Fiscalização do MAPA leva Fazenda Carnaúba a parar comercialização de palma e reacende debate sobre criminalização do produtor
Em Taperoá, no coração do Cariri paraibano, a Fazenda Carnaúba consolidou-se como uma das mais respeitadas referências em pecuária sustentável, manejo da caatinga e preservação de práticas produtivas que há décadas alimentam e sustentam milhares de famílias do semiárido.
A propriedade, conhecida nacionalmente por seus programas de melhoramento, pela produção de queijo artesanal e por sua atuação protagonista na difusão da palma forrageira como pilar da segurança alimentar dos rebanhos, tornou-se símbolo do potencial produtivo do Nordeste. Em uma região marcada por desafios climáticos extremos, a Carnaúba sempre demonstrou que é possível conciliar tradição, tecnologia e desenvolvimento econômico.
Apesar de sua relevância e do reconhecimento que acumula há anos, a fazenda voltou ao centro do debate público ao divulgar um desabafo contundente sobre o que classifica como um cenário crescente de criminalização do produtor rural no Brasil.
A percepção — cada vez mais compartilhada por agricultores, criadores e agroindústrias — é de que o país trata quem produz como se fosse vilão, impondo camadas sucessivas de exigências, taxas e regulações que se multiplicam sem que os pequenos e médios produtores tenham capacidade financeira ou técnica para acompanhá-las.
O estopim do desabafo ocorreu na manhã desta quarta-feira (10), quando um fiscal do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) chegou à Carnaúba para investigar uma denúncia do próprio órgão: a suposta comercialização irregular de mudas de palma forrageira resistente à cochonilha-do-carmim. 
A prática, comum no Nordeste há quase um século, historicamente representa não apenas renda, mas também resiliência produtiva em uma região castigada pela seca. Segundo a fazenda, ao ser questionada, afirmou prontamente que estava comercializando as mudas — e que nunca havia sido orientada sobre impedimentos formais para isso.
De acordo com o relato dos proprietários, o fiscal informou que a venda das mudas exigiria uma série de licenças, taxas, contratação de um engenheiro responsável e outros procedimentos de regularização.
Diante do impacto imediato, a Fazenda Carnaúba anunciou a suspensão da comercialização até compreender plenamente a legislação e avaliar se o custo operacional desse processo é viável. “A batalha do queijo artesanal ainda não foi vencida; nisso já se vão quase 20 anos. Agora aparece mais essa”, lamentou a fazenda, lembrando que ainda enfrenta um emaranhado normativo que dificulta, desde a década de 2000, a formalização e expansão da produção de queijos tradicionais.
A Carnaúba ressalta que não defende desobediência, e sim o equilíbrio entre fiscalização e desenvolvimento. “Estamos cada dia mais ocupados com advogados, fiscais, contadores, taxas e regulamentações. É de se pensar até onde esses excessos de regulações, taxas e impostos de fato são benéficos. As margens da pecuária vão suportar até quando tudo isso?”, questiona.
O desabafo ecoa uma insatisfação crescente no setor, que aponta que a superposição de exigências — muitas delas desconectadas da realidade rural — acaba desestimulando investimentos e inviabilizando práticas tradicionais essenciais para a economia regional.
A Carnaúba também recorda que sua trajetória sempre foi marcada pela parceria com instituições públicas. A fazenda mantém vínculos e projetos com órgãos municipais, estaduais e federais, incluindo o próprio MAPA e a Embrapa, com quem desenvolveu pesquisas e trabalhos conjuntos ao longo de anos. “Nossa fala não é contra nenhuma instituição; ao contrário, elas são fundamentais para o desenvolvimento do país. Nossa crítica é contra processos que foram criados travando o desenvolvimento da região; contra isso gritaremos sempre”, declara a fazenda.
O episódio reacende o debate sobre o modelo regulatório brasileiro — frequentemente citado como um dos mais complexos do mundo — e seu impacto direto sobre as cadeias produtivas que sustentam o semiárido.
No Nordeste, onde cada ação produtiva é uma vitória diante das adversidades climáticas, a sensação de que o produtor virou alvo constante de suspeitas e entraves burocráticos tem se fortalecido. O questionamento central é claro: até que ponto mecanismos criados sob o argumento de segurança alimentar e sanitária estão, na prática, sufocando quem garante o alimento das famílias rurais e urbanas?
Enquanto aguarda orientações formais e analisa ajustes necessários, a Fazenda Carnaúba reforça que continuará defendendo o desenvolvimento da região e a valorização do produtor que, apesar de todos os obstáculos, insiste em produzir. E deixa no ar uma reflexão que, cada vez mais, atravessa o Brasil: não haverá segurança alimentar nem desenvolvimento enquanto quem produz for tratado como suspeito, em vez de parceiro.
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