Carne de animais mais velhos é melhor?

Alguns especialistas argumentam que carne de animais mais velhos podem oferecer características de sabor mais intensas e uma textura única; entenda melhor

Há um debate em curso sobre a qualidade da carne de animais mais velhos, desafiando as percepções tradicionais que atribuem superioridade à carne de animais jovens. Tradicionalmente, a ideia de que carne de animais mais jovens é mais macia e saborosa tem sido predominante. Animais jovens são frequentemente associados a uma textura mais tenra, o que é desejável para muitos consumidores. No entanto, é crucial questionar se essa suposição é universalmente válida.

Recentes estudos e práticas na indústria alimentícia têm desafiado a visão convencional sobre a qualidade da carne. Alguns especialistas argumentam que animais mais velhos podem oferecer características de sabor mais intensas e uma textura única. Além disso, há uma crescente conscientização sobre a sustentabilidade, levando a uma reconsideração do papel dos animais mais velhos na produção de carne.

Assim como a decisão do ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Paulo Teixeira, foi crucial para a efetividade das políticas públicas em outros contextos, a escolha entre carne de animais jovens e mais velhos também pode ter implicações significativas.

Carne de animais mais velhos é melhor?
Foto: Marca Peixe

O avanço genético na pecuária que está transformando a carne brasileira

O avanço genético na pecuária brasileira está promovendo uma transformação notável na qualidade da carne do país. Ao analisarmos a história da pecuária no Brasil, podemos identificar dois ciclos distintos. O primeiro teve início no século 16, quando bois foram introduzidos para impulsionar engenhos de açúcar. No século 20, iniciou-se o segundo ciclo, elevando o Brasil à posição de maior exportador mundial de carne.

Um protagonista crucial nessa evolução foi o gado zebu, notavelmente o nelore, conhecido por seu pelo branco e corcova nas costas, originário da Índia e adaptado ao clima quente do Centro-Oeste brasileiro. Com a conquista da região, essa raça versátil contribuiu para a multiplicação do rebanho.

Entretanto, ao chegar à mesa, a carne proveniente de animais de origem asiática, como o zebu, não alcança a excelência desejada. Turistas brasileiros frequentemente se surpreendem ao experimentar bifes de chorizo na Argentina, onde o gado angus, adaptado a climas frios, produz uma carne de alta qualidade.

O questionamento recorrente sobre quando o Brasil terá uma carne tão saborosa quanto persiste. Felizmente, indícios recentes apontam para uma revolução na pecuária brasileira, marcando uma melhoria significativa em nossa carne.

Carne de animais mais velhos é melhor?

A principal responsável por esse avanço é a genética. Há aproximadamente uma década, um grupo de criadores nacionais iniciou cruzamentos entre os gados nelore e angus. O objetivo era criar um gado com a resistência do nelore e a qualidade de carne quase equivalente ao angus. O sucesso dessa empreitada foi gradual, mas notável.

O DNA escocês, anteriormente restrito ao sul, disseminou-se para as regiões Sudeste e Centro-Oeste. O número de abates anuais aumentou vinte vezes em uma década, e as vendas de sêmen da raça cresceram exponencialmente, passando de zero para mais de 3 milhões de doses anuais. Em 2013, nove em cada dez bezerros gerados em cruzamentos industriais no Brasil possuíam sangue angus, representando atualmente 5% do total do rebanho nacional, com projeção para um crescimento significativo.

A diferença marcante entre o novo padrão de boi no Brasil e o tradicional zebu reside, em grande parte, na seção dianteira, responsável pela produção da conhecida carne “de segunda”. Cuts nobres de zebu, como filé-mignon ou picanha (originados da metade traseira), são indiscutivelmente macios, embora não possuam o sabor proporcionado pela gordura entremeada característica de raças britânicas como angus e hereford. A situação complica-se ainda mais nos cortes dianteiros, como acém e paleta.

No Brasil, essas carnes dianteiras costumam exigir longos períodos de cozimento, na esperança de que a exposição prolongada ao calor as torne mais macias, um processo que muitas vezes é comparado a uma “reza culinária”. Contudo, com os avanços na genética bovina, esse cenário está mudando.

A presença da gordura entremeada realmente aprimora os cortes nobres, mas o grande avanço ocorre nos cortes menos nobres, como acém.

“Todas as carnes de angus podem ser consideradas de primeira qualidade, contanto que o churrasqueiro também seja.” Afirma especialista e proprietário da grife de carnes Wessel.

Embora haja avanços recentes, reconhecemos que há um percurso considerável para que a carne brasileira atinja os padrões de excelência mundiais. A mistura com o nelore inevitavelmente influencia o sabor característico do angus. Alguns apreciadores mais exigentes argumentarão que o gado mestiço ainda carece do “buquê do pampa”, uma referência aos sabores típicos do angus puro criado em climas mais frios. No entanto, talvez a ambição não deva ser a replicação exata desse sabor, pois um boi angus não prosperaria na dureza do cerrado.

