Justiça obriga Banco do Brasil a alongar dívida de produtor rural por 20 anos

Decisão inédita garante prorrogação de débitos, limita juros e anula cobranças indevidas para um agropecuarista paranaense afetado por seca e queda no preço da soja.

Um pequeno produtor rural de Ribeirão do Pinhal, no norte do Paraná, viveu anos de apreensão. Em 2021, uma severa crise hídrica devastou suas lavouras. O cenário se repetiu na safra 2023/2024, com nova estiagem e forte queda no preço da soja — combinação que comprometeu completamente sua capacidade de honrar os compromissos com o Banco do Brasil.

Como tantos agricultores familiares que dependem do crédito rural para manter suas atividades, ele se viu diante de um impasse financeiro. Com a colheita comprometida e o mercado desfavorável, buscou administrativamente a prorrogação de suas dívidas de custeio, apresentando laudos técnicos elaborados por engenheiro agrônomo que comprovavam a frustração da safra, além do Decreto Municipal de Situação de Emergência emitido em razão da estiagem.

Mesmo diante das provas, o banco negou verbalmente o pedido, sem justificativa formal. Diante da recusa, o produtor decidiu recorrer à Justiça.

A batalha judicial: o direito de quem produz

A Ação Declaratória/Mandamental de Prorrogação Compulsória de Contratos Rurais, ajuizada pelo agropecuarista com o patrocínio do advogado Dr. Carlos Henrique Rodrigues Pinto, do escritório CH Advogados, abriu um debate jurídico de grande relevância para o setor.

O produtor solicitava o alongamento de suas dívidas por 20 anos, além da revisão de encargos contratuais considerados abusivos.

Em contrapartida, o Banco do Brasil argumentou que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) não seria aplicável, por se tratar de crédito destinado à produção, e defendeu a legalidade dos juros capitalizados e das taxas pactuadas.

Prorrogação, juros limitados e cobranças anuladas

A sentença, proferida pelo juiz Gabriel Henrique Antônio Paiva Leocádio, da Comarca de Ribeirão do Pinhal, representou uma vitória expressiva para o produtor rural.

O magistrado determinou a prorrogação compulsória do saldo devedor dos três contratos rurais, com prazo de pagamento estendido por 20 anos a partir do vencimento original, e parcelas anuais ajustadas ao período de safra e comercialização.

Segundo o juiz, os requisitos legais foram plenamente atendidos: o pedido administrativo prévio, a comprovação da incapacidade de pagamento devido à estiagem e a dificuldade de comercialização pela queda no preço da soja.

Foi um alívio indescritível quando soube da decisão. Eu já não sabia mais o que fazer, com a safra perdida e o preço lá embaixo. Essa prorrogação me dá um fôlego, uma chance de me reerguer e continuar produzindo”, expressou o produtor, com a voz embargada pela emoção. “É a prova de que o produtor, mesmo pequeno, tem seus direitos e pode lutar contra as grandes instituições” – confessou o produtor.

Outra vitória crucial para o agropecuarista foi a limitação dos juros remuneratórios. A sentença declarou a abusividade das taxas de 19,8% e 21,2% ao ano, reduzindo-as para o teto legal de 12% ao ano para todos os contratos de crédito rural em questão. Este ponto é vital para reequilibrar as contas do produtor.

advogado dr Carlos Henrique Rodrigues Pinto especialista em direito agrario
Dr. Carlos Henrique Rodrigues Pinto / Foto: Divulgação

“Essa decisão é um marco importante para o produtor rural, especialmente no que tange a limitação dos juros e ao direito de prorrogação”, explica Dr. Carlos Henrique Rodrigues Pinto, especialista em direito agrário.

“A Justiça reafirma que, em casos de comprovada dificuldade de pagamento por fatores alheios à vontade do produtor, como quebras de safra e quedas de preço, o alongamento da dívida não é uma faculdade do banco, mas um direito do devedor, conforme já preconiza a Súmula 298 do STJ. A limitação dos juros a 12% ao ano em cédulas de crédito rural, quando o Conselho Monetário Nacional é omisso na definição de um teto, é uma proteção essencial contra abusividades” – alertou o advogado.

Além disso, a decisão declarou a nulidade da cobrança de “comissão de permanência” nos contratos, afastando qualquer eventual cobrança a este título, pois não há previsão legal para ela nas cédulas de crédito rural.

Impacto e precedentes para o agro

A decisão do Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) cria um precedente relevante para o setor agropecuário. Ela reforça a importância de as instituições financeiras considerarem as peculiaridades do agronegócio, especialmente as adversidades climáticas e de mercado, que escapam ao controle do produtor.

O banco deverá recalcular o saldo devedor desde a origem, aplicando o teto de 12% ao ano e devolvendo os valores cobrados indevidamente.

Mais do que um caso isolado, a sentença simboliza a força do campo diante da injustiça financeira. Em meio às crises climáticas e à pressão das grandes instituições, a Justiça reafirma o papel social da agricultura e o direito do produtor de não ser penalizado por fatores que estão além de sua vontade.

É o campo fazendo eco nos tribunais — uma voz firme que exige equilíbrio, respeito e reconhecimento para quem planta o futuro do Brasil.

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