Como velhos gargalos corroem a riqueza do agro mesmo em ano de supersafra

Entenda os problemas estruturais que drenam a rentabilidade do produtor e as estratégias essenciais para mitigar esses prejuízos

A agricultura brasileira caminha para mais um marco histórico. Segundo as projeções mais recentes da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) para o ciclo 2025/26, o país deve colher uma supersafra estimada em 354,8 milhões de toneladas de grãos. O volume confirma a vocação do Brasil como celeiro do mundo, mas esconde uma realidade financeira dura da porteira para dentro.

Embora a produção cresça a passos largos, a rentabilidade do produtor não acompanha o mesmo ritmo. O setor enfrenta o que analistas chamam de “erosão estrutural da renda”, causada principalmente pelos velhos gargalos do agronegócio. Estes problemas crônicos de infraestrutura e logística atuam como “sócios ocultos”, confiscando uma fatia cada vez maior do faturamento antes mesmo que o grão chegue ao porto.

Armazenagem: O maior dos gargalos do agronegócio

O problema mais crítico e imediato é o déficit estático de armazenagem. O Brasil produz muito mais do que consegue estocar, criando uma pressão de venda artificial no momento da colheita. Este é, sem dúvida, um dos mais severos gargalos do agronegócio nacional.

Dados cruzados da Conab e da Associação Brasileira da Indústria de Armazenagem (ABIA) revelam um cenário alarmante para 2025:

  • Déficit Real: O Brasil já supera a marca de 125 milhões de toneladas sem espaço adequado para armazenagem estática.
  • Capacidade vs. Produção: Enquanto a FAO (ONU) recomenda que um país tenha capacidade para armazenar 1,2 vezes a sua safra anual (120%), o Brasil mal cobre 65% da sua produção.

O impacto no bolso do produtor

Sem silos na fazenda, o produtor perde completamente o poder de barganha. Ele se vê obrigado a vender a soja ou o milho “na boca da safra”, exatamente quando a oferta é máxima e os preços despencam no mercado físico (fenômeno conhecido como basis negativo).

Estima-se que o agricultor que não possui armazenagem deixe de ganhar entre R$ 10,00 e R$ 15,00 por saca, apenas por não poder esperar o melhor momento de venda na entressafra. Essa perda de receita é consequência direta da falta de infraestrutura, um dos gargalos do agronegócio que mais penaliza a renda no campo.

A Logística Rodoviária e o “Custo Brasil”

Se o grão não fica no silo, ele precisa ir para a estrada imediatamente. A dependência excessiva do transporte rodoviário — que ainda movimenta mais de 60% da safra nacional — agrava os gargalos do agronegócio relacionados ao escoamento.

Em anos de supersafra, a demanda explosiva por caminhões inflaciona o valor do frete. Estudos da ESALQ-LOG (USP) mostram que o custo logístico em regiões distantes do litoral, como o Médio-Norte de Mato Grosso (eixos Sorriso/Sinop), pode consumir de 25% a 30% da receita bruta da saca de soja.

Além do preço do diesel e do frete em si, há o custo da ineficiência:

  1. Filas nos Portos: O tempo de espera excessivo em portos como Santos e Paranaguá gera multas por atraso (demurrage), que são repassadas ao produtor no desconto do preço final.
  2. Perdas no Transporte: O desperdício de grãos nas rodovias precárias soma prejuízos milionários, evidenciando como os gargalos do agronegócio drenam a riqueza física e financeira do setor.

Custo de produção e juros: A conta que não fecha

Não são apenas os problemas de “saída” (escoamento) que preocupam, mas também os custos de “entrada”. O IMEA (Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária) aponta que o Custo Operacional Efetivo (COE) para a safra 2025/26 permanece em patamares elevados.

Ainda que o preço de alguns fertilizantes tenha se estabilizado, o custo de capital subiu drasticamente. Com a taxa Selic mantida em patamares restritivos pelo Banco Central para controlar a inflação, o crédito rural (tanto para custeio quanto para investimento) ficou mais caro.

O produtor colhe mais sacas por hectare, mas precisa de mais sacas para pagar o mesmo trator ou a mesma tonelada de adubo. A “Relação de Troca” piorou, mostrando que os gargalos do agronegócio também possuem uma vertente financeira e macroeconômica.

Soluções: Como mitigar os gargalos do agronegócio?

Diante da lentidão histórica das obras públicas de infraestrutura (como a Ferrogrão), a solução para proteger a riqueza do campo passa pela gestão privada e estratégias defensivas. Especialistas apontam três caminhos para contornar esses gargalos do agronegócio:

  1. Investimento em Armazenagem Própria (On Farm): É a medida mais eficaz. Quem tem silo vira “dono do preço”, podendo vender escalonado ao longo do ano. Programas de financiamento como o PCA (Programa para Construção e Ampliação de Armazéns) são vitais para reduzir esse déficit.
  2. Gestão de Risco (Hedge): O uso de travas de preço na B3 ou na Bolsa de Chicago, além de contratos de Barter (troca de insumo por produção), é essencial para garantir que o custo de produção seja coberto, independentemente da volatilidade.
  3. Associativismo e Condomínios: Para pequenos e médios produtores, a união em cooperativas ou condomínios de armazenagem tem se mostrado uma saída viável para diluir os altos custos de investimento inicial e ganhar escala logística.

A supersafra de 2025/26 é uma conquista da tecnologia, da genética e do esforço do produtor brasileiro. Porém, enquanto o país não resolver a equação logística e investir pesado em infraestrutura, continuaremos correndo o risco de “trabalhar para pagar contas”, vendo a riqueza escoar pelos gargalos do agronegócio.

Escrito por Compre Rural

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ℹ️ Conteúdo publicado pela estagiária Ana Gusmão sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira

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