Nanotecnologia substituirá fertilizantes, herbicidas e inseticidas

Quanto menor, melhor: Nanopartículas e nanocápsulas poderão diminuir o uso de agroquímicos, mantendo a eficiência biológica

Uma das possibilidades da nanotecnologia é a substituição ou diminuição da quantidade de fertilizantes, herbicidas e inseticidas utilizados na agricultura, reduzindo impactos ambientais sem perder eficiência.

Um experimento realizado por pesquisadores paulistas mostrou que o uso do óleo de citronela, planta que tem efeito repelente contra alguns insetos e ácaros, inserido em nanopartículas de zeína, uma proteína extraída do milho, pode ser útil para a agricultura. “Desenvolvemos nanopartículas de 150 a 200 nanômetros [1 nanômetro equivale a 1 milímetro dividido por 1 milhão] de óleo de citronela, que servem para proteger e liberar mais lentamente a substância nas folhas das plantas. A pulverização desse repelente de forma tradicional faz com que ele se volatilize rapidamente pela ação dos raios solares ou por altas temperaturas e não promova o efeito desejado por muito tempo”, explica o químico Leonardo Fraceto, professor no Instituto de Ciência e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Sorocaba. Ele coordena um grupo que inclui pesquisadores do Instituto de Biologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), outras unidades da Unesp, universidades de Sorocaba e Estadual de Londrina.

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Nanopartículas de ureia, que leva nitrogênio ao solo, envoltas em argila / Embrapa

O repelente mostrou-se eficaz em evitar a aproximação em plantas de feijão do alvo escolhido pelos pesquisadores, o ácaro-rajado (Tetranychus urticae), artrópode que ataca também outras culturas, como as de soja e tomate. “Esse tipo de pesticida poderia ser usado para controlar ácaros, principalmente na agricultura orgânica”, diz Leonardo Fraceto. Como esperado pelos pesquisadores, a formulação mostrou uma volatilização lenta e tornou o efeito do óleo essencial mais eficaz. O estudo foi publicado em janeiro deste ano na revista Journal of Agricultural and Food Chemistry.

A mesma preocupação ambiental têm os pesquisadores do Laboratório Nacional de Nanotecnologia para o Agronegócio (LNNA) da Embrapa Instrumentação, em São Carlos (SP). “Uma das nossas estratégias é utilizar nanopartículas de argila e hidroxiapatita [substância formada por cálcio e fosfato presente nos ossos e dentes que pode ser sintetizada em laboratório] para formular um nanocompósito com ureia, um fertilizante rico em nitrogênio”, conta o engenheiro de materiais Cauê Ribeiro, pesquisador da Embrapa e coordenador da Rede de Nanotecnologia Aplicada ao Agronegócio (Rede AgroNano).

A ureia é também uma substância volátil e emite nesse processo óxido nitroso, substância que contribui com o efeito estufa do planeta. O período em que a ureia tradicional em forma de pellets – pequenas pastilhas – fica no solo é de 14 dias. Com as nanopartículas, esse período chega a 42 dias ou mais, com até 50% a menos de perda para o ambiente na forma volatilizada.

As nanopartículas encapsuladas por argila, hidroxiapatita ou polímeros podem ser produzidas com equipamentos utilizados na indústria do plástico, por exemplo, e, como outros produtos, ser oferecidas na forma de pellets. O processo produtivo é semelhante. Ribeiro explica que outra vantagem desse processo tecnológico é a diminuição de fertilizantes sendo levados para o campo.

“O frete é o principal custo, em relação aos fertilizantes tradicionais, para os agricultores. Se conseguirmos um material com alta quantidade de fertilizante em nanopartículas por grama do produto final em pellets, que fique no solo por mais tempo, será possível diminuir o custo de transporte”, afirma o pesquisador. Fertilizantes ou inseticidas feitos com nanotecnologia ainda não são comercializados. “As pesquisas concentram-se em países de agricultura tropical como Brasil e Índia, que têm problemas agrícolas semelhantes.” Aqui, ao contrário dos Estados Unidos e da Europa, a maioria dos agricultores não revolve a terra para adubar e plantar porque existe o risco de esse procedimento acelerar erosões, além de não se aproveitar os nutrientes sobre o solo.

No Brasil predomina a deposição do adubo sobre a terra, sem enterrá-lo, o que leva à volatilização e a maior dispersão dos fertilizantes e outros insumos pela irrigação e chuva. “A atenção de pesquisadores e empresas de países desenvolvidos sobre essa área ainda é recente.”

O trabalho realizado pelo grupo de Ribeiro resultou em duas parcerias. Uma delas com a empresa de origem australiana Nufarm para o desenvolvimento de um defensivo agrícola contra nematoides, vermes que atacam as raízes das plantas, e um dos principais problemas fitossanitários da agricultura brasileira. Sem poder contar detalhes por força contratual, Ribeiro diz apenas que o pesticida, agora envolto em um polímero biodegradável, está há muitos anos em uso. O objetivo é atacar rapidamente o verme, evitando a necessidade de se usar mais agroquímicos no solo. Além do Brasil, o produto deverá ser distribuído em vários países. A outra parceria é com a Domínio Tecnologia Química, de Pindorama (SP). “Estamos desenvolvendo com eles um nanocompósito de enxofre para carrear micronutrientes, como zinco, cobre e boro, no solo.”

Patentes

O grupo de Fraceto também poderá ter um produto no mercado. A universidade está negociando com uma empresa o licenciamento de uma patente em parceria com a Unicamp. Trata-se de nanocápsulas contendo atrazina, um herbicida tradicional envolto em um polímero biodegradável chamado de policaprolactona. “Esse herbicida é proibido na Europa, mas aceito no Brasil e Estados Unidos. Com as nanocápsulas, temos como diminuir a quantidade de uso e os impactos ambientais, com a mesma eficiência”, explica Fraceto.

Em outro campo de estudo com a mesma nanocápsula, Fraceto desenvolve com pesquisadores do Imperial College, do Reino Unido, pesquisas para determinar a toxicidade desse nanocompósito em relação à rota de aplicação por pulverização. “Estamos analisando com modelos de células pulmonares se essas nanopartículas de atrazina poderão trazer malefícios à saúde das pessoas que aplicam o produto no campo.” Na aplicação tradicional, é preciso usar máscaras e roupas especiais. A expectativa é o uso do produto com nanopartículas da mesma forma, com os aplicadores utilizando equipamentos de segurança.

Via Revista Fapesp

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