Conheça o maior produtor de sal, um “Império do Sal” que domina 95% da produção nacional

Entre sol, mar e tecnologia, o setor salineiro do RN, maior produtor de sal, é motor econômico e cultural — mas arrefece ameaças externas, tarifações e desafios logísticos

O Rio Grande do Norte consolidou-se como protagonista absoluta da produção de sal no Brasil: com cerca de 95% da produção nacional de sal marinho, o estado transformou suas condições naturais em vantagem competitiva, abastece a indústria brasileira e figura entre os grandes fornecedores globais.

No entanto, esse império sustentado por salinas, terminais marítimos e uma cadeia produtiva forte vive dias de incerteza. A mais recente ameaça é uma tarifa de 50% imposta pelos Estados Unidos sobre importações de sal brasileiro, que, segundo o sindicato local, pode colocar em risco até 4 mil empregos diretos no setor no RN.

Esta reportagem do Compre Rural mergulha nos números, na geografia, na logística, nos desafios e nas perspectivas desse “império do sal” nordestino.

1. Condições naturais e herança histórica

Sol, vento e clima semiárido

As salinas potiguares beneficiam-se de características climáticas raras: baixíssima pluviosidade, altas temperaturas médias (acima de 27 °C segundo estudos locais) e fortes ventos alísios, favorecendo a evaporação da água e a cristalização do sal.

Geograficamente, grande parte das salinas ocupa áreas que antes eram manguezais ou terrenos de sedimentos fluviomarinhos — transformadas com canais, tanques e bombas para captação de água salgada.

Tradição e mecanização

A extração de sal no litoral potiguar antecede a colonização formal. Há relatos de indígenas coletando sal em lagoas naturais. Mas foi ao longo dos séculos XIX e XX que a atividade se organizou, com o uso de bombas, drenagens e canais. A mecanização se intensificou entre as décadas de 1970 e 1980.

Mesmo com avanços tecnológicos, a literatura aponta que o setor carece de uma estrutura organizacional sólida — ambientalmente, regulatoriamente e em inovação — para elevar sua eficiência plena.

2. O protagonismo do RN e as empresas-chave

Participação nacional e concentração

O RN é responsável por cerca de 95% da produção de sal marinho brasileira, segundo trabalhos acadêmicos recentes.

Mesmo diante de ligeiras variações em fontes jornalísticas (algumas apontam até 98%) (Movimento Econômico), está claro que a liderança potiguar é esmagadora no Brasil.

Além disso, 76% dessa produção está concentrada em apenas seis empresas: duas de grande porte e quatro de médio porte.

Entre os nomes mais reconhecidos:

  • Salina Diamante Branco (SDB) — parte de grupo internacional, atua em sal bruto e refinado
  • Salinor — frequentemente citada como a maior produtora nacional
  • Norsal e outras refinarias locais

O modelo de negócios varia entre produtores-integrados, arrendamentos de estruturas e empresas que operam apenas o refino ou a marca, sem manter salinas próprias.

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3. Logística e a engrenagem do Porto-Ilha (TERSAB)

O que é o TERSAB

O Terminal Salineiro de Areia Branca, também conhecido como Porto-Ilha, é uma estrutura off-shore (em mar aberto) construída para escoar o sal potiguar.

Distante cerca de 26 km do continente, ou 14 milhas náuticas, do município de Areia Branca, é conectado ao litoral por instalações terrestres (GERTAB) que dão suporte administrativo e logístico.

O canal de acesso marítimo ao Porto-Ilha possui profundidade mínima de 11 metros e largura entre 400 e 1.000 metros, permitindo a atracação de barcaças de grande porte.

Capacidade e operação

Em leilão organizado pela ANTAQ em 2021, o TERSAB foi arrendado por 25 anos ao Consórcio Intersal, que prometeu investir cerca de R$ 164 milhões.

Em 2021, o porto embarcou 1.986.590 toneladas de sal.

