Decisão do Superior Tribunal de Justiça acende alerta no campo e expõe um erro comum na forma de fixar o preço dos contratos de arrendamento rural, que pode colocar em risco a renda do proprietário rural
A forma como milhares de contratos de arrendamento rural são redigidos no Brasil entrou definitivamente no radar do Judiciário. Uma decisão recente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) trouxe à tona um problema estrutural que pode afetar cerca de 90% dos contratos atualmente em vigor, segundo especialistas em direito agrário: a fixação do valor do arrendamento em sacas de grãos, e não em dinheiro, como exige a lei.
Na prática, o risco não está no arrendatário nem no modelo de parceria em si, mas no jeito como o preço é estipulado no contrato. Um detalhe aparentemente simples, mas que tem gerado disputas judiciais longas, caras e com alto risco de prejuízo para o proprietário da terra.
Onde está o problema nos contratos de arrendamento rural
É comum no campo a cobrança do arrendamento por hectare em sacas de soja, milho ou outro produto agrícola. Dez sacas, quinze sacas, vinte sacas por hectare. Essa prática, culturalmente aceita e amplamente utilizada, contraria o que determina a Lei do Arrendamento Rural.
A legislação é clara ao estabelecer que o valor do arrendamento deve ser fixado em dinheiro, ou seja, em reais. O pagamento até pode ser feito em produto, como soja, desde que isso seja apenas uma forma de quitação. O preço base, no contrato, precisa estar expresso em moeda corrente, e não diretamente em sacas.
Quando isso não acontece, abre-se uma brecha jurídica relevante.
O conflito típico que vai parar na Justiça
O roteiro se repete em diferentes regiões do país. Chega o final da safra, o arrendatário não paga no prazo. O proprietário cobra, o pagamento é adiado, a negociação se arrasta. Diante da insistência, o caso vai parar na Justiça.
É nesse momento que surge o argumento: “O contrato é nulo porque o valor foi fixado em sacas, e não em dinheiro. Está em desacordo com a lei.”
O problema é que, muitas vezes, esse arrendatário utilizou a terra por anos, plantou, colheu, obteve lucro e só levanta a nulidade quando chega a hora de pagar. Para o proprietário, o cenário é desfavorável: além de perder tempo, há custos com advogado e o risco concreto de não receber o valor devido.
O que decidiu o STJ e por que isso importa
O Superior Tribunal de Justiça decidiu recentemente que o arrendatário não pode se beneficiar do contrato por anos e alegar nulidade apenas no momento do pagamento. Segundo o entendimento da Corte, essa conduta configura violação à boa-fé objetiva, princípio fundamental do direito contratual.
Em outras palavras, se o arrendatário aceitou as condições, explorou a terra, produziu e lucrou, não pode depois tentar se livrar da obrigação alegando que o formato do contrato era ilegal. A decisão traz uma proteção importante ao proprietário rural, mas não elimina totalmente o risco.
Especialistas alertam que o ideal é não depender dessa proteção judicial, já que cada caso pode ter nuances próprias e decisões diferentes em instâncias inferiores.
A solução prática para eliminar a brecha jurídica
A forma mais segura de evitar disputas e proteger a renda do produtor é simples: refazer ou ajustar o contrato, fixando o valor do arrendamento em reais.
O contrato pode, sim, prever que o pagamento seja feito em sacas de soja ou outro produto, desde que isso apareça apenas como uma equivalência financeira, e não como o preço principal.
Um exemplo considerado juridicamente adequado seria:
“O valor do arrendamento será de R$ 3.000 por hectare, podendo ser pago em sacas de soja, pelo valor de mercado na data do vencimento.”
Dessa forma, o contrato atende à lei, elimina o argumento de nulidade, reduz o risco de litígio e dá mais segurança jurídica tanto para quem arrenda quanto para quem explora a terra.
Alerta para o produtor rural
A decisão do STJ funciona como um sinal amarelo no campo. Embora traga proteção contra abusos, ela também evidencia que muitos contratos estão formalmente frágeis. Revisar documentos, ajustar cláusulas e buscar orientação jurídica especializada deixou de ser apenas uma recomendação e passou a ser uma necessidade.
Em um cenário de margens apertadas e custos elevados, garantir que o contrato esteja juridicamente blindado pode ser a diferença entre receber ou não a renda do arrendamento ao final da safra.
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