
Referência nacional em qualidade e especialista em carnes nobres, Roberto Barcellos alerta: o avanço da terminação e da recria exige um novo olhar para a cria e para a genética dos rebanhos. O futuro da carne bovina passa, inevitavelmente, pela base da produção
Nos últimos anos, o pecuarista brasileiro enfrentou um cenário de grandes oscilações no preço da arroba do boi gordo. Depois de um ciclo de alta histórica, impulsionado pela demanda externa e pela restrição de oferta, o setor viu o mercado inverter rapidamente, pressionando margens e testando a eficiência das fazendas. A volatilidade acentuada dos preços, somada ao aumento dos custos de produção, fez com que muitos produtores buscassem alternativas para manter rentabilidade — e a palavra de ordem passou a ser intensificação.
O crescimento dos confinamentos no Brasil é um retrato claro de que a intensificação veio para ficar na pecuária de corte. Nos últimos anos, o país vive uma verdadeira revolução na terminação de bovinos, com estruturas que antes abatiam 5 mil cabeças agora dobrando ou até triplicando sua capacidade.

A busca por eficiência, previsibilidade e padronização de carcaças fez do confinamento — e das tecnologias de terminação intensiva a pasto (TIP) — pilares centrais do novo modelo produtivo. Essa transformação mostra que o produtor brasileiro entendeu que produtividade por hectare é o caminho sem volta para manter rentabilidade e competitividade em um mercado cada vez mais exigente e globalizado.
O Brasil avançou em manejo, nutrição, sanidade e, sobretudo, na capacidade de produzir mais carne por hectare. Mas esse movimento trouxe uma nova e inevitável pergunta, levantada por quem entende profundamente do assunto.

“Nunca se falou tanto em terminação, mas e a cria?”
Roberto Barcellos, referência nacional em qualidade de carne e especialista em carnes nobres, chama atenção para uma mudança estrutural na pecuária de corte brasileira.
“Olha que interessante isso. Nunca se falou tanto em exportação de carne. Nunca se falou tanto em consumo de carne bovina. Nunca se falou tanto em terminação. Confinamento de 5 mil cabeças está indo para 10 mil cabeças, de 10 mil cabeças está indo para 20 mil cabeças. Nunca se falou tanto em TIP. Hoje, no estado do Mato Grosso, a quantidade de terminação intensiva a pasto já é maior que a quantidade de boi confinado. Só que não entra na estatística. Só que para eu ter uma TIP eu preciso do boi magro.”
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Barcellos destaca um ponto que, para muitos, passa despercebido. Enquanto o Brasil fala em aumentar produtividade, ampliar confinamentos e expandir exportações, há um elo da cadeia que não acompanha esse ritmo: a cria.
“Nunca se falou tanto em intensificação de recria. Pergunto para vocês, quem está falando em cria? Da onde vai vir o bezerro para atender essa intensificação na recria, essa intensificação na terminação para esse aumento da demanda de carne?”, provoca o especialista.

A conta vai chegar: o bezerro mais caro da história
O alerta de Barcellos é direto: a pecuária está prestes a viver um novo ciclo de valorização do bezerro. Segundo ele, a escassez de oferta deve se refletir em preços recordes nos próximos anos.
“Só que isso vai nos trazer um problema. Vocês estão preparados para pagar num bezerro a arroba do boi mais 50%, 60%, 70%? É o que vai acontecer. Olhem para o preço hoje e no ano que vem vocês vão ter saudade do preço de hoje. 2027 será o pico. Estamos falando de R$ 650 a arroba do bezerro.”
Essa previsão se apoia em fundamentos claros: o aumento do abate de fêmeas nos últimos anos, a expansão da terminação intensiva e o baixo investimento em genética e eficiência reprodutiva na base da produção. O resultado é um descompasso entre oferta e demanda de bezerros, que deve pressionar os custos em toda a cadeia.
Genética: a chave para diluir o custo e garantir o futuro
Se o bezerro será o “novo ouro” da pecuária brasileira, a resposta para enfrentar essa valorização está na tecnologia. Para Barcellos, o único caminho para diluir o custo crescente é investir em animais geneticamente superiores, capazes de transformar nutrição e manejo em ganho de peso e qualidade de carcaça.
“Temos tecnologia para isso? Para diluir esse quilo do bezerro? Só vai ter um bezerro que vai ter a competência de diluir esse preço. A arroba do bezerro. Ou o quilo do bezerro. Vezes 15 ou vezes 30. Só vai ter um animal que vai ter essa condição de diluir. É o animal da genética” – enfatizou o especialista.
Em outras palavras, o futuro da pecuária de corte passa por criar melhor para produzir mais. O desafio não é apenas intensificar, mas equilibrar a cadeia, garantindo que a base — a cria — acompanhe o ritmo da terminação e da exportação.
A mensagem é clara: se o Brasil quer seguir como potência global da carne bovina, precisa valorizar o bezerro e investir em genética como estratégia de sobrevivência e competitividade.
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