
Para os produtores rurais, compreender o terroir é descobrir o segredo que transforma um produto comum em algo memorável e valorizado no mercado
Você já se perguntou por que certos queijos possuem um sabor profundo e inconfundível, por que alguns vinhos trazem notas aromáticas que parecem contar a história de um lugar, ou por que cafés de uma mesma espécie variam tanto entre regiões? A resposta pode estar em um conceito fundamental, e muitas vezes subestimado, chamado terroir.
Esse termo francês, pronunciado “terruár”, representa muito mais do que geografia. Ele traduz a identidade sensorial de um alimento forjada pela interação entre natureza e manejo humano. Para os produtores rurais, compreender o terroir é descobrir o segredo que transforma um produto comum em algo memorável e valorizado no mercado.
O que é terroir e por que ele importa no agro
O terroir é a combinação única entre clima, solo, relevo e práticas humanas em uma determinada área de produção. Ele nasceu como conceito no universo dos vinhos, na França, e hoje já se expandiu para produtos como café, queijos, azeites, cacau e até mel.
Mas ele não se resume ao local de origem. Terroir é a assinatura invisível da terra no sabor. É o que diferencia um café robusta amazônico de um arábica mineiro, mesmo que ambos sejam processados com o mesmo cuidado técnico. É o que dá a um queijo da Serra da Canastra sua textura untuosa e sabor intenso. Ou ainda, o que torna os espumantes da Serra Gaúcha diferentes dos da Campanha.
Na prática, o terroir pode ser o fator-chave para agregar valor, conquistar indicações geográficas e abrir portas para mercados premium, algo especialmente relevante para o Brasil, país de dimensões continentais e enorme diversidade de ambientes produtivos.
Os 4 pilares do terroir
Clima
O clima atua como maestro na sinfonia do sabor. Temperaturas, insolação, umidade e regime de chuvas determinam o ciclo das plantas e o metabolismo de seus frutos. No caso do café, por exemplo, regiões quentes tendem a gerar grãos mais doces e frutados, enquanto climas amenos favorecem a acidez e a complexidade.
No vinho, variações climáticas explicam por que uma mesma uva, como a Malbec, gera perfis tão distintos no Brasil, Argentina ou França.
Solo
Os solos oferecem mais do que suporte às raízes: fornecem minerais e nutrientes que participam diretamente da composição química e sensorial dos produtos. Solos vulcânicos, por exemplo, costumam gerar cafés com acidez brilhante e notas cítricas. Já solos calcários conferem mineralidade marcante a certos vinhos.
A textura (argilosa, arenosa, siltosa), o pH e a retenção de água também são determinantes. E, claro, tudo isso depende do uso correto e consciente do solo, sem degradação.
Topografia
A altitude e o relevo influenciam microclimas e o tempo de maturação dos frutos. Cafés de altitude (acima de 1.000 m) tendem a amadurecer mais lentamente, concentrando açúcares e compostos aromáticos. Já vinhedos em encostas aproveitam melhor a insolação e drenam melhor a água, favorecendo a sanidade das uvas.
Na Campanha Gaúcha, por exemplo, a topografia plana associada ao clima quente cria um terroir distinto para vinhos tintos encorpados.
Fator humano
O produtor rural é parte essencial do terroir. Técnicas de manejo, época de colheita, processos de fermentação, maturação ou cura são escolhas que amplificam ou neutralizam os efeitos do ambiente. O saber-fazer local, muitas vezes passado entre gerações, é tão valioso quanto qualquer dado climático.
Esse elemento humano é o elo entre tradição e inovação, e é ele que define se o terroir será potencializado ou desperdiçado.
Terroir na prática: café, vinho e queijo
Café: os sabores da Amazônia
Na 12ª Semana Internacional do Café de 2024, os Robustas Amazônicos ganharam os holofotes. Produzidos no Acre, Amazonas e Rondônia, eles encantaram o júri com notas sensoriais exóticas, fruto de um terroir singular: clima úmido, solo rico e técnicas tradicionais aprimoradas.
Um café indígena da etnia Suruí Paiter chegou a conquistar 100 pontos em um concurso nacional, prova de que o terroir amazônico pode competir no mais alto nível do mercado.
Vinho: identidade engarrafada
O Brasil possui pelo menos oito regiões com Indicação Geográfica reconhecida para vinhos, sendo o Rio Grande do Sul a principal referência. A Campanha Gaúcha, por exemplo, tem clima mais seco e quente, o que favorece uvas tintas mais estruturadas. Já a Serra Gaúcha, mais úmida e fresca, é ideal para espumantes.
A Embrapa desenvolveu cultivares como a BRS Lorena e BRS Bibiana, adaptadas ao terroir brasileiro e voltadas para vinhos finos, reforçando que pesquisa e terroir caminham juntos.
Queijo: o sabor do Cerrado
No Cerrado Mineiro, o Queijo Minas Artesanal conquistou em 2023 o selo de Indicação Geográfica. Os fatores ambientais, solo, água, clima e vegetação, combinados ao manejo tradicional, conferem ao produto uma textura e um sabor únicos.
Segundo a Emater-MG, o conhecimento local de produção, aliado às pastagens nativas e à qualidade do leite, forma a essência desse terroir que hoje é orgulho mineiro.
Por que o produtor deve conhecer o seu terroir
No agronegócio atual, terroir é ativo estratégico. Conhecer as características da própria região pode ser o diferencial entre competir por preço ou por valor agregado.
Produtos com identidade geográfica bem definida:
- Ganham competitividade no mercado externo
- Recebem prêmios e reconhecimento nacional e internacional
- Tornam-se menos vulneráveis à substituição por produtos genéricos
- Abrem portas para certificações como IGP e DO
Cultivar identidade, colher valor
O terroir não é apenas um conceito bonito para sommeliers e baristas. É uma ferramenta concreta para que o produtor rural brasileiro se diferencie no mercado. Ao compreender e valorizar os elementos naturais e humanos que compõem seu ambiente, ele passa a produzir não só alimentos, mas experiências.
No Brasil, temos todos os ingredientes para sermos uma potência mundial de terroirs: diversidade de solos, climas, culturas e saberes. Resta agora dar o próximo passo.
Escrito por Compre Rural
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ℹ️ Conteúdo publicado pela estagiária Ana Gusmão sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira
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