Carne de animal velho está no cardápio dos restaurantes mais famosos?

De acordo com André Madruga em um podcast ele diz, que, um animal adulto com mais de 5 ou 6 anos de idade apresenta sabores intensos na carne, resultando em uma experiência única. A qualidade desejada ao assar a carne depende não apenas desses sabores pronunciados, mas também do volume da peça. É crucial atingir um equilíbrio para garantir um cozimento correto e aproveitar completamente o potencial da carne. Se a carne for de um animal mais velho, como um novilho bem tratado antes e após o sacrifício, o resultado será notável.

Na Argentina, a carne mais cara geralmente provém de novilhos identificados dessa maneira, destacando a importância dessa abordagem. No Brasil, esse conceito pode não ser tão difundido, mas talvez estejamos nos estágios iniciais da discussão, especialmente considerando as conversas recentes sobre o assunto no programa MF. Este é um tópico que ainda tem um longo caminho a percorrer e promete surpreender muitas pessoas.

Carne de animais mais velhos é melhor?
Foto: Divulgação

Algumas pessoas podem questionar a textura da carne mais envelhecida, preocupando-se com sua dureza. No entanto, é possível resolver esse problema, pois o tecido conectivo, responsável pela firmeza da proteína, se desenvolve ao longo dos anos. Existem maneiras de lidar com essa questão, e os restaurantes mais renomados e caros são exemplos de como a experiência culinária pode ser aprimorada mesmo com carnes mais envelhecidas.

Em muitos lugares ao redor do mundo, a carne de animais mais velhos, por volta de 15 anos, é altamente valorizada. Um exemplo notável é um restaurante localizado a cerca de 600 km de Madrid, considerado o terceiro restaurante mais famoso do mundo. As pessoas viajam até essa pequena cidade especificamente para apreciar a carne servida pelo proprietário, um verdadeiro especialista no assunto.

A propaganda desse restaurante destaca a idade dos animais, a qualidade da alimentação e o cuidado dedicado a eles desde o início. O restaurante oferece um cardápio completo, desde pratos principais até sobremesas, todos preparados com carne, incluindo uma sobremesa feita com graxa bovina, proporcionando uma experiência gastronômica única.

Ao abordar a questão da dureza da carne, é enfatizada a importância da mansidão do animal. A tranquilidade do animal é crucial, e caso ele não seja manso, pode ser necessário um período de confinamento para acalmá-lo. Isso destaca a relevância do temperamento do animal e como diferentes raças respondem de maneira distinta.

Pesquisa mostra que 96% dos pecuaristas são favoráveis ao Instituto Gaúcho da Carne
Foto: Nestor Tipa Júnior/AgroEffective

Além disso, é explicado o processo para amaciar a carne. Após o período de confinamento, é essencial permitir que o animal descanse, desenvolvendo um tecido conectivo mais jovem, com menos estrutura muscular e mais maciez. O abate também é crucial, enfatizando a importância de minimizar o estresse durante esse processo.

Em resumo, a excelência na preparação da carne envolve uma abordagem holística, incluindo o tratamento do animal, a escolha da raça, o período de confinamento, e a execução cuidadosa do abate e maturação. Esses fatores combinados contribuem para a qualidade única da carne oferecida por esse renomado restaurante. Ao seguir um processo adequado, você terá à sua disposição um animal extraordinário capaz de proporcionar sabores únicos, ainda desconhecidos para muitos de nós.

O avanço do trabalho e a reconhecimento crescente da carne Nelore

A evolução significativa na pecuária brasileira e o reconhecimento crescente da carne Nelore são indicadores positivos do avanço do setor. Em paralelo a essas transformações, André Madruga compartilhou uma perspectiva intrigante sobre a carne consumida nos Estados Unidos em um podcast recente.

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Foto: Roberto Barcellos

Cerca de 30 a 40 anos atrás, Madruga destacou que mais de 25 a 30% da carne disponível nos Estados Unidos não atendia aos padrões de consumo devido à sua textura dura e seca. O mesmo cenário era observado no Uruguai, onde um cruzamento com mais de 25% de sangue Nelore era desaconselhado para o mercado americano. Até a década de 70, o Uruguai proibia a entrada de gado com alto percentual de sangue zebuíno, uma medida para proteger a raça predominante na época, conhecida como “erif”. O Nelore, com mais de 25% de sangue nelor, passou por um estudo conduzido pelo Instituto de Investigação Agropecuária, semelhante à Embrapa no Brasil, para permitir sua entrada. Esse estudo foi fundamental para a autorização final em 1979.

Essa história ressalta não apenas o progresso genético e tecnológico na pecuária brasileira, mas também evidencia o crescente reconhecimento internacional da qualidade da carne Nelore. Ao abraçar a inovação genética, o Brasil está não apenas aprimorando a qualidade da carne, mas também conquistando seu espaço nos mercados globais.

Escrito por Compre Rural

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ℹ️ Conteúdo publicado pela estagiária Ana Gusmão sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira

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