Como reduzir em 15% as emissões de metano na produção de carne: estudo explica

A combinação eficiente dos sistemas Carne Carbono Neutro e Carne Baixo Carbono resulta em um incremento de aproximadamente 8% na produtividade.

A implementação dos procedimentos Carne Carbono Neutro (CCN) e Carne Baixo Carbono (CBC) em um contexto comercial revelou uma diminuição de 12% e 15%, respectivamente, nas emissões de metano provenientes dos animais durante a fase de recria a pasto.

O metano entérico representa um dos principais contribuintes para o efeito estufa, o qual está associado ao aquecimento global. Além de contribuir para a redução dessas emissões, os procedimentos também resultaram em ganhos de peso superiores nos animais, variando entre 2% e 5% em comparação com as práticas convencionais.

Este estudo marca a estreia da aplicação desses protocolos em um rebanho de alto padrão genético. A pesquisa foi conduzida pela Embrapa, na Fazenda Experimental Orestes Prata Tibery Jr., localizada em Uberaba (MG), em colaboração com a Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ).

“A atividade pecuária, quando realizada com recria a pasto e terminação em confinamento, adotando as práticas adequadas, comprovou ser eficaz na redução das emissões, apresentando viabilidade. No caso do Carne Carbono Neutro, embora não seja capaz de neutralizar completamente as emissões, a redução é significativa. Além disso, é crucial destacar que o desempenho dos animais é bastante positivo para os pecuaristas”, destaca Giovana Maciel, pesquisadora da Embrapa Cerrados (DF) e responsável pela condução do experimento.

Incremento na eficiência produtiva

Ao abordar as etapas de recria e terminação, a aplicação dos protocolos CCN e CBC resultou não apenas na redução das emissões de metano entérico, variando de 2% a 5%, mas também em um aumento significativo na eficiência produtiva, com ganhos de 4% a 8% em comparação com as práticas tradicionais de manejo.

Os resultados obtidos destacam a relevância do manejo de pastagens, evidenciando que a implementação dos protocolos CCN e CBC é eficaz, mesmo em rebanhos de elevado padrão genético. O pesquisador da Embrapa Gado de Corte (MS), Roberto Giolo, enfatiza a melhoria tanto na produtividade quanto na redução das emissões de metano entérico no pasto.

Marcas comprometidas com a sustentabilidade

As designações Carne Carbono Neutro (CCN) e Carne Baixo Carbono (CBC) validam que a produção de bovinos de corte em sistemas pecuários neutraliza ou reduz, respectivamente, as emissões de metano entérico.

No caso da primeira, que incorpora a obrigatória presença de árvores no sistema de produção (ILPF ou silvipastoril), considera-se o carbono sequestrado e armazenado nos troncos, bem como sua utilização em produtos de madeira com valor agregado.

A segunda marca refere-se à produção de animais cujas emissões de metano foram mitigadas pelo próprio processo produtivo. Isso é alcançado mediante a redução na idade do abate, aprimoramento da dieta e aumento do estoque de carbono no solo, resultado da adoção de boas práticas agropecuárias, incluindo a recuperação e o manejo sustentável das pastagens e sistemas de integração lavoura-pecuária (ILP).

Prevê-se que o Protocolo CBC estará acessível ao público por meio da plataforma Agri Trace Rastreabilidade Animal, da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), a partir de 2024.

Garantindo a certificação

Para obter a certificação, a propriedade deve cumprir, já na auditoria inicial, os 20 requisitos mínimos essenciais para a implementação do processo, dentro de um total de 67 requisitos que serão gradualmente exigidos ao longo de auditorias bienais. O Carne Carbono Neutro (CCN) está disponível na mesma plataforma desde 2020, para os pecuaristas interessados.

Ao término de um período de 385 dias de avaliação, foi registrado um significativo aumento no ganho de peso final do rebanho:

  • 346 quilos para os animais na área de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF), conforme o protocolo Carne Carbono Neutro;
  • 359 quilos para os animais na área de ILP, no protocolo Carne Baixo Carbono, atingidos aos 21,5 meses de idade.

Esses números representam um incremento de 4,2% e 8,1%, respectivamente, em comparação com o rebanho sob manejo convencional da ABCZ.

