
Autoridades sanitárias internacionais e virologistas de renome têm reforçado a preocupação de que o mundo pode estar diante do início de uma nova ameaça pandêmica
Pesquisadores em saúde pública estão em estado de alerta diante da crescente propagação do vírus H5N1, uma cepa altamente patogênica da gripe aviária que, embora historicamente associada a aves, tem ampliado seu alcance para diferentes espécies de mamíferos — incluindo, recentemente, rebanhos leiteiros nos Estados Unidos e aves comerciais no Brasil.
Sinal vermelho: a gripe aviária fora de controle?
Autoridades sanitárias internacionais e virologistas de renome têm reforçado a preocupação de que o mundo pode estar diante do início de uma nova ameaça pandêmica. Apesar dos sinais preocupantes, muitos acreditam que medidas preventivas cruciais foram negligenciadas nos últimos anos, especialmente no que diz respeito à vigilância sanitária e ao controle da disseminação do vírus entre animais.
A H5N1 já cruzou fronteiras naturais e políticas: foi registrada em aves silvestres, mamíferos marinhos e até em camelos no Oriente Médio. Em um cenário inédito, até mesmo pinguins da Antártida foram infectados. O vírus atingiu todos os continentes, com exceção da Oceania.
Nos Estados Unidos, todas as 50 unidades federativas já confirmaram a presença do vírus em aves selvagens e outros animais. Desde 2022, mais de mil rebanhos leiteiros foram atingidos. A infecção em bovinos, antes considerada improvável, mostra que o vírus está se adaptando rapidamente — um fenômeno que preocupa epidemiologistas, como Caitlin Rivers, da Universidade Johns Hopkins. Para ela, “perdemos o timing ideal de contenção”.
Alerta no Brasil: primeiro caso em granja comercial
No Brasil, o primeiro registro do vírus H5N1 em uma unidade produtiva de grande escala ocorreu em maio deste ano, no estado do Rio Grande do Sul. A granja afetada era voltada à produção de ovos férteis, fundamentais para a cadeia de frango de corte.
Até então, os casos registrados no território nacional se limitavam a aves silvestres e de subsistência. A nova ocorrência não apenas ampliou o alcance geográfico da doença, como também causou impactos imediatos: países como China, Argentina e membros da União Europeia suspenderam temporariamente as importações de carne de frango brasileira.
Risco humano: a próxima pandemia está em curso?
Embora a transmissão sustentada de humano para humano ainda não tenha sido confirmada, já foram relatados mais de 70 casos isolados de infecção humana em todo o mundo, com pelo menos uma morte. Casos recentes ocorreram em países como México, Índia, Reino Unido, Camboja, Vietnã e os próprios Estados Unidos.
A possibilidade de o vírus sofrer uma mutação que facilite sua transmissão entre pessoas é o maior temor. Segundo Kamran Khan, médico e pesquisador da Universidade de Toronto, a combinação de infecção em mamíferos e a proximidade desses animais com humanos — como ocorre nas fazendas de gado leiteiro — eleva significativamente o risco de uma nova pandemia zoonótica.
Desde 2003, mais de 700 infecções humanas foram reportadas à Organização Mundial da Saúde, sendo os países asiáticos os mais atingidos. Agora, o cenário é diferente: há uma aceleração na diversidade de espécies atingidas e uma ampliação geográfica que preocupa os especialistas.
Vacinação animal: solução ou desafio logístico?
Embora países como China, França, México e Índia já adotem programas de vacinação em larga escala para aves de criação, essa não é uma solução simples. Segundo o virologista Munir Iqbal, do Instituto Pirbright, no Reino Unido, a imunização em massa é difícil de aplicar e nem sempre impede que aves vacinadas continuem a carregar e transmitir o vírus.
A França apresentou bons resultados após vacinar patos, com redução significativa na circulação do vírus. A União Europeia está trabalhando em diretrizes comuns para ampliar essa estratégia, embora nem todos os blocos comerciais aceitem importar produtos oriundos de animais vacinados.
Nos EUA, a vacinação de aves sempre foi vista com cautela pelo impacto que poderia causar nas exportações. Contudo, diante do avanço do H5N1, o Departamento de Agricultura americano aprovou, de forma emergencial, uma nova vacina para aves.
E os humanos? Há vacinas disponíveis?
Governos ao redor do mundo já vêm estocando vacinas específicas contra a gripe aviária para uso humano, embora seu emprego esteja restrito, por enquanto, a grupos de alto risco — como profissionais que lidam diretamente com animais infectados.
Kamran Khan, fundador da empresa de inteligência em saúde BlueDot — que ajudou a rastrear os primeiros sinais da covid-19 — destaca que, se a gripe aviária passar a ser transmitida entre humanos, será necessário desenvolver rapidamente uma vacina adaptada à cepa circulante. Até lá, os estoques existentes podem ser usados como medida paliativa, oferecendo algum nível de proteção nos estágios iniciais de um eventual surto pandêmico.
O futuro incerto: vigilância ou vulnerabilidade?
A gripe aviária está se espalhando com velocidade e intensidade incomuns. A cada nova infecção em uma espécie diferente, aumentam as chances de o vírus adquirir mutações perigosas. A falta de um sistema global de vigilância mais rígido e de resposta coordenada pode transformar uma ameaça controlável em uma nova crise global.
O tempo para conter o avanço do H5N1 está se esgotando. Sem ações coordenadas, como a padronização de protocolos de transporte animal, ampliação da testagem, investimento em pesquisas e cooperação internacional, o mundo poderá, novamente, se ver à mercê de um inimigo invisível — mas desta vez, mais preparado para atravessar espécies, fronteiras e continentes.
Escrito por Compre Rural
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ℹ️ Conteúdo publicado pela estagiária Ana Gusmão sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira
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