
Em parecer apresentado na Comissão de Agricultura, o deputado Nelson Barbudo (PL-MT) defende que a alteração proposta não compromete a proteção ambiental no Estado. A medida, no entanto, foi alvo de críticas por parte de ambientalista
Um projeto de lei em discussão na Câmara dos Deputados reacende o debate sobre os limites da Amazônia Legal e os impactos das exigências ambientais sobre a produção agropecuária em Mato Grosso. O parecer mais recente, favorável à proposta, foi apresentado pelo deputado Nelson Barbudo (PL-MT), que defende a exclusão do estado da área que compõe a Amazônia Legal — classificação criada por lei para fins de planejamento e desenvolvimento regional.
O argumento central do parlamentar é que, embora parte do território mato-grossense esteja dentro do bioma amazônico, cerca de metade está fora dele, o que torna, segundo ele, inadequada a aplicação de regras ambientais mais rígidas para toda a extensão do estado. Para Barbudo, essa inclusão impõe custos elevados e injustos aos produtores rurais da região.
O custo da restauração ambiental em debate
De acordo com dados citados no relatório do deputado, a recomposição de áreas de vegetação nativa pode exigir investimentos que variam entre R$ 6 mil e R$ 15 mil por hectare, dependendo das técnicas adotadas. Considerando o passivo ambiental estimado de Mato Grosso, os custos totais ultrapassariam R$ 30 bilhões, o que seria oneroso tanto para os produtores quanto para os cofres públicos estaduais.
A proposta defendida por Barbudo está formalizada no Projeto de Lei 337/2022, de autoria do deputado Juarez Costa (MDB-MT), que pretende alterar a redação do artigo 3º da Lei nº 12.651/2012, o Código Florestal. A mudança exclui Mato Grosso da delimitação da Amazônia Legal e, na prática, diminuiria a exigência de reserva legal de 80% para 20% nas propriedades situadas em áreas de floresta.
Impactos diretos e controvérsias jurídicas
Hoje, o Código Florestal exige que propriedades rurais na Amazônia Legal preservem até 80% da vegetação nativa em áreas de floresta, 35% no Cerrado e 20% em outros biomas. A exclusão de Mato Grosso desse território ambiental mudaria radicalmente esse panorama: todos os imóveis rurais do estado estariam submetidos ao índice de 20%, independentemente do bioma presente.
Com isso, áreas atualmente classificadas como passivos ambientais — ou seja, que precisam ser recompostas — poderiam ser, na prática, desobrigadas de recuperação. Por outro lado, propriedades com vegetação excedente às exigências mínimas ganhariam margem para supressão legal de cobertura vegetal.
Juarez Costa defende que a legislação atual gera insegurança e altos custos ao produtor rural, sobretudo quando uma única propriedade cruza diferentes zonas ecológicas. Segundo ele, a proposta simplificaria o cumprimento das normas e reduziria os encargos financeiros injustificados.
Comissão de Agricultura apoia, mas Meio Ambiente rejeita
A proposta começou a ganhar força após manobra regimental em novembro de 2024, quando a Comissão de Agricultura da Câmara passou a ser a primeira responsável por analisá-la. A mudança aumenta as chances de aprovação, já que o colegiado é composto, majoritariamente, por parlamentares alinhados ao agronegócio.
Entretanto, o mesmo projeto recebeu parecer contrário na Comissão de Meio Ambiente. O relator naquela instância, deputado Coronel Chrisóstomo (PL-RO), classificou a proposta como um grave risco ao equilíbrio ecológico e aos compromissos ambientais do Brasil. Para ele, remover Mato Grosso da Amazônia Legal fragilizaria os ecossistemas, incentivaria o desmatamento e prejudicaria a agricultura no longo prazo.
Chrisóstomo também argumenta que o Código Florestal já passou por flexibilizações suficientes e que qualquer nova alteração no sentido de reduzir a proteção ambiental representa um retrocesso diante da emergência climática. Ele reconhece as diferenças ecológicas dentro do território mato-grossense, mas acredita que isso justifica políticas específicas de incentivo e não a sua exclusão da Amazônia Legal.
Consequências legais e econômicas da exclusão
Caso a proposta avance e seja sancionada, a nova redação do Código Florestal terá efeitos imediatos sobre propriedades rurais em Mato Grosso, impactando diretamente o Cadastro Ambiental Rural (CAR), as obrigações de recomposição florestal e, possivelmente, a legislação complementar de financiamento ambiental e crédito rural.
A exclusão também poderia afetar o acesso a incentivos vinculados à Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) e comprometer acordos de cooperação internacional voltados à conservação da floresta e à redução de emissões por desmatamento.
Alice Thuault, diretora-executiva do Instituto Centro de Vida (ICV), uma organização que atua pela conservação ambiental em Mato Grosso, alerta para os riscos políticos e diplomáticos da proposta. Ela destaca que o projeto fragiliza a credibilidade do Brasil em fóruns ambientais internacionais, reduz a eficácia de mecanismos de financiamento climático — como o mercado de crédito de carbono — e compromete metas de redução do desmatamento.
“Essa tentativa de retirar Mato Grosso da Amazônia Legal é uma forma disfarçada de abrir espaço para mais desmatamento, legalizando práticas que hoje seriam punidas. A Amazônia está presente no estado, e isso não se altera por decreto”, afirma.
O trâmite legislativo
O projeto de lei segue em tramitação conclusiva, o que significa que, se for aprovado por todas as comissões envolvidas — Agricultura, Meio Ambiente, Integração Nacional e Constituição e Justiça — e não houver recurso de ao menos 52 deputados, ele pode seguir diretamente para o Senado. Caso contrário, será necessário passar pelo Plenário da Câmara dos Deputados antes de seguir adiante.
Mesmo que o Congresso aprove a proposta, ela ainda dependerá de sanção presidencial para se tornar lei. O Executivo poderá, se considerar necessário, vetar total ou parcialmente o projeto, o que abriria nova rodada de discussões no Legislativo.
Em meio a pressões globais
A proposta surge num momento delicado para o Brasil, quando o país tenta consolidar sua posição como líder ambiental no cenário internacional. A aprovação de mudanças que flexibilizem regras de proteção à Amazônia pode gerar repercussões negativas em acordos comerciais, investimentos estrangeiros e cooperação ambiental.
Organizações da sociedade civil e especialistas já manifestaram oposição à medida, destacando que a preservação da Amazônia Legal não é apenas uma questão regional, mas estratégica para o equilíbrio climático global.
O que é a Amazônia Legal?
A Amazônia Legal é uma área delimitada por lei que abrange nove estados brasileiros: Acre, Amapá, Amazonas, Maranhão (parte), Mato Grosso, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins. Criada em 1953 com o objetivo de promover o desenvolvimento econômico e social da região, essa classificação vai além do bioma amazônico e inclui porções significativas de Cerrado e Pantanal. A principal implicação de fazer parte da Amazônia Legal está na aplicação de regras ambientais mais rígidas, como a exigência de preservar 80% da vegetação nativa em áreas de floresta, conforme determinado pelo Código Florestal. A região ocupa cerca de 59% do território nacional e é considerada estratégica tanto do ponto de vista ambiental quanto geopolítico.

Escrito por Compre Rural
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ℹ️ Conteúdo publicado pela estagiária Ana Gusmão sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira
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