A pesquisadora destaca que o principal benefício dos dois protocolos é a notável redução nas emissões de gases de efeito estufa (GEE), acompanhada de um aumento no desempenho individual. Mesmo sem a presença de árvores no sistema ILP, o ganho de peso foi ligeiramente superior ao observado no sistema ILPF, e ambos foram superiores ao rebanho de controle mantido nas demais áreas de pastagem da fazenda.

Lauro Almeida, gerente de melhoramento da ABCZ, relata que, durante o período dos testes, a média de idade de abate no Brasil ainda era de quatro anos.

“Neste programa, conseguimos atingir o peso ideal antes dos 22 meses, demonstrando que é viável reduzir pela metade o prazo comumente utilizado no país”, complementa Almeida.

Da Introdução ao pasto até as avaliações de carcaça

As avaliações dos rebanhos desempenharam um papel integral no Programa Zebu Carne de Qualidade (PZCQ), iniciado pela ABCZ a partir de 2020. Na terceira iteração da prova, realizada entre 2022 e 2023, foi incorporada a medição das emissões de metano entérico.

Os cálculos foram efetuados com base na equação desenvolvida pela Rede Pecus, da Embrapa, a mesma utilizada nos protocolos CCN e CBC. Para estimar as emissões de metano entérico, foram considerados a qualidade da dieta (pasto + ração), a ingestão de alimentos e o ganho médio diário dos animais.

No decorrer da prova, 147 animais foram admitidos, todos resultantes de cruzamentos entre Nelore e outras raças, selecionados por sua excelência genética:

  • 32 Brahmanel (Brahman/Nelore);
  • 32 Guzonel (Guzerá/Nelore);
  • 25 Sindinel (Sindi/Nelore);
  • 26 Tabanel (Tabapuã/Nelore).

“Seguimos as orientações dos dois protocolos: CCN e CBC. Apenas as etapas que não afetam o sistema de produção, como a rastreabilidade do produto, não foram realizadas”, esclarece Maciel.

Entre esses animais, 32 foram escolhidos, sendo oito de cada cruzamento, e divididos em dois grupos – um para a área de Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF) e outro para a de Integração Lavoura-Pecuária (ILP). A fazenda, composta por 20,3 hectares de pasto de braquiária brizantha BRS Paiaguás, foi subdividida em oito piquetes.

A área de lavoura e pecuária foi plantada com milho para silagem, consorciado com capim. Já a área de integração lavoura-pecuária-floresta incluiu quatro espécies arbóreas: teca, eucalipto, mogno e nim. Os demais animais permaneceram nas áreas comuns, seguindo as práticas de manejo rotineiras da ABCZ, e os dados gerados a partir de seu desempenho foram utilizados para comparação dos resultados.

Como reduzir em 15% as emissões de metano na produção de carne: estudo explica
Foto: Agronova Nelore

Introdução ao Sistema

Os animais foram incorporados ao sistema com idades entre seis e oito meses, logo após o processo de desmama. No início da estação seca, em maio de 2022, foram iniciadas as avaliações no pasto, permanecendo por 280 dias, divididos equitativamente entre o período seco e o período chuvoso.

Após essa fase de recria no pasto, os animais foram encaminhados para a etapa de confinamento, com uma duração de 105 dias. Durante esse período, os bovinos foram alocados em currais de confinamento equipados com cochos eletrônicos e balanças de pesagem. O teste transcorreu ao longo de 385 dias.

Lauro Almeida destaca os resultados extremamente positivos: “Os estudos científicos realizados pela ABCZ demonstram globalmente a eficiência e a sustentabilidade da genética zebuína na pecuária tropical. Obtivemos ótimos resultados em uma fazenda eficiente. Esse modelo revela-se economicamente viável e passível de replicação em todo o Brasil.”

Abastecimento nutricional em épocas de escassez

Segundo um especialista da ABCZ, a chave para aprimorar a eficiência na produção pecuária reside em um planejamento eficaz que assegure a suplementação alimentar do rebanho durante os períodos de escassez.

“Os pecuaristas precisam antecipar as necessidades de volumosos para o período seco, considerando opções como silagem de milho, sorgo, cana-de-açúcar ou capim, associadas a animais de boa genética. Ao longo dos três anos do programa, obtivemos resultados extremamente positivos. Os criadores podem adotar estratégias diferentes no manejo de pastagens e no confinamento, visando alcançar um ganho de peso diário de 1 kg, o que representa um desempenho excelente”, esclarece.

