Produtor pode ter pequena propriedade penhorada?

Supremo Tribunal Federal julgou recentemente sobre impenhorabilidade ou não da pequena propriedade rural; confira a decisão dos magistrados

Olímpia Souza de Paula – No último dia 11 de dezembro de 2020, iniciou-se no STF o julgamento sobre a impenhorabilidade ou não da pequena propriedade rural, nos casos em que a família também seja proprietária de outros imóveis rurais. O Ministro Relator, Edson Fachin, propôs a fixação da seguinte tese de repercussão geral: “É impenhorável a pequena propriedade rural familiar constituída de mais de um terreno, desde que contínuos e com área total inferior a quatro módulos fiscais do Município de localização”.

Segundo o Ministro, o artigo 5º, XXVI, da Constituição Federal prevê que a pequena propriedade rural, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva.

Contudo, como o texto constitucional não define qual o tamanho da pequena propriedade rural e silencia acerca dos limites dessa garantia, deve ser utilizada pelo intérprete a regra mais protetiva ao produtor rural.

Dessa forma, no entendimento do Ministro, será aplicado o conceito da Lei da Reforma Agrária, o qual delimita a pequena propriedade rural como sendo aquela com área compreendida entre 1 (um) e 4 (quatro) módulos fiscais.

Nesse cenário, o Ministro afirmou que, desde que observado o referido conceito de pequena propriedade rural, a impenhorabilidade deverá permanecer, mesmo que o grupo familiar seja proprietário de mais de um imóvel.

Ressaltou, ainda, que a impenhorabilidade da pequena propriedade rural, quando essencial ao sustento da família, é direito indisponível e deve ser declarado, pouco importando se o bem foi dado em garantia hipotecária.

Em sua conclusão, o Ministro asseverou que a impenhorabilidade do bem de família, assim como da propriedade rural, encontram-se firmadas pelo princípio da dignidade humana e visam a garantir a preservação do patrimônio mínimo.

O julgamento terminou no dia 18 de dezembro de 2020 e a votação foi bem acirrada. Foram favoráveis pela impenhorabilidade o ministro Luiz Edson Fachin, Marco Aurélio, Carmen Lúcia, Dias Toffoli, Rosa Weber e Ricardo Lewandowski. Os ministros Nunes Marques, Luis Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e Luiz Fux foram contrários à tese.

Logo, o julgamento se deu por maioria e ficou mantida a tese fixada pelo Relator Fachin, de que a pequena propriedade rural é impenhorável, mesmo se oferecida em garantia hipotecária. Aliás, o STJ e alguns tribunais, já vêm acatando essa tese e entendendo pela impenhorabilidade do pequeno imóvel rural há tempos, garantindo, assim, o direito de acesso do produtor rural ao seu meio de sustento – a propriedade rural.

Apesar da vitória, existe um ponto preocupante a ser considerado: como efeito imediato da decisão firmada pelo STF em repercussão geral, cujos efeitos são vinculantes sobre o judiciário, poderá haver impacto negativo no sistema de crédito rural e fomento da agricultura familiar.

Isso porque, com a impossibilidade de hipoteca sobre as pequenas propriedades rurais, é provável que os bancos exijam outras garantias dos pequenos produtores e haja maior dificuldade de acesso ao crédito ou de negociação junto às instituições financeiras.

Nesse sentido, é fundamental reforçar a relevância social e econômica da atividade agrária desempenhada pelos pequenos produtores, de modo que muitos municípios dependem dessa atividade e é fato notório que a agricultura familiar tem grande participação no abastecimento interno do nosso país.

Para os produtores que já estão com as propriedades rurais hipotecadas, é importante informar-se sobre as diversas possibilidades jurídicas que podem ser usadas para proteger o seu patrimônio e sempre buscar assessoria de profissionais especialistas.

Vale lembrar que, no caso do Município de Araçatuba/SP, propriedades rurais com até 120 hectares (quatro módulos fiscais) são consideradas pequenas e podem se beneficiar pela impenhorabilidade. Em locais onde as terras são maiores e menos valorizadas, esse limite pode aumentar consideravelmente, chegando a 300 hectares, por exemplo.

Por fim, é importante esclarecer que essa tese jurídica pode salvar a propriedade rural de vários produtores, mesmo já havendo processos de execução em andamento e leilões agendados.

Siga o Compre Rural no Google News e acompanhe nossos destaques.
LEIA TAMBÉM