
Pequenos, resistentes e milenares, os cavalos da raça Garranos vivem em liberdade nas montanhas do norte de Portugal, desafiando o tempo, os lobos e a ameaça de extinção
Ao percorrer as trilhas montanhosas do Parque Nacional da Peneda-Gerês, no norte de Portugal, não é raro se deparar com uma das mais emblemáticas criaturas da região: os cavalos da raça Garranos. De porte pequeno, pelagem castanha e comportamento reservado, esses equinos vivem em liberdade há milênios, mantendo traços selvagens e ao mesmo tempo estreita relação com a história humana da Península Ibérica.
Os Garranos são considerados uma das raças mais antigas da Europa, com origens que remontam a pelo menos 20 mil anos, segundo registros de pinturas rupestres do Paleolítico encontradas em cavernas portuguesas. Eles descendem de um pónei ibérico pré-histórico, adaptado ao clima rigoroso e ao relevo acidentado das serras do norte de Portugal e Galícia.
Estudos genéticos indicam que o Garrano influenciou o surgimento de outras raças europeias, como o cavalo Andaluz. Apesar de serem frequentemente chamados de “póneis” por seu tamanho, que raramente ultrapassa 1,5 metro de altura na cernelha, os Garranos exibem estrutura robusta e grande resistência.
Os cavalos da raça Garranos vivem em estado selvagem ou semi-selvagem, formando bandos em áreas de difícil acesso. No planalto ibérico, compartilham espaço com outras raças de cavalos livres, e cumprem um papel ecológico importante. De acordo com a organização Rewilding Europe, esses equinos contribuem para:
- Manutenção da biodiversidade, ao controlar o crescimento de vegetação densa;
- Prevenção de incêndios florestais, por sua alimentação variada que reduz o material combustível;
- Restauro ecológico, sendo parte de iniciativas como o projeto Rewilding Spain.

Além disso, os Garranos mantêm instintos primitivos de fuga e vida em grupo, essenciais para sobreviver às ameaças naturais da região – especialmente os lobos ibéricos, que ainda caçam esses cavalos nas florestas do Gerês.
Os Garranos apresentam:
- Pelagem predominantemente castanha, com crina escura;
- Corpo compacto e musculoso, ideal para terrenos acidentados;
- Perfil facial côncavo, conhecido como “face em prato”;
- Comportamento dócil, mas alerta, com forte instinto de proteção grupal.
Apesar da vida livre, os Garranos demonstram grande aptidão para o trabalho rural, sendo tradicionalmente usados para transporte, tração leve e até competições de trote.
A população de Garranos de raça pura é crítica: estima-se que restem apenas cerca de 100 indivíduos completamente selvagens, embora milhares vivam em rebanhos semi-selvagens gerenciados no norte de Portugal. Em 1994, a raça foi oficialmente classificada como em perigo de extinção pelo CEREOPA (Centro de Estudos e de Recursos Equinos de Portugal).

Desde então, o governo português e criadores locais atuam em programas de preservação, buscando preservar a genética original e garantir a sustentabilidade ecológica da espécie. A maior ameaça à sobrevivência da raça hoje é a predação por lobos, além da baixa taxa de reprodução e do cruzamento com outras raças.
Mesmo vivendo soltos, os Garranos não perderam totalmente o vínculo com os humanos. Em diversas regiões, eles participam de tradições seculares, como a “Rapa das Bestas”, evento anual em que cavalos selvagens são capturados temporariamente para corte de crinas, vermifugação e marcação antes de serem soltos novamente. Também são usados em atividades turísticas e de ecoturismo, atraindo visitantes interessados na beleza bruta e na história viva da Peneda-Gerês.
Símbolos de resistência natural e cultural, os cavalos Garranos desafiam o tempo e as adversidades, correndo livres entre nevoeiros, rochas e matas fechadas do norte português. Mais do que uma relíquia do passado, são um lembrete da interdependência entre natureza e civilização — e da urgência em preservar o que ainda resta do selvagem na Europa.
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