
O paradoxo da energia solar: Brasil tem sobra de geração limpa, mas consumidor paga bandeira vermelha
O Brasil vive uma situação paradoxal no setor elétrico. Ao mesmo tempo em que se consolida como um dos países com maior crescimento em energia solar no mundo, os consumidores seguem pagando caro pela conta de luz, sob a cobrança da bandeira vermelha.
O caso ganhou destaque após a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) convocar uma reunião de emergência para discutir o risco de apagão causado não pela falta, mas pelo excesso de energia solar nos horários de maior geração.
Nos últimos anos, a energia solar fotovoltaica se tornou a grande protagonista da transição energética brasileira. A geração distribuída, formada principalmente por painéis instalados em casas, comércios e propriedades rurais, já ultrapassou 43 gigawatts de potência instalada, sendo 95% desse montante proveniente do sol.
Esse avanço colocou o país entre os líderes mundiais no setor e transformou a matriz energética nacional em uma das mais limpas do planeta, reforçada ainda pela combinação com fontes hidrelétricas e eólicas.
No entanto, o crescimento acelerado trouxe desafios. No último Dia dos Pais, por exemplo, quase 40% da energia gerada no Brasil veio de sistemas solares fotovoltaicos. O volume foi tão expressivo que obrigou o Operador Nacional do Sistema (ONS) a adotar medidas emergenciais para evitar instabilidades na rede.
O problema é que, diferentemente das grandes usinas controladas pelo governo, a energia gerada de forma distribuída não está totalmente sob coordenação do ONS, o que dificulta o equilíbrio do sistema em horários de pico.
Esse cenário fez a Aneel soar o alarme. A preocupação não está apenas na capacidade de geração, mas na forma como essa energia é integrada à rede nacional. Sem infraestrutura adequada de transmissão e controle, o excesso de produção em determinados momentos pode levar a oscilações de tensão e até ao risco de apagões localizados.
A reunião convocada pelo órgão regulador pretende discutir medidas emergenciais com as distribuidoras para evitar que o avanço da energia solar, em vez de solução, se transforme em problema.
Enquanto isso, a conta de luz continua pesando no bolso dos brasileiros. A manutenção da bandeira vermelha, que encarece a energia elétrica, tem sido alvo de críticas, sobretudo porque ocorre em meio à sobra de geração renovável em horários de sol forte. A justificativa oficial está na necessidade de acionar usinas térmicas em momentos de baixa hidrologia e na intermitência da própria energia solar, que não gera à noite ou em dias nublados. Além disso, os custos de manutenção do sistema, os investimentos em infraestrutura e a reserva de capacidade também recaem sobre a tarifa.
Na prática, o resultado é um paradoxo. De um lado, consumidores que investiram em painéis solares se beneficiam, reduzindo quase a zero o impacto das bandeiras tarifárias. De outro, a maioria da população que ainda depende exclusivamente da rede paga mais caro pela energia, mesmo em um país com abundância de recursos renováveis. Esse contraste tem alimentado o crescimento do setor solar, que se torna cada vez mais atrativo como alternativa de economia e independência energética.
Especialistas apontam que a solução passa por uma modernização urgente da rede elétrica, com maior capacidade de transmissão, sistemas de armazenamento em larga escala e novas regras de integração da geração distribuída. Sem isso, o Brasil corre o risco de conviver com o paradoxo por mais tempo: ser referência mundial em energia limpa, mas ainda punir o consumidor com tarifas altas.
No horizonte, o desafio é conciliar o avanço acelerado da energia solar com a segurança do sistema e com uma política tarifária mais justa. O país tem potencial para se tornar uma potência verde, mas precisa transformar essa abundância em benefício para todos — e não apenas para quem consegue gerar a própria energia.
Quer ficar por dentro do agronegócio brasileiro e receber as principais notícias do setor em primeira mão? Para isso é só entrar em nosso grupo do WhatsApp (clique aqui) ou Telegram (clique aqui). Você também pode assinar nosso feed pelo Google Notícias
Não é permitida a cópia integral do conteúdo acima. A reprodução parcial é autorizada apenas na forma de citação e com link para o conteúdo na íntegra. Plágio é crime de acordo com a Lei 9610/98.