Pesquisa milionária acelera o gene da “Carne Macia” na maior raça bovina do Brasil, o Nelore

Mapeamento completo do DNA de milhares de animais identifica os genes do marmoreio na raça Nelore. A nova fronteira da genética bovina pode transformar a qualidade da carne produzida no país, elevando a raça mais presente no rebanho nacional ao patamar das raças premium.

O Brasil está prestes a viver uma virada histórica na pecuária de corte. Uma pesquisa inédita, com investimentos milionários e tecnologia de ponta, está colocando o Nelore — raça que representa cerca de 80% do rebanho bovino nacional — na rota da produção de carnes premium. O projeto, liderado pela Earth Biome, empresa brasileira de biotecnologia, em parceria com a Agro Maripá, está sequenciando o genoma completo de bovinos da raça Nelore, com o objetivo de identificar os genes responsáveis pelo marmoreio, gordura intramuscular associada à maciez e ao sabor superior da carne .

Se hoje os consumidores que procuram cortes marmorizados recorrem a raças como Angus ou Wagyu, a proposta da Earth Biome é transformar o Nelore tropical em uma alternativa competitiva de alta qualidade, sem abrir mão da rusticidade, adaptabilidade e eficiência a pasto — características que fazem da raça o pilar da bovinocultura brasileira.

O coração da pesquisa: genética de precisão

Utilizando a avançada tecnologia de sequenciamento de nova geração (NGS – Next Generation Sequencing), a Earth Biome está lendo com altíssima precisão os 2,8 bilhões de pares de bases do DNA bovino. Ao contrário das técnicas convencionais de genotipagem, que analisam fragmentos, o NGS permite um mapeamento completo e detalhado, revelando mutações, combinações genéticas e relações complexas entre genes que determinam qualidade da carne, saúde, longevidade, eficiência alimentar e adaptação ao clima .

Segundo a Forbes, o sequenciamento inicial foi realizado em 304 animais da Agro Maripá, localizada em Jaguariúna (SP), e com fazendas também em Minas Gerais e Mato Grosso. O Valor Econômico informou que o plano da Earth Biome é ampliar o escopo para 5.000 amostras de animais da raça Nelore — o maior banco genético da raça já registrado no Brasil .

Marmoreio em destaque: três genes e um vilão genético

O avanço mais importante até aqui foi a identificação de três genes diretamente ligados ao marmoreio. No entanto, a surpresa veio com a descoberta de um gene antagônico que pode anular os efeitos positivos dos outros dois. Isso significa que um animal pode carregar genes para marmoreio, mas não expressar a característica na carne caso também carregue esse “gene vilão”.

A partir dessa constatação, o desafio da equipe científica passou a ser a seleção de indivíduos que carreguem apenas os genes positivos, eliminando os anuladores. Essa filtragem será a base para a reprodução direcionada de novos reprodutores e matrizes capazes de transmitir o marmoreio com alta confiabilidade genética.

Marcelo Baptista de Oliveira, CEO da Agro Maripá. Divulgação/Forbes

Do chute ao cálculo: o salto na precisão genética

A precisão nas previsões genéticas dá um salto com a nova abordagem:

Método de seleçãoPrecisão para prever marmoreio
Programas tradicionais (DEPs)Cerca de 37%
Genômica de precisão da Earth BiomeAcima de 80% (podendo chegar a 90%)

Na prática, isso significa sair de um cenário em que apenas 37 em cada 100 filhos de um touro com alto índice de marmoreio realmente expressam a característica, para um patamar em que 8 ou 9 de cada 10 descendentes trarão esse diferencial na carne .

Embriões com destino traçado antes mesmo do nascimento

Outro passo ousado do projeto é o uso do sequenciamento genético em embriões gerados por fertilização in vitro (FIV). A Earth Biome já está aplicando essa técnica, que permite saber antes mesmo do nascimento quais bezerros carregam o pacote genético desejado. Essa antecipação promete revolucionar a pecuária de precisão, reduzindo o tempo de seleção e aumentando a eficiência dos cruzamentos.

Nelore Agro Maripá
Foto: Divulgação

Resultados na prática: da fazenda ao consumidor

A Agro Maripá já tem 52% dos seus machos com marmoreio na raça Nelore acima de 3, e o objetivo é chegar ao nível 4,5 — já alcançado por uma novilha da fazenda — e, no longo prazo, ao nível 10, o mesmo de cortes do Wagyu japonês .

Hoje, a empresa comercializa cerca de 400 touros por ano, e a expectativa é que os reprodutores gerem descendentes com maior valor de mercado, tanto no Brasil quanto em países importadores. Afinal, carnes com alto grau de marmoreio podem valer até o dobro do preço no mercado premium internacional.

Segundo Luiz Otávio Pereira de Lima, médico-veterinário da Agro Maripá, o sucesso do projeto também depende do ambiente em que o animal é criado.

“Mesmo que a genética esteja presente, se não houver nutrição adequada, o marmoreio não aparece. Por isso, padronizamos o ambiente para que os genes possam se expressar ao máximo”, explicou .

Para Carolina Barbosa, fundadora da Earth Biome, o projeto representa um divisor de águas. “Estamos entregando aos produtores ferramentas para decidir o futuro do rebanho ainda na fase embrionária. A pecuária de precisão deixou de ser tendência — tornou-se realidade”, afirmou a CEO da Earth Biome.

Já Marcelo Baptista de Oliveira, da Agro Maripá, reforça: “Se o Nelore alcançar marmoreio elevado mantendo sua rusticidade, redefiniremos o lugar da carne brasileira no mundo”.

O futuro do marmoreio na raça Nelore já tem data

Os primeiros reprodutores selecionados com base no sequenciamento genético deverão ser utilizados a partir do segundo semestre de 2026. Isso significa que, em um ciclo médio de 4 a 5 anos, os efeitos dessa seleção devem chegar ao prato do consumidor brasileiro — e internacional.

A pesquisa divulgada pela Forbes e pelo Valor Econômico representa muito mais que um avanço científico. É um reposicionamento estratégico da carne Nelore, que pode deixar de ser commodity para disputar espaços nobres no mercado gourmet.

Mais que um salto de tecnologia, trata-se de um movimento de valorização genética, sustentabilidade produtiva e afirmação da pecuária tropical. E tudo isso com a base mais sólida possível: o DNA do boi brasileiro.

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