
Crise foi agravada pela queda global nos preços de fertilizantes, alta do gás natural e insucesso em plano extrajudicial; Justiça de São Paulo aprova o pedido de recuperação judicial da Unigel
A Unigel, uma das maiores petroquímicas e fabricantes de fertilizantes do Brasil, entrou oficialmente em recuperação judicial após não conseguir estabilizar suas finanças mesmo com um plano de reestruturação extrajudicial homologado em 2024. O pedido foi aprovado pela 2ª Vara de Falências de São Paulo, sob o comando do juiz Paulo Furtado de Oliveira Filho, e envolve uma dívida declarada de R$ 5,47 bilhões.
O colapso financeiro da companhia, que é a segunda maior petroquímica do país — atrás apenas da Braskem —, é resultado de uma combinação de fatores: a queda abrupta nos preços internacionais de fertilizantes e produtos químicos, o aumento dos custos do gás natural, a competição com produtos importados mais baratos e o insucesso de negociações anteriores com credores. A Justiça aceitou o pedido em 10 de outubro de 2025, marcando o início de um novo capítulo na tentativa de reestruturação da empresa fundada há quase seis décadas.
Linha do tempo da crise
Ano | Evento-chave | Detalhes |
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2021 | Anúncio da planta de ácido sulfúrico | Projeto em Camaçari (BA), avaliado em US$ 135 milhões, prometia gerar 600 mil toneladas por ano. |
2022 | Alta dos fertilizantes e expansão | Setor impulsionado pela guerra na Ucrânia elevou o Ebitda da empresa, com destaque para as plantas de amônia arrendadas da Petrobras. |
2023 | Crise com o gás natural | Alta do gás inviabilizou a operação das plantas de amônia. A Unigel suspendeu parte da produção e iniciou recuperação extrajudicial, com dívida de R$ 4 bilhões. |
2024 | Plano extrajudicial aprovado | Incluiu conversão de dívida em capital, com credores liderados pela Pimco ficando com 50% de participação. |
Agosto de 2025 | Tutela cautelar de urgência | Justiça suspendeu cobranças por 60 dias enquanto a empresa buscava mediação com credores. |
Outubro de 2025 | Pedido de recuperação judicial | Dívida total declarada sobe para R$ 5,4 bilhões, valor da causa é de R$ 17,5 bilhões. |
Motivos da crise da Unigel
O pedido de recuperação judicial detalha as principais causas do colapso financeiro:
- Queda abrupta nos spreads internacionais de produtos químicos e petroquímicos;
- Excesso de oferta global, sobretudo pela expansão produtiva da China;
- Aumento dos custos do gás natural e outras matérias-primas, tornando inviável a produção de amônia e acrílicos;
- Atrasos em financiamentos que agravaram o desequilíbrio de caixa;
- Concorrência com importados mais baratos, que levou à paralisação das duas plantas de acrílicos em abril de 2025.
Além disso, a planta de hidrogênio verde, anunciada como um projeto inovador e sustentável, teve suas operações suspensas — equipamentos avaliados em US$ 60 milhões permanecem armazenados na Europa, sem uso.
Tentativas de recuperação frustradas
Nos últimos dois anos, a Unigel buscou diversas alternativas para evitar o colapso.
Após captar R$ 460 milhões em crédito durante a recuperação extrajudicial, tentou um novo aporte de US$ 100 milhões com a ARC Capital, mas o negócio não se concretizou.
Mesmo assim, as operações não conseguiram se recuperar da queda nos preços dos fertilizantes e do endividamento em dólar, afetado pela alta dos juros globais.
O juiz Paulo Furtado, ao deferir o pedido, destacou que a recuperação visa “preservar as atividades produtivas e o emprego”, garantindo tempo para que a companhia apresente seu plano de reestruturação aos credores.
Impactos e perspectivas
Atualmente, a Unigel emprega milhares de trabalhadores e mantém operações em Camaçari (BA) e Santo André (SP), além de unidades na Bahia e em Sergipe. A empresa informou, em nota oficial, que a recuperação judicial “tem por objetivo viabilizar a readequação da estrutura de capital e a preservação das atividades industriais”.
A companhia aposta na entrada em operação da planta de ácido sulfúrico, prevista para dezembro de 2025, como um possível ponto de virada. A expectativa é de geração de caixa de até US$ 60 milhões anuais, o que poderia reduzir parte do passivo e estabilizar o fluxo de caixa.
No entanto, analistas do setor avaliam que o desafio é grande: o mercado de fertilizantes segue pressionado pela superoferta internacional e pela queda da demanda agrícola global. Segundo a S&P Global Ratings, que rebaixou o rating da Unigel para nota D em agosto, a empresa corre risco de não honrar suas obrigações sem uma injeção significativa de capital.
Situação atual da dívida da Unigel na recuperação judicial
Categoria de Dívida | Valor (R$ bilhões) | Observações |
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Dívida total declarada | 5,47 | Inclui compromissos financeiros e operacionais. |
Empréstimos bancários | 1,0 | Parte da dívida fora da recuperação extrajudicial. |
Fornecedores e credores comerciais | 0,75 | Suprimento de matérias-primas ameaçado por inadimplência. |
Valor da causa (no processo) | 17,5 | Inclui obrigações futuras e garantias intercompanhias. |
Contexto no setor
A crise da Unigel ocorre num momento delicado para o mercado global de fertilizantes. Desde o fim do “boom” de preços provocado pela guerra na Ucrânia, os valores da ureia, amônia e potássio despencaram. No Brasil, concorrentes como Yara, Mosaic e EuroChem também revisaram planos de expansão.
A falência de uma das maiores produtoras nacionais preocupa o setor, pois a Unigel representa parte relevante da capacidade de produção local de nitrogenados, vitais para o agronegócio brasileiro.
Com a aprovação judicial, a Unigel entra em um novo capítulo de sua história de quase 60 anos. O processo será determinante para definir o futuro da produção nacional de fertilizantes e para medir até que ponto o Brasil conseguirá manter sua independência em insumos agrícolas estratégicos.
O desafio, agora, é reconquistar a confiança de credores, fornecedores e investidores, enquanto o setor observa se o grupo conseguirá emergir dessa crise sem comprometer definitivamente sua estrutura produtiva.
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