Avaliação abrangente dos sistemas

O Programa Zebu Carne de Qualidade (PZCQ) implementou também um sistema de controle de custos de produção. “Durante o período do programa, monitoramos minuciosamente os custos e as receitas, buscando não apenas o resultado global, mas também a performance econômica. Isso nos permitiu calcular o custo por arroba produzida, a receita gerada e, por conseguinte, o lucro”, relata Ricardo Brumatti, professor da Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), responsável pela iniciativa.

Na análise, foram incluídos os seguintes gastos:

Manejo Pecuário

O cuidado com os animais abrange uma gama de fatores, incluindo nutrição, adubação de pastos, saúde, consumo de energia, despesas com pessoal e orientação técnica. Entre as práticas adotadas, destaca-se o uso de silagem e suplementos minerais e proteicos.

Resultados revelam que os sistemas CBC e CCN proporcionam custos mais baixos por arroba para os pecuaristas, sendo de R$ 252,44 e R$ 255,48, respectivamente, em comparação com o rebanho de referência, gerido pela ABCZ, com custo de R$ 261,08.

“Essa discrepância decorre principalmente do desempenho superior do rebanho no CBC, uma vez que os animais foram mais eficientes na utilização dos insumos, que foram uniformes para todos os rebanhos”, informa o professor.

No regime CCN, os animais enfrentaram maior desconforto térmico durante o confinamento (com sombreamento artificial) em comparação com a fase de pasto, devido às condições mais favoráveis durante a recria em sistema ILPF (com sombreamento natural das árvores). Isso se refletiu nos custos de produção e no peso vivo final.

Brumatti destaca a abordagem abrangente do programa, que engloba a avaliação de diversos aspectos, desde a genética, predominantemente zebuína, até o sistema produtivo mais intensivo em pequenas áreas, considerando aspectos econômicos e, agora, as emissões de carbono. “Oferecemos um pacote tecnológico que aborda tanto os aspectos técnicos quanto a realidade econômica do produtor rural”, ressalta.

Análise Pós-Abate: Qualidade e Rendimento em Foco

Após a fase de abate, os animais passaram por uma avaliação detalhada, focada nos indicadores de qualidade da carcaça e da carne. Amostras de contrafilé foram submetidas à análise minuciosa pelo professor Sergio Pflanzer, da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Universidade Estadual de Campinas (FEA/Unicamp).

Os resultados evidenciaram um excelente rendimento da carcaça, atingindo 56,1% (sendo que 55% é considerado um índice de qualidade satisfatório). A cobertura de gordura alcançou os padrões desejados pela indústria, enquanto o desenvolvimento muscular e a taxa favorável de carne aproveitável total foram confirmados. Além disso, ressaltou-se a juventude dos animais no momento do abate.

A avaliação abordou tanto a quantidade quanto a qualidade dos produtos. Para medir a quantidade, foram considerados o peso vivo do animal sem jejum, o peso da carcaça quente, a espessura da gordura subcutânea, a área do olho do lombo e a carne aproveitável total.

Quanto à qualidade, os parâmetros abrangeram a idade de abate, o acabamento da cobertura, a presença de gordura intramuscular e a maciez da carne.

Emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE) na Pesquisa

A pesquisa abordou as fases de recria e terminação ao aplicar os protocolos. Contudo, ao incluir as estimativas de emissões na fase de cria ao longo dos 595 dias do ciclo de produção, os animais do programa da ABCZ apresentaram uma intensidade de emissão (IE) de 142,36 gramas de metano por quilo de ganho de peso. Em comparação, nos protocolos CCN e CBC, a IE foi de 99% e 97% desse valor, respectivamente, indicando uma emissão 1% e 3% menor nesses sistemas.

De forma geral, a média anual de emissão de metano entérico (CH4) dos animais nos três sistemas foi de 46,5 kg, aproximadamente 17% abaixo do parâmetro estabelecido pelo Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC), que é de 56 kg de CH4/ano. Isso sugere que todos os sistemas foram eficazes na redução das emissões de metano entérico.

