Agricultores dos EUA enfrentam “Déjà vu” com falta de demanda da China após tarifas

Safras abundantes de milho e soja, tarifas impostas por Donald Trump e ausência de compras chinesas trazem à memória o cenário de 2019, deixando produtores americanos em alerta.

A sensação de repetição paira sobre os agricultores dos Estados Unidos. Enquanto percorrem o Heartland, região central do país e berço da produção de grãos, produtores de milho e soja relatam que o atual momento se assemelha de forma preocupante ao ano de 2019. O motivo: a volta de Donald Trump à Casa Branca, a intensificação da guerra comercial com a China e a ausência de compras do maior importador mundial de soja.

A sombra de 2019 volta ao campo

O Pro Farmer Crop Tour, uma das principais caravanas de avaliação de safras do país, percorreu recentemente sete estados para inspecionar lavouras. O que deveria ser apenas um levantamento técnico transformou-se em retrato da ansiedade do setor. Em 2019, tensões semelhantes culminaram em perda de mercado e pressão sobre os preços — cenário que agora retorna.

A safra abundante contribui para o pessimismo. O Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) projeta colheita recorde de milho a partir de setembro. Embora a soja tenha tido área plantada menor, os rendimentos devem atingir patamares históricos. Isso significa maior oferta em um momento de demanda enfraquecida pela China, que ainda não adquiriu nenhum lote da nova safra.

Vozes do campo: incerteza e preocupação

Produtores ouvidos durante o tour reforçam o clima de insegurança. Bill Timblin, agricultor de Nebraska, foi direto: “Eu só queria que eles começassem a comprar novamente”. Já Caleb Ragland, líder da Associação Americana de Soja, enviou carta ao presidente alertando que os agricultores estão próximos de um “precipício comercial e financeiro” e não suportariam uma guerra prolongada.

Além da ausência chinesa, pesa sobre os produtores o aumento nos custos de insumos e maquinário. “Os preços continuam a cair e, ao mesmo tempo, nossos agricultores estão pagando significativamente mais por insumos e equipamentos”, acrescentou Ragland.

Impactos nos preços e no comércio

O reflexo imediato já é visível. Um indicador de preços de grãos monitorado pela Bloomberg caiu ao menor nível desde a pandemia de 2020. Tradicionalmente, a China garante 14% das compras de soja antes da colheita americana, segundo a Associação Americana de Soja. A ausência dessas encomendas preocupa exportadores desde os portos do Meio-Oeste até os corredores logísticos do Noroeste do Pacífico, voltados ao mercado asiático.

O produtor de Dakota do Sul, Steve Swanhorst, afirma que não se surpreendeu, já que Trump havia sinalizado claramente sua política de tarifas. Mesmo assim, a expectativa é de que a China não possa adiar indefinidamente suas compras. Como reforça Chip Flory, veterano do Crop Tour: “A China precisa de soja. Vai chegar um momento em que terão de reservar grãos.”

Tentativas de diversificação e novas rotas

Enquanto o impasse se prolonga, autoridades tentam reduzir a dependência chinesa. Jim Sutter, diretor executivo do Conselho de Exportação de Soja dos EUA (USSEC), declarou estar otimista com a possibilidade de um acordo em breve, embora sem previsão concreta.

O USDA, por sua vez, aponta crescimento das exportações para outros mercados, em busca de compensar as perdas. “As colheitadeiras estão funcionando, e precisamos vender essa safra em todo o mundo”, disse Luke Lindberg, subsecretário de comércio agrícola. Ele destacou que novos acordos comerciais estão em negociação e podem trazer impacto significativo.

Lições da primeira guerra comercial

A apreensão não se limita ao campo. Na Feira Estadual de Iowa, o presidente da Iowa Farmers Union, Aaron Lehman, recordou o trauma da guerra comercial anterior: “Da última vez que passamos por isso, perdemos muitos clientes no exterior e eles não voltaram a nos procurar.”

O temor é que a história se repita. Em 2019, a China buscou suprimentos na América do Sul, fortalecendo competidores como Brasil e Argentina. Agora, diante de estoques cheios e margens apertadas, agricultores norte-americanos receiam perder espaço novamente em um mercado global altamente competitivo.


👉 Este conteúdo foi produzido com base em informações da Bloomberg Línea.

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