Com medo de faltar fertilizante, importadores brasileiros compram demais e sobra produto

Ameaça de escassez devido à guerra da Ucrânia deixou mercado em alerta neste ano, mas agricultores compraram menos devido aos preços altos. Foi preciso até revender uma parte da importação.

No início do ano, quando a Rússia fez seu primeiro ataque à Ucrânia, o mercado agrícola brasileiro ficou preocupado que faltasse fertilizante, já que os russos são os principais fornecedores.

Mas ele encerrará 2022 em um cenário bem diferente, ainda que a guerra continue: sobra produto, a ponto de o Brasil ter tido que revender parte dele para outros países.

Afinal, a preocupação foi em vão?

Não necessariamente. Apesar de o Brasil ser grande exportador de commodities agrícolas, como grãos, tal qual a soja, 70% da matéria-prima dos fertilizantes usados nos plantios vem do exterior, segundo a consultoria agrícola Cogo.

Cerca de 23% dos adubos ou fertilizantes químicos importados em 2021 vieram da Rússia, aponta o levantamento do Comex Stat, do Ministério da Economia.

Por causa da guerra, em fevereiro, os agricultores ficaram preocupados que a safra 22/23 ficasse sem adubo. Era um receio com relação ao futuro, diz Paulo Sérgio Pavinato, professor no departamento de Ciência do Solo, da Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz” da Universidade de São Paulo (Esalq/USP).

A situação fez com que as empresas que vendem fertilizantes corressem para adiantar as compras – o que, geralmente, só acontece no segundo semestre, pontua a consultora do Safras & Mercados Maisa Romanello.

As importadoras buscaram o produto, inclusive, em outros países. A então ministra da Agricultura, Tereza Cristina, chegou a viajar para o Canadá para negociar a compra de potássio.

Ainda na ocasião, o presidente Jair Bolsonaro aproveitou o momento para tentar acelerar a votação de um projeto de lei que libera a mineração em terras indígenas. A ideia era usar essas terras para extrair potássio.

Por que sobrou, então?

Os navios russos continuaram desembarcando normalmente nos portos brasileiros, a despeito das sanções bancárias e logísticas.

O problema é que o preço dos fertilizantes, que já tinha aumentado em 2021, disparou após o início da guerra. Diante disso, muitos agricultores pararam de comprar o adubo, esperando uma queda nos valores.

“Produtores de soja, por exemplo, que é o que mais consome fertilizante no Brasil, tiveram uma redução da adubação”, diz Jefferson Souza, coordenador de fertilizantes da Agrinvest Commodities.

“Então, da metade do ano em diante, começou a acumular fertilizante nos portos. E não estava dando vazão, não estava tendo demanda pelos produtores e isso acabou afetando a capacidade de estoque e, obviamente, precisava dar um destino para o fertilizante”, explica Pavinato, da USP.

Em setembro, entretanto, os preços dos fertilizantes tiveram uma forte queda no Brasil, porque, a princípio, algumas empresas tomaram posições com preços elevados e não conseguiam dar vazão aos produtos.

O tempo de espera para descarregar um navio no país também foi um obstáculo para essa comercialização.

Pavinato aponta que, no auge da guerra da Ucrânia, a tonelada do cloreto de potássio, matéria-prima para fertilizante, custava cerca de US$ 1.300, atualmente está em torno de US$ 780 no porto.

Em outubro, um importador chegou a reexportar 24,7 mil toneladas de fertilizante DAP que chegaram da Jordânia, mas que foram enviados para a Turquia. Ainda em setembro, já havia ocorrido a reexportação de 17 mil toneladas de fertilizantes fosfatados vindos do Egito.

As reexportações são algo totalmente atípico para o Brasil. “Nós não somos exportadores de fertilizantes, nós somos importadores”, destaca Souza, da Agrinvest Commodities.

Porém, os concorrentes, inclusive em outros países, com preços mais atrativos, acabaram sendo escolhidos pelos consumidores do setor.

Em novembro, o Índice de Poder de Compra de Fertilizantes (IPCF) fechou em 1,1, o que significa que o insumo ficou mais acessível para o produtor rural. Houve também a redução média de 7% dos preços dos adubos, em comparação a outubro.

Reexportação com menos taxa

Para não levar muito prejuízo ao revender os produtos, as empresas aproveitam que os portos possuem uma zona de recebimento neutra, ou seja, os impostos só são cobrados após o produto sair dessa área e realmente entrar no país, explica Pavinato.

Ainda assim, reexportar não é o ideal. “O detalhe é que muitos importadores pagaram caro pelo fertilizante que compraram ali em maio, junho, julho. E quando chegou aqui, o preço para viabilizar para ele (reexportar) estava muito caro”, comenta.

Mas Souza aponta que as 17 mil toneladas, volume que foi reexportado em setembro, são pouco representativas na demanda brasileira de insumos.

Até novembro, o Brasil importou 32.699 milhões de toneladas, aponta a Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda). O volume é 7,4% menor que o do mesmo período de 2021.

O que esperar para 2023

Após ter alcançado máximas recordes no início do ano, as cotações dos fertilizantes já recuaram a níveis pré-guerra, pressionadas por um enfraquecimento da demanda, diz o relatório Radar Agro do banco Itaú.

E as perspectivas são mais favoráveis para o próximo ano, confirma a consultora do Safras & Mercados Maisa Romanello.

“A oferta deve se restabelecer e a demanda seguirá com cautela, não aceitando altos patamares. Assim, os preços devem recuar e serem mais baixos do que neste ano. Ainda assim, deverão permanecer acima da média dos últimos anos”, conclui.

Fonte: G1

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