Conheça Chirikof Island, reconhecida como a ilha das vacas selvagens

Chirikof Island abriga gado selvagem com genética única, mas governo debate remoção para restaurar ecossistema nativo.

Em meio ao cenário inóspito do arquipélago de Kodiak, no Alasca, a Ilha Chirikof [ Chirikof Island ] abriga uma das populações mais peculiares e controversas de gado selvagem do mundo. Estima-se que entre 750 e 2.000 cabeças de gado vivem ali em estado completamente selvagem, vagando livremente por uma terra esquecida entre os interesses da conservação ambiental e da preservação genética.

Esse rebanho peculiar descende de bovinos introduzidos ainda no século XIX, com o objetivo inicial de abastecer uma fazenda de raposas. Com o fim da atividade e sucessivos fracassos em tentativas de rancho, os animais permaneceram na ilha, evoluindo por conta própria e tornando-se geneticamente distintos após mais de um século de isolamento.

A Chirikof Island integra o Refúgio Nacional de Vida Selvagem Marítima do Alasca (USFWS), criado para proteger espécies nativas de aves aquáticas e marinhas, além de sítios arqueológicos. No entanto, a presença do gado ameaça esse equilíbrio. Sem manejo, os animais causam danos ao solo, pastagens nativas e zonas úmidas, comprometendo tanto a vegetação local quanto locais arqueológicos valiosos.

Relatórios apontam que o pisoteio do gado aumenta a erosão e destrói habitats de aves em áreas de nidificação terrestre. Isso levou o USFWS a considerar a remoção dos animais, proposta que chegou a ser barrada no Congresso, mas permanece em debate.

Chirikof Island
Foto: Divulgação

Apesar das pressões ecológicas, o gado de Chirikof Island carrega um patrimônio genético singular. Um estudo conduzido em 2007 por pesquisadores do Repositório Nacional de Germoplasma Animal do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) revelou que os animais apresentam alta proximidade genética com o gado Yakut da Rússia, refletindo a herança dos primeiros colonizadores russos na região.

Essa adaptação genética os torna resistentes ao frio extremo e aptos à alimentação exclusiva de pasto, uma característica valorizada por criadores que buscam alternativas sustentáveis na produção de carne bovina. Especialistas sugerem que essa linhagem poderia ser essencial para programas de cruzamento ou mesmo como base de uma nova raça pura adaptada ao clima rigoroso do norte do continente americano.

Ao longo do século XX, diversos empreendimentos tentaram explorar a produção de carne na ilha. O mais ambicioso deles teve início em 1925, com a criação da Chirikof Cattle Company, idealizada por Jack McCord, um fazendeiro do Iowa. O projeto recebeu um financiamento de US$ 875 mil em 1983 para introdução de 600 novas cabeças.

Foto: Divulgação

Contudo, as dificuldades logísticas, os acidentes e a baixa qualidade da carne relatada pelos trabalhadores inviabilizaram o sucesso comercial. A carne era descrita como dura, de difícil digestão e imprópria para o mercado de corte convencional.

A situação gera um dilema entre preservar a vida selvagem nativa e conservar uma linhagem bovina rara. O governo do Alasca não reconhece o gado como espécie nativa, mas moradores locais e defensores do patrimônio genético propõem alternativas à erradicação, como:

  • Uso de matadouros móveis, como já ocorre na vizinha Ilha Sitkinak, para aproveitamento da carne;
  • Coleta de germoplasma pelo USDA para fins de preservação genética;
  • Transferência controlada de animais vivos para outras áreas, como foi feito nas Ilhas Aleutas.

Essas alternativas, porém, dependem de financiamento público e autorização federal, além de uma complexa logística para remoção dos animais sem crueldade e com segurança.

Foto: Divulgação

O cenário mais temido por ambientalistas e defensores do gado Chirikof seria a erradicação total dos animais, sem qualquer salvamento genético — prática já aplicada nas Ilhas Shumagin durante a década de 1980, quando a maioria dos bovinos foi simplesmente abatida e deixada para apodrecer.

O caso do gado Chirikof é frequentemente comparado à preservação do Texas Longhorn, salvo da extinção pelo Refúgio Nacional de Vida Selvagem de Wichita Mountain, em Oklahoma, em 1927. Segundo especialistas, um programa semelhante poderia ser criado para proteger a linhagem russa-alasca da ilha.

Na Ilha Chirikof, o gado não é apenas parte da paisagem — é parte da história. Eles simbolizam a resistência, a adaptação e a tensão entre natureza e intervenção humana. A decisão entre a erradicação, o manejo ou a conservação desses animais se transformou em um debate ético, econômico e ambiental de grandes proporções.

Enquanto o futuro da manada permanece indefinido, a Ilha das Vacas segue como um lembrete poderoso da complexa relação entre a atividade humana, a biodiversidade e o legado genético de espécies adaptadas ao improvável.

Quer ficar por dentro do agronegócio brasileiro e receber as principais notícias do setor em primeira mão? Para isso é só entrar em nosso grupo do WhatsApp (clique aqui) ou Telegram (clique aqui). Você também pode assinar nosso feed pelo Google Notícias.

Siga o Compre Rural no Google News e acompanhe nossos destaques.
LEIA TAMBÉM