
A decisão sobre o bloqueio foi tomada pelo desembargador José Eustáquio Lucas Pereira e mantém o entendimento da primeira instância.
São Paulo, 6 – O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG) negou um agravo de instrumento interposto pelo Grupo Montesanto Tavares para ter acesso a sacas de café e recursos financeiros dados em garantia a bancos. O grupo havia solicitado o uso desses ativos para manter suas operações, mas a Justiça entendeu que eles não são bens essenciais e, por isso, devem permanecer bloqueados. Em outra frente, o tribunal também considerou encerrada a discussão sobre a prorrogação da proteção judicial cautelar que o grupo havia obtido antes do deferimento do pedido formal de recuperação.
A decisão sobre o bloqueio foi tomada pelo desembargador José Eustáquio Lucas Pereira e mantém o entendimento da primeira instância. Segundo ele, café pronto para venda não pode ser considerado equipamento ou insumo de produção. “As sacas de café e os recursos financeiros dados em alienação fiduciária sequer podem ser consideradas bens essenciais, pois se referem ao produto final da atividade empresarial”, escreveu o magistrado, citando a fundamentação já apresentada pelo juiz de primeira instância.
Na argumentação, o grupo havia dito que o café precisa ser combinado em lotes com características específicas para atender os contratos, e que a retenção de parte do estoque atrapalha essa montagem. As recuperandas alegaram que “as vendas de café se fazem com a combinação de produtos armazenados, de modo a atender o padrão exigido de cada cliente, e que a apreensão de uma certa quantidade de sacas de café por um de seus credores desestabiliza e compromete a organização das entregas”.
A Justiça, porém, rejeitou esse ponto. O relator entendeu que o pedido não demonstrava risco imediato à atividade da empresa e, por isso, não se justificava autorizar o uso dos bens antes do julgamento definitivo. Na decisão, o desembargador apontou que “a parte agravante não demonstrou o perigo da demora necessário à concessão do efeito suspensivo pleiteado”, e que as empresas apresentaram “fundamentação genérica, sem apontar de forma concreta qual o perigo de dano”.
Em outra decisão, o mesmo desembargador declarou perda de objeto no recurso apresentado pela Cargill contra uma decisão anterior que havia prorrogado, por mais 30 dias, a suspensão das execuções judiciais contra o grupo. Essa prorrogação havia sido concedida em caráter cautelar, enquanto ainda não havia decisão sobre a abertura da recuperação judicial.
Como o processo principal foi aceito no fim de março e trouxe uma nova suspensão de 180 dias, o tribunal entendeu que não fazia mais sentido julgar o pedido da Cargill. “A superveniência de decisão no pedido principal que abarca e substitui os efeitos da decisão agravada caracteriza a perda superveniente do objeto recursal, tornando inútil a análise do mérito do agravo”, escreveu o desembargador.
Segundo ele, nesse tipo de situação, a análise do recurso se torna inútil. A própria Cargill reconheceu isso nos autos, e os administradores judiciais nomeados para acompanhar o processo também opinaram pelo não conhecimento do recurso.
O Grupo Montesanto Tavares tenta reestruturar dívidas que somam R$ 2,13 bilhões, a maior parte com bancos. O maior credor é o Banco do Brasil, com R$ 742 milhões, seguido por Santander (R$ 159 milhões), Banco Pine (R$ 154 milhões), além de Bradesco, BTG Pactual, Itaú e Cargill.
A companhia enfrenta dificuldades desde a safra de 2021/22, quando eventos climáticos comprometeram parte da produção no sul de Minas Gerais. Para honrar contratos de exportação, a empresa teve que comprar café no mercado a preços elevados, o que aumentou seu endividamento.
Mais recentemente, as pressões vieram da valorização internacional do café, que subiu mais de 120% em um ano, e da desvalorização do real frente ao dólar, o que elevou os custos com operações de hedge. Entre maio e novembro de 2024, o volume exposto a derivativos saltou de R$ 50 milhões para R$ 470 milhões, representando 158% do saldo de recebíveis, segundo documentos apresentados no processo.
Um dos pontos mais delicados do caso é a inclusão de contratos de adiantamento sobre câmbio (os chamados ACCs) na recuperação. Esses contratos, em geral, não entram no processo porque são vinculados a exportações futuras. O grupo, no entanto, afirma que no seu caso os ACCs eram usados como empréstimos comuns. “Na verdade, os ACCs no Grupo Montesanto não são verdadeiros ACCs. São empréstimos comuns. Quando você vai olhar as operações, fica claro: não tem exportador, não tem cliente indicado, não tem importador, não tem lugar de pagamento”, disse o advogado do grupo, Daniel Vilas Boas, em entrevista recente ao Broadcast Agro.
A Justiça aceitou esse argumento em decisões anteriores e manteve esses contratos protegidos pelo “stay period” – o período de blindagem contra cobrança judicial. Credores, no entanto, devem continuar tentando reverter essa interpretação. Com o processamento da recuperação já autorizado pela Justiça, o grupo tem até meados de maio para apresentar seu plano de reestruturação, que precisará ser votado pelos credores em assembleia.