Segundo o plano diretor (PDZ 2021), o porto organizado (abrasão continental + ilha) abriga toda a infraestrutura portuária, cais, docas, armazéns e instalações de armazenagem terrestre.

O PDZ ainda aponta que o setor salineiro gera mais de 15 mil empregos diretos e até 60 mil indiretos, pela extensão das cadeias de logística, transporte e serviços.

4. Mercado, exportações e ameaças

Rota externa e dependência dos EUA

Entre 2018 e 2024, os Estados Unidos responderam por 47% do faturamento externo do sal do RN, com média anual de 530 mil toneladas exportadas.

A tarifa de 50% imposta pelos EUA ameaça esse fluxo, o que pode resultar em perda de mercados e inviabilização do uso do Porto Ilha. O sindicato SIESAL alerta que até 4 mil empregos diretos podem estar em risco.

Impactos e limitações de redirecionamento de mercado

A nota técnica divulgada pelo sindicato argumenta que a logística inviabiliza o redirecionamento de grandes volumes para mercados distantes, como Europa ou Ásia. Além disso, países concorrentes como Chile, Egito, Namíbia e México enfrentam tarifas menos drásticas no mercado americano, o que coloca o sal brasileiro em desvantagem.

Incentivos governamentais

Em 2025, a indústria salineira do RN foi incorporada ao PROEDI (Programa de Estímulo ao Desenvolvimento Industrial) via decreto estadual, concedendo incentivos fiscais ao setor. Esse movimento atende a uma demanda histórica de empresas locais, que reivindicavam tratamento equivalente ao de outros segmentos industriais.

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5. Desafios e perspectivas

Qualidade, regulação e financiamento

Um dos obstáculos é a conformidade regulatória: o sal de uso humano deve obedecer padrões de iodação, pureza e controle físico-químico. Em algumas amostras, empresas são penalizadas pela fiscalização da ANVISA.

O setor também sofre por falta de estrutura coesa: disputas regulatórias (IBAMA, IDEMA, Ministério Público), ausência de coordenação institucional e escassez de programas de inovação dificultam avanços mais ambiciosos.

Modernização, eficiência e sustentabilidade

Para resistir aos ventos adversos do mercado internacional, o setor aposta em tecnologia — sensores, drones, monitoramento climático, e também no uso de fontes renováveis como solar e eólica para reduzir custos energéticos. (Essa trajetória é apontada nas análises do setor salineiro local, ainda que não quantificada nas fontes recentes.)

Outro caminho é diversificar usos do sal potiguar: insumos para a indústria química, dessalinização, ou ainda estudos sobre aplicações em baterias e processos ambientais — mas esses mercados exigem escalabilidade e inovação.

Clima e variabilidade

Embora o clima semiárido favoreça a evaporação, anos com chuvas acima da média ou eventos extremos podem reduzir produtividade e alongar os ciclos de produção — um risco inerente à operação natural do processo.

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Como é feito o sal marinho nas salinas potiguares

  1. Captação da água salgada em lagoas, canais ou estuários próximos ao mar.
  2. Pré-evaporação e decantação em tanques rasos: a água perde volume e concentra os sais.
  3. Evaporação final (energia solar + vento): os sais precipitam como cristais em lajes de sal.
  4. Colheita: maquinaria (tratores, grades e sistemas hidráulicos) recolhe o sal bruto.
  5. Beneficiamento: lavagem, secagem, moagem e, para sal de mesa, refinamento e iodação.
  6. Armazenagem e expedição para refinação local, consumo nacional ou exportação via Porto-Ilha.

O “Império do Sal” do Rio Grande do Norte é uma fusão fascinante de natureza, técnica e força social. Ao dominar praticamente toda a produção nacional de sal marinho, o estado construiu uma cadeia logística e empresarial única no Brasil, tornando-se o maior produtor de sal.

No entanto, o cenário externo — especialmente a tarifa americana recente — converteu-se em um teste de resiliência: manter mercados, proteger empregos e modernizar a infraestrutura é a equação que decidirá se esse império continuará a brilhar ou se retrairá sob pressões globais.

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