestão de Pastagens
Em 2025, o pecuarista moderno combina observação de campo com tecnologia de gestão:
- Mapeamento de áreas com imagens de satélite e drones para estimar massa de forragem.
- Registro de taxa de lotação e ganho de peso individual.
- Uso de previsões climáticas regionais para ajustar oferta de suplemento e definir momento de entrada/saída nos piquetes.
Estratégias Avançadas para Alta Eficiência
- Rotação Intensiva: dividir pastos em piquetes menores para controlar pressão de pastejo.
- Adubação de Rebrota: aplicação de NPK de liberação rápida para acelerar crescimento inicial.
- Integração Lavoura-Pecuária (ILP): manter oferta de forragem de qualidade mesmo em transições climáticas irregulares.
- Banco de Proteína: áreas com leguminosas perenes (estilosantes, leucena) para suplementar proteína natural.
Planejamento é a Chave
A transição seca-águas não é apenas uma fase de espera pelas chuvas, mas um período estratégico que define o desempenho do rebanho nos meses seguintes. Em 2025, com custos de insumos elevados e clima mais instável, antecipar decisões e manter manejo nutricional ajustado é o que separa propriedades lucrativas das que apenas sobrevivem.
Um sistema bem manejado nesta fase resulta em:
- Ganho de peso consistente acima de 0,6 kg/dia.
- Melhor taxa de prenhez e desmame.
- Redução de custos emergenciais com suplementação corretiva.
O produtor que planeja a transição seca-águas como um projeto, e não como um improviso, transforma um desafio climático em oportunidade de produtividade.
Escrito por Compre Rural
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ℹ️ Conteúdo publicado pela estagiária Ana Gusmão sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira
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