Plano de fertilizantes deve dar resultado só em cinco anos, diz ex-ministro

Roberto Rodrigues elogia iniciativa, mas ressalta que tenta resolver problema de décadas, que vem desde a expansão do agro para o Cerrado

O Plano Nacional de Fertilizantes, lançado no dia 11 de março pelo governo federal, é positivo. Mas os primeiros resultados devem começar a aparecer apenas daqui cinco anos, avalia o ex-ministro da Agricultura e coordenador do Departamento de Agronegócios da Fundação Getúlio Vargas (FGV Agro), Roberto Rodrigues.

“É um plano muito bem feito e está destinado a reduzir a demanda de importações. É importante, estrategicamente falando, mas não acabará com a dependência e não trará resultados rápidos. Vamos continuar importando muito por um bom período, ainda”, diz ele, que acompanhou de perto as discussões, em entrevista à Globo Rural.

Rodrigues pontua que reduzir a dependência do Brasil do fertilizante importado significa modificar uma situação que vem de longa data, ainda reflexo da decisão de expandir a agricultura brasileira para o Centro-oeste a partir do final da década de 1970, o que ajudou a tornar o país um dos maiores produtores e exportadores agrícolas do mundo.

Segundo ele, predominou ao longo dos anos a visão de que era uma solução mais simples e barata importar fertilizantes do que fortalecer a produção nacional. “Fomos comprar adubo lá fora. Montamos uma agricultura pendente e dependente de fertilizante importado. Criamos uma demanda por fertilizante que não tínhamos no Brasil porque, ou era mais caro ou era mais lento”, diz ele.

À medida que a produtividade agrícola foi aumentando e o Brasil foi registrando recorde atrás de recorde de produção, a demanda por adubo cresceu junto. Mas a produção interna não andou no mesmo ritmo. “E, depois, quando se tentou fazer uma estratégia de redução de dependência, não houve interesse. Para um país que pretendia ser liberal, como o Brasil, era mais fácil importar fertilizante e exportar o resultado, o alimento. Não houve uma preocupação estratégica de reduzir a dependência”, resume.

Hoje, de um modo geral, o Brasil compra de outros países o equivalente a cerca de 85% do adubo utilizado nas lavouras a cada safra. A meta do Plano Nacional de Fertilizantes é reduzir a participação dos fornecedores externos no mercado brasileiro a algo como 45% até o ano de 2050.

O Ministério da Agricultura define o plano como uma referência para ações de longo prazo, que envolve produtores rurais, cadeias produtivas emergentes, novas tecnologias e uso de outros tipos de insumos, além do composto NPK. De acordo com governo federal, estão previstas medidas para melhorar o ambiente de negócios e a competitividade, além de incentivo à inovação, com a maior adoção de bioinsumos, orgânicos e organominerais.

O plano inclui medidas de caráter econômico, como aumento de linhas de fomento, incentivo à iniciativa privada para aumento da capacidade de produção e melhorias na logística. E repasse de recursos para a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) colocar em prática projetos que podem contribuir com o aumento da oferta de fertilizantes no Brasil.

Para Roberto Rodrigues, embora seja uma estratégia apresentada pelo governo, a execução será concentrada no setor privado, que tem capacidade de investimentos. Em sua visão, se, antes, não havia, agora há um interesse estratégico de aumentar a produção de adubo no Brasil.

Ao mesmo tempo, afirma, é preciso dar atenção a segmentos que já estão em desenvolvimento no país. O incentivo aos bioinsumos pode ter efeitos positivos em um prazo mais curto. “Pode reduzir a dependência de importação e mesmo da fabricação de adubos minerais. Os biológicos é o que vai crescer mais rápido no Brasil. É o caminho que vai acontecer mais rápido”, diz ele.

Diplomacia do fertilizante

Ao mesmo tempo em que tenta reduzir a dependência de fertilizante importado no longo prazo, o Brasil tenta garantir a oferta já para a próxima safra (2022/2023). Com a escassez , a alta nos custos de produção e as restrições impostas a países como Rússia e Belarus, importantes fornecedores, a incerteza aumentou e especialistas já veem, por exemplo, a possibilidade de expansão menor da área a ser plantada com soja no país.

Roberto Rodrigues lembra que a guerra entre Rússia e Ucrânia agravou uma situação que vinha ocorrendo desde o início da pandemia de Covid-19. Diante das preocupações relacionadas ao avanço do coronavírus, a demanda por alimentos no mundo ficou ainda maior, com países importadores buscando garantir sua segurança alimentar, elevando os preços em escala global.

A situação, acrescenta Rodrigues, levou a uma intenção de plantio maior, elevando a demanda por insumos. “A demanda explodiu, mas as empresas que fabricam esses insumos não estavam flexíveis para aumentar a produção. A demanda cresceu a oferta diminuiu. E os preços subiram”, ressalta, destacando também que a pandemia levou a problemas globais de logística.

Diante da situação, o governo vem tentando reforçar relações com diversos fornecedores externos, o que tem sido chamado de Diplomacia do Fertilizante. A ex-ministra da Agricultura Tereza Cristina chegou a se reunir com representantes do Irã e de outros países árabes. Ela viajou também para o Canadá, onde se encontrou com representantes de empresas e do governo local.

A situação do mercado de fertilizantes deve ser um dos principais temas da agenda do novo ministro da Agricultura, Marcos Montes, empossado no cargo no dia 31 de março. Em maio, o ministro tem viagens previstas para Marrocos, Egito e Jordânia, informou o Ministério.

Na semana passada, Montes se reuniu com representantes do governo do Irã para discutir um aumento na cota de importação de ureia. A intenção, de acordo com o divulgado pela pasta, é ampliar o volume de um milhão para 3 milhões de toneladas.

Na avaliação de Roberto Rodrigues, a ação diplomática do Brasil pode dar resultados e mitigar os problemas com a redução da oferta e o encarecimento do adubo no mercado internacional. Ele pondera, no entanto, que, de um modo geral, a agricultura brasileira não deve ter um prejuízo muito grande se passar uma safra sem adubar ou adubando menos a terra.

O ex-ministro explica que, nas últimas décadas, o produtor rural brasileiro veio aprendendo a importância de utilizar a alta tecnologia na lavoura. Atualmente, diz ele, a agricultura está bastante tecnificada e a terra, “bem tratada”. Desta forma, uma eventual queda de produção não deverá ser tão grave a ponto de provocar um “desastre” no campo.

“Se formos obrigados a usar menos adubo, vai haver uma redução da produção, mas não é grave. Pode reduzir a renda, mas vai reduzir o custo também. E a agricultura está capitalizada, de modo que não haverá um desastre no campo”, avalia.

Fonte: Globo Rural

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