Conheça o primeiro confinamento de bovinos do Brasil que revolucionou a pecuária

Pioneirismo no cocho: Há 60 anos, um pecuarista paulista inovou ao confinar gado no cocho pela primeira vez no país, marcando o início de uma revolução na engorda intensiva e mudando os rumos da pecuária nacional com o primeiro confinamento de bovinos do Brasil

Imagine terminar 3 mil bois por ano em regime de confinamento – hoje isso pode soar corriqueiro em grandes fazendas, mas no início dos anos 1960 era algo inimaginável. Pois em 1961, no interior de São Paulo, um produtor rural ousou fazer exatamente isso. Naquela época, prevalecia a pecuária extensiva e a seca castigava pastagens, fazendo o gado perder peso no inverno. Jacintho Ferreira de Sá, pecuarista de Ourinhos (SP), decidiu enfrentar esse desafio montando o primeiro confinamento de bovinos do Brasil – uma iniciativa pioneira que revolucionou a engorda de gado no cocho e abriu caminho para a pecuária intensiva que conhecemos hoje.

Pecuária nos anos 60 e o desafio da seca

No começo da década de 1960, a pecuária brasileira era marcada por sistemas extensivos de criação. Bois eram criados soltos em grandes pastos e a produtividade dependia das chuvas e do capim nativo. Durante a entressafra (período seco), era comum o rebanho perder peso por falta de pasto de qualidade.

Foi nesse cenário que Jacintho Ferreira de Sá enxergou uma alternativa para driblar a seca. Ele decidiu complementar a alimentação dos bois no cocho durante a seca para evitar a perda de peso do rebanho. Sem imaginar que faria história, Jacintho buscava simplesmente garantir animais gordos o ano todo e aproveitar os preços melhores na entressafra. Essa visão de nutrição estratégica seria o embrião de uma transformação na forma de engordar gado de corte no país.

O pioneiro e a Fazenda Chumbeada

O protagonista dessa história, Jacintho Ferreira de Sá, era um pecuarista do interior paulista, herdeiro de uma tradição familiar no campo. Sua fazenda, chamada Chumbeada, em Ourinhos-SP, foi o palco da inovação. Em 1961, Jacintho construiu ali a estrutura para engorda intensiva de bovinos, num curral especialmente preparado para confinar os animais.

Ele iniciou a terminação de cerca de 3 mil cabeças por ano nesse sistema – um feito impressionante para a época. A façanha foi registrada em 1962 na revista O Dirigente Rural, que destacou Jacintho como “o fazendeiro do mês” por seu pioneirismo.

Contudo, por muitos anos o feito permaneceu esquecido: só décadas depois a família descobriu que aquele projeto fora realmente o primeiro confinamento bovino do país, antecedendo em 11 anos o primeiro confinamento registrado em Goiás.

Meu pai fez este confinamento sem intenção de ser o primeiro… começou sem ter experiência nenhuma”, relembra Fábio Sá, filho de Jacintho e atual gestor dos negócios da família.

primeiro confinamento de bovinos do Brasil
Jacintho Ferreira e Sá, em Ourinhos, SP (1961). Foto Reprodução via Portal DBO

Características do primeiro confinamento de bovinos do Brasil

A estrutura montada por Jacintho trazia soluções inovadoras para a época. Confira os principais destaques:

  • Curral coberto: o confinamento original foi construído com cobertura sobre os currais, pois acreditava-se que o gado precisava de abrigo. Somente mais tarde Jacintho percebeu que a cobertura não era necessária.
  • Cama de casca de amendoim: para evitar lama e dar conforto ao gado, usava-se cascas de amendoim no chão dos currais.
  • Aproveitamento dos dejetos: todo o esterco e urina eram reaproveitados na lavoura de café da fazenda. A operação impressionava: a cada mil bois confinados, recolhiam-se 500 caminhões de esterco.
  • Escala intensiva: a Fazenda Chumbeada conseguia terminar cerca de 3 mil animais por ano, garantindo fornecimento mesmo fora da safra.
  • Negócio de adubo: o excedente de esterco passou a ser comercializado para produtores vizinhos, agregando renda extra ao negócio.
  • Infraestrutura adaptada: Jacintho concretou toda a área do curral, e não só a faixa do cocho, facilitando a limpeza e o manejo.

Legado e evolução da prática

A experiência bem-sucedida na Fazenda Chumbeada provou que era possível engordar bovinos de forma intensiva mesmo na entressafra, desafiando o ceticismo da época. A partir dos anos 1970, outros produtores passaram a adotar a prática, e o confinamento se popularizou nas décadas seguintes.

Hoje, o confinamento é parte essencial da pecuária brasileira: em 2019, foram 4,75 milhões de bois terminados em cocho, e em 2024 o número superou 7,9 milhões de cabeças. O confinamento moderno evoluiu com tecnologias de nutrição, manejo de precisão e foco em sustentabilidade – muito do que já se praticava, de forma rudimentar, na Fazenda Chumbeada.

A antiga área do confinamento pioneiro hoje é o bairro Nova Ourinhos, mas a tradição da família segue viva em outras propriedades, como a Fazenda das Furnas, ainda sob o comando dos filhos e netos de Jacintho.

A história do primeiro confinamento brasileiro é um exemplo de como a necessidade, aliada à inovação, pode transformar o agro. De um galpão coberto com casca de amendoim a um modelo que movimenta milhões de bois por ano, o legado de Jacintho Ferreira de Sá segue inspirando o campo – e construindo o futuro da pecuária intensiva no Brasil.

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