Mudança mínima no DNA bloqueia a replicação do vírus da peste suína e abre caminho para uma pecuária mais segura, sustentável e produtiva, com impacto direto no bem-estar animal.
Uma única edição genética foi suficiente para tornar porcos completamente resistentes à peste suína clássica, uma das doenças mais devastadoras para a suinocultura mundial. O avanço, publicado na revista Trends in Biotechnology, foi conduzido por pesquisadores da Universidade de Edimburgo, em parceria com a Agência de Saúde Animal e Vegetal do Reino Unido (APHA), a Universidade de Lübeck (Alemanha) e a empresa de genética animal Genus — a mesma que já obteve aprovação para comercializar suínos resistentes à PRRS (Síndrome Respiratória e Reprodutiva dos Suínos) nos EUA e Brasil.
A peste suína clássica é um vírus altamente contagioso que causa febre, diarreia, abortos e elevada mortalidade. Em surtos recentes, milhões de animais precisaram ser abatidos, como ocorreu na Holanda em 1997. Japão, Filipinas, Europa, Ásia, África e América Latina ainda registram casos, com perdas econômicas bilionárias e barreiras comerciais.
Embora existam vacinas, elas são caras, exigem coordenação complexa e ainda impedem exportações para mercados livres da doença. Qualquer interrupção na vacinação, como aconteceu nas Filipinas, leva a novos surtos.
O vírus da peste suína depende de uma proteína do próprio suíno (DNAJC14) para processar suas cadeias de aminoácidos e se tornar funcional. Os cientistas usaram CRISPR para alterar apenas um aminoácido dessa proteína.
O resultado foi conclusivo, nenhum porco geneticamente editado apresentou sintomas, anticorpos ou traços de vírus, enquanto todos os animais não editados adoeceram.
Pestivírus “parentes” da mesma família causam diarreia viral bovina em bovinos e doença da fronteira em ovinos — enfermidades que não costumam matar em massa, mas reduzem fertilidade, ganho de peso e produtividade. A equipe já investiga a aplicação do mesmo ajuste genético em gado de corte, de leite e ovelhas.
Segundo os pesquisadores, o uso comercial desses animais pode:
- Eliminar a necessidade de vacinação em regiões endêmicas
- Reduzir abates sanitários em massa
- Diminuir emissões de carbono ao evitar perdas produtivas
- Aumentar eficiência da conversão alimentar
- Baratear o custo final da proteína animal
A Genus avalia levar os animais ao mercado, assim como fez com os suínos resistentes à PRRS, já aprovados no Brasil, EUA e outros países. No Japão, edições genéticas já são liberadas para peixes editados via CRISPR. A Inglaterra se prepara para autorizar plantas, mas ainda discute regras para animais — e deve exigir segurança e ausência de dano ao bem-estar.
Até agora, nenhum efeito colateral foi observado, segundo o pesquisador Simon Lillico, mas novos estudos de longo prazo serão conduzidos.
Mesmo erradicada do Reino Unido, a peste suína clássica permanece ativa e economicamente destrutiva em Ásia, África, América Latina e partes da Europa, com consequências diretas para comércio internacional, segurança alimentar e renda no campo. A edição genética, ao atacar o “ponto fraco” do vírus e eliminar a necessidade de controle via vacina, pode reposicionar o eixo sanitário da produção animal global.
Se confirmada em bovinos e ovinos, a mesma abordagem pode inaugurar uma nova era de imunidade de base genética no rebanho mundial, reduzindo perdas, custos e emissões — sem ampliar uso de medicamentos.
Quer ficar por dentro do agronegócio brasileiro e receber as principais notícias do setor em primeira mão? Para isso é só entrar em nosso grupo do WhatsApp (clique aqui) ou Telegram (clique aqui). Você também pode assinar nosso feed pelo Google Notícias.