Consórcio de gramíneas com leguminosas em ILP eleva ganho de peso de bovinos e reduz emissões de metano

Estudo conduzido pela Embrapa em parceria com a Universidade de Brasília mostra que sistemas integrados aumentam a produtividade da pecuária e reduzem a intensidade de gases de efeito estufa, reforçando o caminho da carne de baixo carbono no Brasil.

A intensificação sustentável da pecuária brasileira ganhou novos dados científicos que ajudam a derrubar o mito de que produzir mais significa poluir mais. Pesquisadores da Embrapa Cerrados e da Universidade de Brasília (UnB) comprovaram que o consórcio de gramíneas com leguminosas em sistemas de Integração Lavoura-Pecuária (ILP) eleva significativamente o ganho de peso de bovinos da raça Nelore e, ao mesmo tempo, reduz a intensidade de emissão de metano entérico, além de aumentar o estoque de carbono no solo.

Os resultados fazem parte da tese de doutorado da pesquisadora Thais Rodrigues de Sousa, desenvolvida com a colaboração de especialistas da Embrapa Cerrados e apresentada em simpósio internacional coordenado pelo Centro de Estudos de Carbono em Agricultura Tropical (CCARBON), da Universidade de São Paulo. O trabalho também recebeu menção honrosa como destaque científico do evento.

Como o estudo foi conduzido

A pesquisa avaliou três estratégias de produção pecuária, comparando desempenho animal, emissões de metano e acúmulo de carbono no solo:

  • S1 – Pastagem solteira contínua de capim BRS Piatã (sistema de referência);
  • S2 – Pastagem contínua de BRS Piatã consorciada com a leguminosa feijão-guandu IAPAR 43;
  • S3 – Sistema ILP com capim BRS Zuri em rotação com lavoura.

Os dados foram coletados em um dos experimentos de ILP mais antigos do Brasil, implantado em 1991 na Embrapa Cerrados, com avaliações realizadas em maio, agosto e dezembro de 2024.

Ganho de peso cresce com intensificação bem manejada

Os resultados zootécnicos foram claros: quanto maior o nível de intensificação e qualidade da forragem, maior o desempenho animal.

  • S1 (pastagem solteira): 0,44 kg/dia de ganho médio diário;
  • S2 (consórcio com leguminosa): 0,69 kg/dia;
  • S3 (ILP com rotação): 0,76 kg/dia.

Na prática, isso representa aumentos de até 72% no ganho de peso diário quando comparados ao sistema tradicional, mostrando que a adoção de ILP e consórcios forrageiros impacta diretamente a eficiência produtiva da pecuária.

Menos metano por quilo de carne produzido

Além de produzir mais, os sistemas integrados emitiram menos metano por unidade de ganho de peso, indicador considerado estratégico para avaliar a sustentabilidade da pecuária.

  • Pastagem solteira (S1): 450 g de CH₄/kg de ganho de peso vivo por hectare;
  • Consórcio com leguminosa (S2): 269 g de CH₄/kg GPV/ha;
  • ILP com capim Zuri (S3): 224 g de CH₄/kg GPV/ha.

Isso significa uma redução de até 60% na intensidade de emissão de metano, reforçando que sistemas bem manejados permitem produzir mais carne com menor impacto climático.

Solo mais rico em carbono

O desempenho ambiental também se refletiu no solo. O estoque de carbono até 30 cm de profundidade foi significativamente maior nos sistemas integrados, especialmente no consórcio com leguminosa.

  • S2 (Piatã + guandu): 83,17 t de carbono/ha;
  • S1 (pastagem solteira): 62,20 t de carbono/ha.

O incremento foi de mais de 20 toneladas de carbono por hectare, evidenciando o papel das leguminosas na recuperação e melhoria da qualidade do solo, além de contribuírem com nitrogênio em formas orgânicas, favorecendo o crescimento das gramíneas.

Intensificar e mitigar é possível

O estudo reforça que intensificação produtiva e mitigação de gases de efeito estufa não são conceitos opostos. Resultados anteriores na mesma área experimental já haviam mostrado que sistemas ILP também reduzem emissões de óxido nitroso (N₂O) em até 59%, outro gás com elevado potencial de aquecimento global.

“A redução das emissões sem comprometer o desempenho animal é um dos grandes desafios da agropecuária. Sistemas integrados, consorciados ou intensivos têm se mostrado alternativas viáveis para a descarbonização da pecuária”, destaca a pesquisadora Arminda de Carvalho, da Embrapa Cerrados.

Metano no centro do debate climático

O Brasil é um dos maiores produtores de carne bovina do mundo, com mais de 90% da produção em sistemas a pasto, o que revela um enorme potencial de intensificação sustentável. O metano entérico, gerado no processo digestivo dos ruminantes, possui potencial de aquecimento global cerca de 27 vezes maior que o do CO₂ em 100 anos, tornando-se foco central das discussões climáticas.

O tema ganhou ainda mais relevância durante a COP30, realizada em Belém (PA), onde a agropecuária brasileira foi apontada como parte da solução para a mitigação das mudanças climáticas.

Fotos: Thaís Rodrigues de Sousa

Recomendações técnicas em atualização

Diante dos resultados, a Embrapa Cerrados está atualizando recomendações técnicas para o uso de leguminosas em consórcio com pastagens. Uma circular técnica publicada recentemente traz orientações para a introdução do guandu-anão em consórcio com capim-braquiária, em sistema de plantio direto.

Segundo o pesquisador Robélio Marchão, a estratégia faz parte de um novo conceito em que as forrageiras atuam como plantas de duplo propósito, servindo tanto para pastejo quanto como plantas de cobertura, com funções específicas na melhoria do sistema produtivo.

Consórcio de gramíneas com leguminosas em ILP ganha reconhecimento científico

O trabalho intitulado “Enteric methane emission of Nellore cattle and soil carbon stock on integrated systems in the Cerrado” recebeu menção honrosa no 3rd CCARBON/USP Symposium – Sustainable and Resilient Livestock, realizado em Piracicaba (SP).

Para a doutoranda Thais de Sousa, o reconhecimento vai além do meio acadêmico. “Ele reforça a importância das pesquisas voltadas à redução das emissões de gases de efeito estufa e mostra que a pecuária brasileira tem base científica sólida para avançar rumo a uma produção mais sustentável”, destaca.

Os resultados consolidam o papel dos sistemas ILP com consórcio de gramíneas e leguminosas como uma das principais estratégias para tornar a pecuária nacional mais produtiva, resiliente e alinhada às exigências ambientais globais.

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