Fazenda Volkswagen é condenada empresa a pagar R$ 165 milhões por trabalho escravo

Sentença histórica expõe violações trabalhistas em propriedade da montadora, conhecida como Fazenda Volkswagen, durante a ditadura militar

A Justiça do Trabalho condenou a Volkswagen do Brasil a pagar R$ 165 milhões em indenização por danos morais coletivos, após reconhecer a prática de trabalho análogo à escravidão na Fazenda Vale do Rio Cristalino, também conhecida como Fazenda Volkswagen, em Santana do Araguaia, no sul do Pará. Os fatos ocorreram entre as décadas de 1970 e 1980, quando a propriedade pertencia à montadora.

Segundo a decisão, os trabalhadores foram submetidos a servidão por dívida, violência, vigilância armada e condições degradantes, como alimentação insuficiente, alojamentos precários e ausência de assistência médica, especialmente em casos de malária.

O Ministério Público do Trabalho (MPT) reuniu depoimentos que revelam como os trabalhadores eram recrutados em estados vizinhos por intermediários conhecidos como gatos. Ao chegarem à fazenda, precisavam comprar mantimentos e materiais básicos em uma cantina, acumulando dívidas que os impediam de sair.

Um ex-trabalhador relatou: “Ficávamos num barracão de lona, fazíamos nossa comida, bebíamos água do córrego. Não podíamos sair nem comunicar com nossa família”.

O processo envolvendo a Fazenda Volkswagen e a decisão judicial

O caso veio à tona em 2019, após denúncias e documentos coletados pelo padre Ricardo Rezende Figueira, da Comissão Pastoral da Terra. A ação civil pública foi ajuizada pelo MPT em dezembro de 2024 e embasada em testemunhos, inquéritos policiais e relatórios oficiais.

O juiz concluiu que o modelo de produção da fazenda configurava o núcleo do trabalho escravo contemporâneo. A condenação impõe à Volkswagen não apenas a indenização milionária, mas também a obrigação de reconhecer publicamente sua responsabilidade e pedir desculpas aos trabalhadores e à sociedade.

O valor será destinado ao Fundo Estadual de Promoção do Trabalho Digno e de Erradicação do Trabalho em Condições Análogas à de Escravo no Pará (Funtrad/PA).

Posição da Volkswagen

A montadora declarou que discorda da decisão e irá recorrer. Em nota, destacou que cumpre rigorosamente as leis trabalhistas e reafirmou seu “compromisso inabalável com a dignidade humana e a responsabilidade social”.

Contexto histórico

A Fazenda Volkswagen possuía 139 mil hectares, quase o tamanho da cidade de São Paulo, e foi implantada com apoio da Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) durante a ditadura militar (1964-1985). A iniciativa fazia parte da política de ocupação da Amazônia, voltada à derrubada da floresta para criação de gado.

Esse não é o primeiro episódio em que a empresa é acionada judicialmente por condutas ligadas ao período militar. Em 2020, a Volkswagen assinou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) e destinou R$ 36,3 milhões a ex-funcionários perseguidos e torturados em São Bernardo do Campo (SP).

Repercussão e impacto da decisão

O procurador do MPT Rafael Garcia classificou a condenação como “a maior já aplicada pela Justiça brasileira em casos de trabalho escravo contemporâneo”. Ele enfatizou que se trata de uma sentença histórica, destacando que esse tipo de crime é imprescritível, podendo ser punido mesmo décadas depois.

A decisão reforça a necessidade de responsabilidade social das empresas, especialmente em regiões de alta vulnerabilidade social e ambiental como a Amazônia, e coloca em evidência um dos capítulos mais sombrios da relação entre grandes corporações e o processo de expansão econômica durante a ditadura.

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