Senadora apela para entrega de títulos de assentados como solução do conflito no campo, em partido declaradamente contra invasão; “MST está fora de moda”, diz Tereza Cristina defendendo titulação.
Durante evento de filiação da prefeita de Campo Grande, Adriane Lopes, ao Partido Progressistas, a senadora pelo PP, Tereza Cristina defendeu a entrega de títulos como solução para os conflitos agrários, enquanto o partido é declaradamente contra invasões.
Em coletiva na noite de quinta-feira (1º de junho), na Capital de Mato Grosso do Sul, a então senadora considerou “inadmissível” estarmos discutindo conflitos agrários em 2023. “Nós temos hoje equipamentos e formas muito mais modernas de inclusão social para pessoas que querem ir para a terra, ir para os assentamentos. Eu acho que MST está fora de moda”, disse.
Exemplificando sua posição, ela comenta que Mato Grosso do Sul possui uma agricultura familiar tão extensa, que se encaixa na categoria de possibilitar a entrega de títulos.
Agenda de titulação
Considerado um dos “carros-chefe” do último governo, o programa de reforma agrária nacional foi transformado de forma radical, com foco resumido em entregar títulos de propriedade aos antigos beneficiários, desde a gestão de Michel Temer (MDB) e acentuada por Jair Bolsonaro (PL).
Analisados os números, em 2011 eram empregados R$ 930 milhões para aquisição de terras, que caiu para R$ 2,4 mi em 2022, além de que a verba discricionária do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) caiu mais da metade no mesmo período.
Dados da última gestão mostram que entre 2019 e 2021 o Governo Federal emitiu quase 4 mil documentos, entre provisórios e definitivos. Em maio de 2021, houve presença presidencial em Terenos, para entrega de títulos para 307 famílias, de um total de 1,1 mil na ocasião.
Passado apenas 10 meses, Jair Bolsonaro voltou ao Mato Grosso do Sul, dessa vez para entrega de mais de 2,6 mil títulos, que trouxe até mesmo o ex-ministro de Estado Chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, General Augusto Heleno, para Ponta Porã, cidade localizada no interior do Estado, próxima à fronteira com Pedro Juan Caballero, Paraguai.
“Quem admira o MST com toda essa propaganda nesse Governo em momento que não tem nem CNPJ. Eu acho que eles [famílias que buscam uso social das terras por ocupações] podem fazer o que quiserem, mas invasão de terra não”, argumentou ontem (1º de junho) Tereza Cristina.
Ocupação, invasão e titularidade
Sendo que o assentamento de reforma agrária é um conjunto de unidades agrícolas, ou seja, para famílias sem condições econômicas de adquirir um imóvel rural, é necessário que cada agricultor resida e explores o lote, com o desenvolvimento de atividades produtivas diversas, para um dia ter seu direito definitivo.
Como detalha o Movimento Sem Terra, há diferença entre ocupação e invasão, que se diferenciam pelo uso social da terra, explicado por um dos coordenadores nacionais do MST.
“Não cumprir a função social significa dizer que a terra tem degradação do meio ambiente, tem trabalho escravo e/ou ela não produz. Esta terra, tendo um destes três elementos, ela deve, como a nossa lei manda, ser desapropriada para fins da reforma agrária”, disse.
Como esclarece outra integrante da coordenação do movimento, Kelli Mafort, desde a invasão europeia – da qual o Brasil já celebrou 200 anos de independência – perpetuou-se uma concentração de terra antidemocrática, já que ficou determinado que as terras seriam privadas à quem pudesse comprar, ou públicas ao Estado.
“Invasão é coisa de elite. Ocupação é o direito legítimo dos povos de restituir aquilo que lhes foi roubado. Essa luta [datada a partir de 1888] é que dá origem às ocupações de terra que depois vai ganhando força na luta por reforma agrária nas Ligas Camponesas, e que faz surgir movimentos importantes”, diz.
Marco temporal
Outro ponto, que culmina em conflito, tem ligação direta com a tese do chamado Marco Temporal, que – após aprovação na Câmara dos Deputados – chegou na manhã de hoje (02) ao Senado Federal.
Vale ressaltar que, como abordou o Correio do Estado, o Marco temporal – caso aprovada mudança na legislação – pode acabar com 26 terras indígenas que estão regularizadas e impedir que outras 34 terras reivindicadas pela população nativa saiam do papel.
Sobre isso, Tereza Cristina foi questionada pela TV Senado, expondo que não se trata de um tema que os senadores tem “vivo” na cabeça, apesar de ressaltar a importância e, por isso, diz que o primeiro momento será de conversa.
Para ela, o Congresso precisa debater e votar, já que o Supremo está colocando o tema na pauta em junho, sendo necessário um aprofundamento por parte dos senadores.
“Se o Marco Temporal, se a data é 5 de outubro, na data da promulgação da Constituição, acho que isso vai trazer segurança jurídica para os dois lados, e paz no campo”, argumentou.
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