EUA: Menor rebanho da história pode mudar o mercado mundial da carne

Ciclo norte-americano se alinha ao do Brasil, trazendo impactos globais no mercado da carne bovina. Especialista prevê expansão modesta e cheia de obstáculos

Os Estados Unidos vivem atualmente o menor rebanho bovino de sua história recente, um marco que pressiona a oferta de carne, influencia preços internos e externos e coloca os pecuaristas diante do desafio de reconstruir o plantel. O ciclo pecuário norte-americano, por sua vez, guarda grande semelhança com o brasileiro: ambos atravessam fases de retenção e descarte de matrizes de forma quase sincronizada, o que gera efeitos conjuntos sobre a oferta global de carne bovina, impactando exportações, custos de produção e margens de rentabilidade em duas das maiores potências do setor.

É nesse contexto que o analista sênior da RaboResearch Food & Agribusiness, Lance Zimmerman, analisou os próximos passos da pecuária americana, descrevendo a retomada como uma “subida calculada”.

A lenta retomada do rebanho

Segundo Zimmerman, a fase de abate de vacas já ficou para trás, e agora a retenção de fêmeas começa a ganhar espaço. “O ciclo do gado nos EUA entrou oficialmente em modo de reconstrução, mas essa recuperação não será uma disparada — está se moldando como uma escalada lenta e estratégica”, afirmou.

Entre 2016 e 2022, gargalos no processamento de carne, seca persistente, custos elevados de alimentação, escassez de mão de obra e os efeitos da pandemia comprimiram as margens do sistema de cria. Embora parte dessas pressões tenha se aliviado, outras podem voltar à tona conforme os números do rebanho comecem a crescer.

De acordo com o Rabobank, em 1º de janeiro de 2026 o inventário de vacas de corte dos EUA deve alcançar 28 milhões de cabeças, um aumento tímido de 200 mil em relação ao ano anterior. Para o ano seguinte, o crescimento não deve passar de 500 mil animais. Até lá, portanto, o rebanho permanecerá relativamente estável.

O crescimento mais relevante está previsto a partir de 2027, estendendo-se até o início da década de 2030. Mesmo assim, o pico esperado ficará entre 500 mil e 1 milhão de cabeças abaixo do recorde de 2019 — o que, segundo Zimmerman, não necessariamente representa algo negativo.

Eficiência compensa menor número de vacas

Os ganhos de produtividade do setor são tamanhos que, mesmo sem superar os 30,5 milhões de vacas, a produção total de carne pode alcançar um novo recorde histórico. Isso significa que a oferta per capita de carne bovina nos EUA poderá voltar a níveis não vistos há mais de duas décadas.

Apesar disso, ampliar o rebanho em 2,5 milhões de cabeças será uma tarefa árdua. A cautela dos produtores é evidente: pesquisa da Farm Journal State of the Beef Industry mostra que apenas 47% planejam expandir seus rebanhos nos próximos cinco anos — quatro pontos percentuais abaixo do ano anterior.

pecuaria do brasil eua e australia com bois
Imagem gerada por IA

Obstáculos no caminho

O principal entrave está nos custos. Desde cercas e equipamentos até novilhas de reposição, os preços seguem em alta. E a volatilidade desses insumos compromete o planejamento financeiro, reduz o fluxo de caixa e torna as margens de lucro ainda mais incertas.

Outro ponto crítico é o acesso a pastagens. O preço da terra continua subindo, enquanto restrições ambientais e a expansão urbana limitam as oportunidades para os pecuaristas.

Zimmerman também chama atenção para os entraves regulatórios: “A burocracia e as exigências de conformidade já consomem tempo e recursos significativos”, disse. Além disso, mudanças nas políticas comerciais e novas regras tornam o setor ainda mais complexo, exigindo dos produtores constante adaptação.

No pano de fundo, permanece um problema estrutural: o envelhecimento dos pecuaristas e a escassez de mão de obra, fatores que alimentam a sensação de exaustão no setor.

O desafio dos EUA é claro: reconstruir seu rebanho sem comprometer a rentabilidade, em um ambiente de custos elevados, pressões regulatórias e mudanças estruturais no campo. Embora o futuro aponte para ganhos de eficiência e produção recorde, a retomada será lenta e estratégica, exigindo paciência e adaptação dos pecuaristas.

O impacto, no entanto, vai muito além das fronteiras americanas. Com o ciclo pecuário norte-americano alinhado ao brasileiro, o mercado global da carne bovina pode viver uma década de volatilidade, marcada por preços firmes e movimentos cautelosos dos dois maiores players do mundo.

Com informações do State of the beef industry – relatório 2025 do Farm Journal

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