Mais peso, mais lucro? Pecuária nos EUA apostam em superbois e desafiam genética

Tendência de peso recorde desafia genética, sustentabilidade e coloca a pecuária nos EUA em alerta para manter competitividade global.

A pecuária de corte nos EUA está passando por uma transformação silenciosa, porém decisiva: a padronização de carcaças muito mais pesadas, com projeções que chegam a 680 kg por animal. Esse número, que há poucos anos parecia uma exceção de frigorífico, começa a ganhar força como novo objetivo estratégico para toda a cadeia produtiva, do criador ao processador.

Esse movimento não é aleatório. Ele nasce de um cenário onde cada centavo de rentabilidade por animal é extraído ao máximo, e onde a escala e eficiência operacional dos frigoríficos impõem um modelo de produção baseado em animais mais pesados, com maior rendimento de carcaça e maior aproveitamento industrial.

Uma carcaça de 680 kg representa aproximadamente um animal vivo com mais de 1.100 kg, o que exige um período de terminação mais longo e um protocolo nutricional intensivo, geralmente baseado em confinamento e dietas altamente energéticas. A lógica por trás disso está na diluição de custos fixos: quanto mais carne um animal entrega ao final do ciclo, menor o custo relativo por quilo produzido.

Esse modelo também atende melhor à indústria de desossa, que opera com linhas automatizadas e precisa de padrões estáveis de carcaça, com volume suficiente para atender grandes demandas de mercado. Em outras palavras, bois maiores significam menos variabilidade e mais previsibilidade nos cortes oferecidos ao varejo e à exportação.

Para produzir animais com esse potencial, toda a estrutura da fazenda precisa ser adaptada. A começar pela genética: touros com alto ganho médio diário, conformação muscular adequada e conversão alimentar eficiente se tornam essenciais. A seleção na pecuária de corte nos EUA passa a priorizar animais com maior capacidade de crescimento sem comprometer a eficiência biológica.

Outro ponto-chave é a nutrição de precisão. Animais que permanecem mais tempo em sistema de terminação exigem dietas ajustadas para evitar problemas como acidose, ganho excessivo de gordura ou doenças metabólicas. A gestão sanitária também se intensifica, já que o risco de morbidade aumenta com o prolongamento do ciclo de engorda.

Além disso, o aumento no tamanho das carcaças impõe desafios logísticos e estruturais: desde o manejo dos animais na fazenda e no transporte até a adaptação de equipamentos nos frigoríficos, que precisam suportar pesos muito acima da média histórica.

O foco em carcaças superpesadas traz um efeito cascata sobre todo o sistema, especialmente nas propriedades voltadas para cria. Vacas matrizes maiores são naturalmente mais exigentes em termos nutricionais, consomem mais e podem gerar pressão sobre áreas de pastagem e recursos ambientais.

Há também o risco de que a busca por peso excessivo comprometa a fertilidade e longevidade das matrizes, criando um ponto de desequilíbrio entre o ganho no abate e a eficiência reprodutiva do rebanho.

Embora o boi de 680 kg esteja sendo projetado como o futuro da indústria americana, esse modelo não é isento de críticas. Especialistas em genética e sustentabilidade alertam que há limites biológicos e econômicos para o crescimento animal, e que uma estratégia focada apenas em peso pode levar à subotimização da cadeia como um todo.

Ainda assim, a tendência segue firme. Grandes confinamentos, integradores e frigoríficos apostam que animais maiores serão essenciais para manter a rentabilidade, preencher lacunas de oferta e atender um mercado global cada vez mais exigente em volume, padronização e eficiência.

A era do boi gigante já começou nos EUA — e seus efeitos devem se espalhar por toda a cadeia da carne bovina nas próximas décadas.

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