Gigante da cana, São Martinho investe mais de R$ 1 bilhão em etanol de milho; veja onde

Usina da São Martinho ampliará capacidade e tornará o milho responsável por até 20% da receita; grupo aposta em novos combustíveis como biometano e SAF, mas reforça compromisso com a cana-de-açúcar

A São Martinho, uma das maiores produtoras de cana-de-açúcar e etanol do país, anunciou um investimento de R$ 1,1 bilhão na ampliação de uma planta industrial em Goiás para a produção de etanol a partir do milho. O movimento marca a entrada mais robusta da companhia nesse mercado em franca expansão, que já representa 20% da produção nacional de etanol, mas sem abrir mão da tradição canavieira que sustenta sua operação há décadas.

Segundo Felipe Vicchiato, CFO da São Martinho, em entrevista ao InvestNews, o foco da companhia não é substituir a cana, mas diversificar a base de receitas com uma nova fonte complementar. “Quando estiver operando em plena capacidade, a planta deverá responder no futuro por cerca de 20% da nossa receita”, afirmou o executivo, reforçando que não há planos para repetir o modelo em outras unidades. “A expectativa é parar somente nesta planta adicional, não fazer mais nenhum investimento do tipo”, completou.

Expansão estratégica e desafios logísticos

A usina em ampliação terá capacidade para processar 635 mil toneladas de milho por ano, gerando cerca de 270 mil m³ de etanol e subprodutos como DDGS (farelo de milho usado na nutrição animal) e óleo de milho. O projeto será executado em três fases, com início das operações previsto para o segundo semestre de 2027.

Apesar do otimismo, Vicchiato reconhece os desafios logísticos dessa nova frente de atuação. Ao contrário da cana, que utiliza o próprio bagaço como biomassa, o etanol de milho depende do cavaco de madeira, geralmente de eucalipto, para alimentar as caldeiras. Isso eleva custos e exige planejamento florestal de longo prazo — são necessários cerca de sete anos para a maturação do eucalipto. “Para se ter uma ideia, a gente teria que plantar, a grosso modo, uns 8 mil hectares de eucaliptos para abastecer uma planta que mói 500 mil toneladas de milho”, exemplificou o CFO.

Para contornar parte do problema, a São Martinho pretende aproveitar excedentes do bagaço de cana já disponíveis em suas operações, convertendo energia antes vendida à rede elétrica para abastecer a nova planta. “Eu consigo usar essa energia que hoje vendo no grid para tocar a minha planta de milho”, disse o executivo ao InvestNews.

Nova demanda e oportunidades regionais para São Martinho

O avanço do etanol de milho no Brasil também é impulsionado por medidas que aumentam a mistura de etanol na gasolina. A elevação do percentual de 27% para 30% amplia o consumo potencial do biocombustível em cerca de 1 bilhão de litros. Para Vicchiato, há espaço para subir a mistura até 35% no futuro, caso a expansão do setor continue. “Se os investimentos em etanol de milho continuarem, teremos possibilidade de chegar a 35%”, afirmou.

Além disso, o aumento da produção no Centro-Oeste traz competitividade ao abastecimento das regiões Norte e Nordeste, que antes dependiam da importação de etanol dos Estados Unidos. Segundo o engenheiro agrônomo Alcides Torres, diretor da Scot Consultoria, “até pouco tempo atrás, era praticamente impossível abastecer o Norte com etanol nacional; agora, essa relação com a gasolina tende a melhorar”.

Contudo, especialistas alertam para os riscos de um crescimento acelerado demais. Para Adriano Pires, sócio-fundador do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), um aumento desordenado da oferta pode desequilibrar o mercado. “O governo precisa ter uma política que reconheça o etanol de milho como complementar ao de cana, evitando excesso de produção que prejudique consumidores, produtores e usinas”, afirmou.

Sustentabilidade e novas frentes: biometano e combustível de aviação

O investimento no milho se soma a outras iniciativas da São Martinho em busca de novas receitas sustentáveis. Em 2023, a empresa anunciou a construção de uma planta de biometano com R$ 250 milhões em aportes, localizada na unidade Santa Cruz, em Américo Brasiliense (SP). A estrutura processará 100% da vinhaça gerada na usina e produzirá cerca de 15 milhões de m³ por safra, atualmente em fase de comissionamento.

A companhia também estuda ingressar no mercado de combustíveis sustentáveis de aviação (SAF). Ainda em fase inicial, o plano é certificar o etanol para fornecimento às plantas que produzirão o combustível. “Será um novo mercado para o nosso produto. O desafio é estar pronto com o etanol certificado para vender às plantas de SAF”, destacou Vicchiato ao InvestNews.

A força da cana e o futuro híbrido do etanol

Mesmo com o novo ciclo de investimentos, a São Martinho reforça que a cana continuará sendo o pilar central da companhia. O etanol de milho é visto como complemento estratégico, especialmente em um cenário de crescimento da demanda por biocombustíveis e pressão por sustentabilidade. O modelo híbrido, combinando cana, milho, biogás e biometano, consolida a empresa entre as líderes da transição energética no agronegócio.

“O futuro está na diversificação inteligente. O milho não substitui a cana — ele amplia as possibilidades e fortalece a matriz de bioenergia brasileira.”

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