Pesquisadores do IEMA participam de mesmo painel expondo fragilidades do sistema elétrico e como os biocombustíveis podem ajudar na transição energética.
A transição energética brasileira, frequentemente celebrada por sua matriz majoritariamente renovável, esconde desafios técnicos, econômicos e políticos que ameaçam o ritmo das mudanças necessárias diante da crise climática. No painel “Desafios técnico-econômicos da transição energética: que barreiras precisam ser superadas e propostas de soluções para chegarmos lá”, realizado no Amazon Climate Hub, em Belém na quinta-feira (13), no âmbito da COP30, Conferência das Partes sobre mudanças climáticas das Nações Unidas, os especialistas mostraram diagnósticos e caminhos possíveis para um sistema mais eficiente, justo e alinhado às metas de descarbonização.
Ricardo Baitelo, gerente de projetos do IEMA, apresentou um diagnóstico contundente sobre as fragilidades do setor elétrico brasileiro. Apesar da matriz altamente renovável, ele alerta para um risco crescente de ineficiência e retrocesso. “O Brasil é um país onde a energia custa pouco, mas a tarifa ao consumidor é alta”, resultado de encargos acumulados e decisões legislativas. Baitelo lembra que o país já vive episódios de desperdício de energia solar por falta de capacidade de transmissão e coordenação, explicando que “estamos desperdiçando energia: o operador desliga as usinas, e elas não recebem remuneração por isso”.
No horizonte da transição energética, o pesquisador afirma que o país segue “flertando com o perigo”, especialmente pela lentidão em adotar baterias e modernizar regras. Ele alerta que a ausência de planejamento pode fazer o Brasil retroceder para uma dependência crescente de termelétricas: “E qual é a mais favorecida nesse cenário? As usinas a gás”. Ao sintetizar o cenário, ele faz um alerta contundente: estamos, de certa forma, descartando avanços conquistados nos últimos 15 anos, justamente quando o sistema precisa ganhar resiliência para sustentar a transição energética.
Na mesma mesa, David Tsai, também gerente de projetos do IEMA, apresentou projeções que mostram a urgência da descarbonização e o papel estratégico dos biocombustíveis. Na análise, os cenários variam de acordo com as culturas agrícolas e as tecnologias disponíveis. Ele alerta que a manutenção do modelo atual tornaria o uso da terra inviável: “Se continuarmos produzindo da forma como produzimos hoje, serão necessários 97 milhões de hectares. É inviável”, pondera.
Ele também mencionou os biocombustíveis como uma alternativa. “Não são uma solução perfeita e envolvem diversos desafios socioambientais, mas, quando produzidos de forma adequada, podem contribuir para a transição energética justa. O essencial é garantir salvaguardas ambientais e evitar conflitos de uso da terra”, afirmou.
Críticas à expansão fóssil marcam a conversa
A urbanista e advogada e coordenadora de políticas públicas do Observatório do Clima (OC), Suely Araújo, apresentou o projeto “A Petrobras de que precisamos”, destacando a contradição entre a expansão petrolífera e a emergência climática. Ela reforçou que “a Petrobras deveria deixar de ser uma petroleira raiz e passar a ser verdadeiramente uma empresa de energia”. No entanto, falou que a companhia segue “intensificando a sua atuação, desconsiderando a gravidade da crise climática”. Araújo também alertou para o rumo das políticas atuais: “essa decisão de expansão da produção de petróleo não gera distribuição de renda e abre novas fronteiras fósseis incompatíveis com o Acordo de Paris”.
Nesta mesma toada, a economista Sabrina Fernandes, chefe de pesquisa do Instituto Alameda, lembrou das “zonas de sacrifício”. “Não existe transição justa se ela repetir a lógica de exploração do passado.” Fernandes critica a aposta em novos combustíveis fósseis e cobra compromissos claros para eliminar gradualmente o petróleo. “Sem planejamento sólido, a transição vira só mais uma disputa de mercado e não uma mudança, de fato, estrutural”.
“Apenas desde o Acordo de Paris já há quase sete trilhões de dólares investidos em combustíveis fósseis”, diz Antony Devalle, diretor do Sindicato dos Petroleiros do Rio de Janeiro (Sindipetro-RJ), criticando o avanço da privatização e o foco da Petrobras em maximizar lucros. Ele alerta ainda que o país bate recordes de produção: “são 5,1 milhões de barris, mais que o dobro do consumo nacional”.
Acompanhou Devalle, Leandro Lanfredi, diretor do Sindipetro-RJ e da Federação Nacional dos Petroleiros FNP), enfatizando que os leilões energéticos atuais representam uma ameaça direta à soberania nacional. Segundo ele, os “leilões organizados” comprometem a soberania energética do país.
“Ao fazer isso, significa automaticamente que você tira soberania econômica e, consequentemente, a soberania política”. Lanfredi questiona quem realmente ganha com o modelo vigente: “A quem serve, em última instância, esses leilões?”. Para Lanfredi, enfrentar esse processo é essencial para garantir que a transição energética seja socialmente justa.
Quem acompanhou o painel sentado na plateia foi o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), que fez uma consideração. “O Congresso é dominado por negacionistas, sem o menor compromisso público”, disse. E finalizou a sessão de perguntas definindo o painel como “pessimista na razão, otimista na vontade”.
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ℹ️ Conteúdo publicado por Myllena Seifarth sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira
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