Gigante da celulose da J&F recua e engaveta projeto de R$ 15 bilhões; entenda

Decisão envolve ajuste financeiro pós-disputa societária, excesso de florestas plantadas e um cenário global de queda nos preços da celulose, mesmo com a demanda de longo prazo ainda positiva. Com isso, a Eldorado Celulose, controlada pela J&F, decidiu pisar no freio e engavetar, ao menos temporariamente, o projeto de duplicação industrial avaliado em cerca de R$ 15 bilhões.

Depois de anunciar, no fim de novembro, planos para acelerar sua expansão florestal em Mato Grosso do Sul, a Eldorado Celulose, controlada pela J&F, decidiu pisar no freio e engavetar, ao menos temporariamente, o projeto de duplicação industrial avaliado em cerca de R$ 15 bilhões. O movimento sinaliza cautela estratégica em um momento de transição interna da companhia e de pressão sobre o mercado internacional de celulose.

Em entrevista ao site AGFeed, o diretor florestal da Eldorado, Germano Vieira, afirmou que a empresa tem atualmente 305 mil hectares de plantações de eucaliptos na região, mas precisa de apenas dois terços disso para abastecer a fábrica. A decisão representa um recuo relevante dentro de um dos maiores polos de celulose do mundo, localizado na região leste de Mato Grosso do Sul, onde a Eldorado opera desde 2012 com uma capacidade anual próxima de 1,8 milhão de toneladas de celulose. A expansão previa dobrar essa capacidade, exigindo investimentos bilionários tanto na indústria quanto na base florestal.

O que estava em jogo no projeto de expansão

O plano anunciado anteriormente previa elevar o plantio anual de eucalipto de 25 mil para até 50 mil hectares, preparando o fornecimento de madeira para uma segunda linha industrial. Para sustentar essa ampliação, a Eldorado teria que alcançar cerca de 450 mil hectares de florestas plantadas, ante os atuais 305 mil hectares .

Somente o custo de arrendamento adicional de terras — cerca de 150 mil hectares extras — representaria um desembolso anual estimado em R$ 180 milhões, considerando valores médios de R$ 1,2 mil por hectare ao ano. Já o plantio de novas áreas, com custo aproximado de R$ 8,7 mil por hectare, poderia adicionar mais R$ 220 milhões anuais ao orçamento florestal, sem contar despesas com combate a pragas, incêndios e manutenção das áreas .

Excesso de florestas e ajuste de caixa pesaram na decisão

Segundo o diretor florestal da Eldorado, Germano Vieira, a companhia já possui hoje um excedente de aproximadamente 100 mil hectares de eucalipto, volume suficiente para abastecer a operação atual e até sustentar, no curto prazo, uma eventual ampliação industrial. Esse excedente vem sendo vendido ou permutado com concorrentes, como Suzano e Bracell, que também operam no estado .

Além disso, a empresa ainda passa por ajustes financeiros após o encerramento da longa disputa judicial com a canadense Paper Excellence, resolvida apenas em 2025. Para retomar o controle total da Eldorado, os irmãos Joesley e Wesley Batista se comprometeram a pagar US$ 2,64 bilhões à antiga sócia, o que elevou a necessidade de disciplina financeira antes de novos aportes de grande porte .

Mercado global de celulose pressiona resultados

Outro fator determinante para o recuo foi o cenário adverso dos preços internacionais da celulose. Apesar do crescimento da demanda global estimado em cerca de 1 milhão de toneladas por ano, o setor enfrenta um período de excesso de oferta, pressionando margens .

Em Mato Grosso do Sul, por exemplo, as exportações de celulose cresceram 57% nos dez primeiros meses de 2025, impulsionadas pela entrada em operação de novas fábricas. No entanto, o faturamento subiu apenas 25,6%, reflexo direto da queda no preço médio da tonelada, que recuou de US$ 570 para US$ 456, uma baixa próxima de 20%. Esse movimento gerou uma perda estimada de US$ 666 milhões (cerca de R$ 3,6 bilhões) em receita no período .

O ambiente de pressão é compartilhado por outras gigantes do setor. A Suzano, por exemplo, chegou a classificar os preços internacionais como “completamente insustentáveis” e anunciou redução temporária de produção .

Expansão não está descartada, apenas adiada na Eldorado Celulose

Apesar do recuo momentâneo, a Eldorado mantém seus planos de crescimento no radar. Em entrevistas recentes, a companhia reforçou que a decisão não representa abandono do projeto, mas sim uma escolha por aguardar condições mais favoráveis de mercado e maior previsibilidade financeira antes de autorizar investimentos que podem chegar, em um cenário mais amplo, a R$ 25 bilhões, incluindo infraestrutura logística e uma nova linha industrial em Três Lagoas (MS) .

Enquanto isso, a estratégia da empresa tem sido ganhar eficiência, investir em genética florestal, controle biológico de pragas, produtividade e sustentabilidade, além de manter o excedente de madeira como um ativo estratégico. “Hoje nós temos madeira sobrando porque a segunda linha ainda não aconteceu”, afirmou Germano Vieira, ao explicar que a empresa pode esperar o “momento certo” para consumir esse estoque .

Contexto regional segue aquecido

O recuo da Eldorado ocorre em meio a um forte ciclo de investimentos no setor de celulose em Mato Grosso do Sul. Projetos bilionários seguem em andamento, como a fábrica da chilena Arauco em Inocência, com capacidade prevista de 3,5 milhões de toneladas por ano, e o plano da Bracell em Bataguassu, que prevê investimentos da ordem de R$ 16 bilhões .

Assim, o movimento da Eldorado não indica perda de protagonismo do estado no setor, mas reforça que, mesmo para gigantes da celulose, o timing dos investimentos é decisivo diante de ciclos de preços, disputas societárias e necessidade de equilíbrio financeiro.

Em resumo, o projeto de R$ 15 bilhões não foi cancelado, mas engavetado estrategicamente. A Eldorado escolheu reorganizar a casa, atravessar um período de preços pressionados e preservar caixa, mantendo a expansão como uma carta importante para quando o mercado voltar a oferecer condições mais favoráveis.

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