“As emissões foram menores na fase de recria, evidenciando a aplicação dos protocolos no manejo do pasto. Posteriormente, na fase de terminação/confinamento, a diferença diminuiu um pouco. No entanto, nosso foco principal está na fase de recria, onde a diferença em favor do uso dos protocolos ficou clara”, observa Giolo.

O pesquisador destaca o potencial de melhoria no desempenho animal e na consequente redução das emissões de metano entérico em pasto. “No entanto, é necessário aprimorar o ajuste do pastejo nos últimos ciclos, principalmente para o protocolo CCN”, informa.

Os próximos passos incluem cálculos relacionados ao carbono no solo e nas árvores, bem como a coleta de dados sobre o consumo de água.

Acompanhamento econômico na produção de carne

Ao analisar os custos de produção nos sistemas Carne Carbono Neutro e Carne Baixo Carbono, destaca-se que a nutrição do rebanho representou a maior despesa. Brumatti ressalta que os estudos registraram as flutuações no mercado, tanto em termos de custos quanto de receitas.

Entre as safras de 2020/2021, quando o programa teve início, e 2022/2023, ocorreu uma redução nos lucros da fazenda. “O melhor resultado foi na primeira safra, no início da pandemia, quando os preços ainda estavam estáveis. Na segunda, houve uma pequena queda na receita, mas um aumento expressivo nos custos produtivos; foi o pior momento da pandemia, com fertilizantes e insumos nutricionais se tornando significativamente mais caros – um aumento de 26% em relação à safra anterior”, lembra o professor.

Na terceira safra, os custos permaneceram praticamente os mesmos, mas houve uma queda acentuada no preço da arroba, superior a 21%.

Brumatti destaca que esses resultados refletiram as condições do mercado nesse período: “O preço do boi gordo é determinado pelo mercado. Na fase do abate, o pecuarista está sujeito às oscilações do mercado, e o projeto sentiu a queda no preço da arroba no último ano. O programa refletiu o que aconteceu com o produtor rural.”

No entanto, ele enfatiza que, por ser muito realista, o programa permite testar ferramentas que podem ser úteis aos produtores: “É crucial que os produtores possam analisar o fluxo de caixa, controlar os custos para enfrentar momentos desafiadores e fazer projeções do valor da arroba para calcular a diária do confinamento, determinando a receita mínima necessária para cobrir os gastos naquela safra. Todas essas análises foram realizadas nas etapas do programa da ABCZ”, acrescenta.

Garantia de qualidade na Produção de Carne

Na fazenda Orestes Prata Tibery Jr., os rebanhos passaram por testes pós-abate para avaliar seu desempenho em termos da qualidade da carcaça e da carne resultantes. O professor da Unicamp explica que o objetivo foi verificar a qualidade da carcaça oferecida pelo pecuarista ao frigorífico e da carne disponibilizada pelo frigorífico ao consumidor.

“O produtor rural é remunerado com base no peso da carcaça, então é crucial que ele tenha uma compreensão do rendimento do animal após o abate. Enquanto isso, o frigorífico busca carne que seja macia, saborosa e suculenta, características valorizadas pelo mercado”, destaca.

Pflanzer esclarece que os indicadores utilizados fornecem respostas para essas questões. A idade de abate está diretamente relacionada à maciez da carne, e a gordura intramuscular, conhecida como mármore, também desempenha um papel nesse aspecto.

Os resultados indicam que os rebanhos apresentaram um bom rendimento de carcaça, atingindo 56,1%, o que, de acordo com o professor da Unicamp, é considerado um índice excelente. Além disso, foi observada a presença da quantidade desejada de gordura pela indústria, um desenvolvimento muscular adequado expresso pela área do olho de lombo, e uma boa proporção entre carne, osso e gordura na carcaça, indicando um índice positivo de carne aproveitável total.

Quanto à gordura intramuscular e à maciez da carne, os resultados estão diretamente relacionados à genética das raças zebuínas.

“Por meio dos protocolos, conseguimos confirmar as habilidades do Nelore na produção eficiente, econômica e sustentável de carne e carcaça, atendendo à demanda nacional e global dos frigoríficos por proteína animal. O Brasil, como grande produtor de carne, demonstra que esses animais têm a capacidade de fornecer carne de alta qualidade a partir de um rebanho com uma base genética sólida”, conclui.

Escrito por Compre Rural

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ℹ️ Conteúdo publicado pela estagiária Ana Gusmão sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira

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