“Touro” nasce geneticamente modificado para produzir 75% de bezerros machos, veja

Tecnologia inédita de edição genética aplicada a bovinos permite direcionar o sexo da progênie, aumentar a eficiência produtiva e reduzir impactos ambientais, mas ainda enfrenta desafios regulatórios; Cosmo, bezerro geneticamente modificado nasce para produzir 75% de descendentes machos

A biotecnologia deu um passo ousado e inédito na pecuária mundial. Pesquisadores dos Estados Unidos anunciaram o nascimento de um bezerro geneticamente modificado capaz de gerar até 75% de descendentes machos, uma inovação que pode alterar profundamente a lógica produtiva da carne bovina. Batizado de Cosmo, o animal foi desenvolvido por cientistas da Universidade da Califórnia, em Davis (UC Davis), utilizando técnicas avançadas de edição genômica com CRISPR, ainda na fase embrionária .

A proposta é simples na teoria, mas extremamente complexa na prática: aumentar a proporção de machos nascidos, já que bois apresentam maior eficiência produtiva quando comparados às fêmeas, especialmente na conversão alimentar e no ganho de peso. Na prática, trata-se de uma das aplicações mais avançadas da engenharia genética já testadas em bovinos.

Como funciona a modificação genética

O diferencial do projeto está na inserção direcionada do gene SRY bovino, responsável pelo desenvolvimento das características masculinas. Esse gene foi integrado ao cromossomo 17, após tentativas frustradas de inserção no cromossomo X — estratégia que, em tese, poderia resultar em um animal capaz de produzir apenas machos.

Com essa modificação, mesmo embriões geneticamente XX (fêmeas) que herdem o gene SRY passam a se desenvolver como machos. Segundo os pesquisadores, a distribuição esperada da progênie de Cosmo – bezerro geneticamente modificado – é a seguinte:

  • 50% de machos XY, dentro do padrão natural;
  • 25% de machos XX, geneticamente modificados pelo gene SRY;
  • 25% de fêmeas XX, sem modificação genética.

Na prática, isso significa que três em cada quatro bezerros nascidos teriam características masculinas, algo inédito na pecuária comercial.

Por que produzir mais machos?

A escolha não é aleatória nem apenas genética. De acordo com a geneticista animal Alison Van Eenennaam, do Departamento de Ciência Animal da UC Davis, machos são cerca de 15% mais eficientes na conversão de ração em ganho de peso, além de atingirem pesos finais mais elevados em menos tempo. Isso se traduz em maior produtividade, menor custo por arroba produzida e melhor aproveitamento dos recursos.

Outro ponto central do estudo é o impacto ambiental. Com maior eficiência produtiva, seria possível produzir a mesma quantidade de carne com menos animais, reduzindo emissões de gases de efeito estufa, uso de insumos e pressão sobre áreas de pastagem. “Os pecuaristas poderiam manter apenas um número reduzido de fêmeas para reposição e direcionar a maior parte da produção para machos destinados ao mercado”, explicou o pesquisador Joey Owen, um dos líderes do projeto.

Anos de pesquisa até o nascimento

O desenvolvimento de Cosmo não foi rápido. O projeto levou mais de quatro anos, sendo aproximadamente dois anos e meio dedicados à criação do método de inserção genética e outros dois anos para o estabelecimento de uma gestação bem-sucedida. O bezerro nasceu em abril de 2020, pesando cerca de 50 quilos, dentro dos padrões normais para a espécie.

Agora, os cientistas acompanham o crescimento do animal e aguardam o momento em que ele possa gerar descendentes, para confirmar se o gene SRY será herdado e se, de fato, os bezerros apresentarão desenvolvimento masculino funcional.

Potencial produtivo x barreiras regulatórias

Apesar do avanço científico, o uso comercial dessa tecnologia ainda é incerto. Nos Estados Unidos, a Food and Drug Administration (FDA) regula a edição genética de animais de forma semelhante à aprovação de medicamentos, o que pode impedir que Cosmo e seus descendentes sejam utilizados na produção de alimentos, ao menos no curto e médio prazo.

Esse entrave regulatório levanta debates sobre aceitação do consumidor, segurança alimentar, ética e biossegurança, temas que devem ganhar ainda mais espaço à medida que a biotecnologia avança no campo.

Um marco para a pecuária do futuro

Financiado pelo Departamento de Agricultura dos EUA (USDA), pela Estação Experimental Agrícola da Califórnia e por programas nacionais de pesquisa, o projeto contou com a participação de diversos cientistas renomados. Embora controversa, a experiência com Cosmo é vista como um marco na biotecnologia aplicada à agropecuária, abrindo caminho para novas estratégias de controle genético desde a fase embrionária.

Se hoje o uso comercial ainda encontra barreiras, o experimento deixa claro que o futuro da pecuária pode estar cada vez mais ligado à ciência, à genética de precisão e à busca por eficiência produtiva aliada à sustentabilidade. Cosmo, ao que tudo indica, é apenas o primeiro capítulo dessa transformação.

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