Existe um tamanho ideal de vaca?

O tamanho ideal da vaca na pecuária de corte: o debate que mobiliza os EUA e que também interessa ao Brasil

A busca pela “vaca perfeita” parece um tema eterno na pecuária mundial. Nos Estados Unidos, onde o gado Angus domina o cenário da carne bovina, o assunto voltou ao centro das discussões após a publicação de um artigo de Angie Stump Denton, jornalista do portal Drovers, um dos veículos mais tradicionais da pecuária norte-americana. A reportagem reúne pesquisadores e produtores que debatem se existe de fato um tamanho ideal de vaca e qual é o impacto disso na rentabilidade da cria.

Embora escrita para a realidade dos Estados Unidos — marcada por sistemas semi-intensivos, pastagens temperadas e forte pressão genética para ganho de peso — a discussão tem relevância também para o Brasil, mesmo com um ambiente produtivo tropical e predominância da raça Nelore. A conclusão central dos especialistas norte-americanos pode ser resumida em uma frase: vaca grande nem sempre significa maior lucro.

Crescimento do peso das vacas nos EUA e suas consequências

Conforme relata o artigo, pesquisas das universidades de Kentucky e Oklahoma mostram que o peso médio da vaca norte-americana aumentou continuamente por décadas, impulsionado pela seleção para maiores pesos à desmama e ao ano. No entanto, esse avanço trouxe um efeito colateral: o crescimento desproporcional entre o peso da vaca e o desempenho do bezerro.

Estudos citados por Angie Stump Denton indicam que, para cada 100 libras (cerca de 45 kg) a mais no peso adulto da vaca, o bezerro ganha apenas cerca de 10 libras (4,5 kg) extra na desmama. Ou seja, o custo para sustentar vacas maiores cresce muito mais rápido do que o retorno obtido em peso do bezerro.

Essa relação preocupa técnicos e pecuaristas dos Estados Unidos porque, assim como no Brasil, o custo da manutenção da vaca é um dos pilares da eficiência econômica da cria. E, como aparece no relato do produtor Sam Hands, mesmo com genética superior e maior peso dos bezerros, terras e pastagens têm limite.

Pasto, ambiente e limite produtivo: paralelos com o Brasil

Na pecuária norte-americana, onde o Angus predomina e sistemas de manejo costumam ser mais intensivos, um aumento no peso da vaca pode significar necessidade de suplementação mais elevada para manter escore corporal, principalmente em invernos rigorosos.

No Brasil, a realidade é distinta — clima tropical, forte dependência de pastagens e papel dominante do Nelore — mas a lógica é a mesma: quanto maior a vaca, maior o custo energético diário, independentemente da raça.

O estudo mostra que vacas grandes tendem a desmamar proporcionalmente menos do seu peso, e isso é particularmente relevante ao comparar com a fisiologia do Nelore. A raça zebuína é reconhecida pela rusticidade, adaptação ao calor e eficiência em pasto. No Brasil, onde os sistemas extensivos são maioria, uma vaca mais leve pode significar menor custo de manutenção, maior taxa de prenhez e maior longevidade produtiva.

Ou seja: as conclusões norte-americanas, mesmo baseadas em Angus, reforçam um debate que já existe no Brasil — o equilíbrio entre tamanho da vaca, ambiente e sistema de produção.

O ponto-chave: decidir descarte olhando mais que o peso de desmama

A reportagem destaca que muitos produtores erram ao decidir o descarte de vacas com base apenas no peso de desmama do bezerro. Segundo o economista Kenny Burdine, vacas maiores realmente desmamam bezerros maiores, mas isso não significa maior rentabilidade, pois o custo diário delas também cresce.

A recomendação dos especialistas é clara: a análise deve relacionar o peso de desmama do bezerro ao peso da própria vaca. Uma vaca Angus de 650 kg que desmama 230 kg pode ser menos eficiente do que uma Nelore de 480 kg desmamando 200 kg.

Essa comparação, cada vez mais usada em sistemas de cria avançados, já começa a ganhar relevância no Brasil, especialmente entre produtores que buscam eficiência por hectare.

Seleção genética: controlar crescimento sem comprometer desempenho

Como aponta o especialista Mark Johnson, os EUA avançaram muito em genética para ganho de peso, mas não controlaram adequadamente o tamanho adulto das vacas. Isso fez com que o peso ao nascer e a facilidade de parto fossem preservados, mas o peso final das vacas acabasse se elevando demais.

O alerta vale para o Brasil: a genética moderna do Nelore, cada vez mais influenciada por programas de melhoramento, também pode levar ao crescimento excessivo do tamanho adulto se não houver seleção equilibrada.

A mensagem dos pesquisadores é inequívoca: crescimento é bom, mas desde que proporcional e acompanhado de controle no tamanho adulto.

O que o Brasil pode aprender com o estudo dos EUA

Apesar das diferenças entre Angus e Nelore, clima temperado e tropical, e sistemas intensivos e extensivos, o estudo deixa lições claras para a pecuária brasileira:

  1. Vacas grandes demais aumentam custos sem garantir retorno proporcional.
  2. Peso de desmama deve ser analisado em relação ao peso da mãe, não de forma isolada.
  3. Registros individuais são fundamentais para decisões de descarte.
  4. Programas de seleção precisam considerar o tamanho adulto para evitar vacas improdutivas.
  5. Eficiência por hectare importa mais que peso absoluto de bezerro.

No contexto brasileiro — marcado por desafios de custo, necessidade de produtividade e expansão sobre as mesmas áreas — a discussão norte-americana serve como alerta e inspiração.

O artigo de Angie Stump Denton, do Drovers, reforça que não existe “a vaca perfeita”, seja ela Angus nos EUA ou Nelore no Brasil. A vaca ideal é a que se paga. E isso depende do ambiente, do manejo, do sistema de produção e, sobretudo, do equilíbrio entre tamanho corporal e desempenho produtivo.

A pecuária brasileira, cada vez mais profissionalizada, tem muito a ganhar ao adaptar esse debate à sua realidade: menos foco no tamanho absoluto e mais foco na eficiência.

Texto adaptado à partir do Drovers

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