Nova era: Como o setor de máquinas pesadas se adapta rumo à neutralidade das emissões

Setor agrícola e de construção mostra que a rota para a emissão zero será uma transição flexível, e não uma substituição abrupta do diesel

Enquanto a corrida global pela neutralidade de carbono se intensifica, muitos decretaram o fim do motor de combustão interna. No entanto, para o setor de máquinas pesadas agrícolas e de construção, a realidade é muito mais complexa. O motor a diesel, pilar dessa indústria, não está sendo substituído; está sendo reinventado e integrado a um ecossistema de novas tecnologias.

A feira Systems & Components, parte da Agritechnica em Hannover, Alemanha, serviu como vitrine para essa abordagem de “tecnologia aberta”. A mensagem foi clara: o futuro não era uma escolha única, mas uma transição flexível onde múltiplas soluções coexistiriam.

O Pilar Inabalável: Por que o Diesel Ainda Reina

Não se pode ignorar a realidade do campo e da construção: mais de 80% do mercado de veículos fora de estrada ainda depende do diesel. A razão é simples: robustez, baixos custos operacionais e a rapidez no reabastecimento são incomparáveis.

Especialistas do setor estimam que, mesmo em 2035, mais de três quartos das máquinas com potência superior a 56 quilowatts ainda sairão da fábrica com um motor a diesel. Petra Kaiser, da DLG (Associação Alemã de Agricultura), confirma que os motores de combustão interna continuarão sendo essenciais. O desafio, portanto, não é eliminar o diesel da noite para o dia, mas sim torná-lo mais limpo e, ao mesmo tempo, preparar o terreno para seus sucessores.

Caminho 1: Otimizando o Presente

Antes de abandonar o diesel, a indústria está focada em aperfeiçoá-lo. O dilema é que os padrões de emissão, como o Fase V da UE, exigem sistemas complexos de pós-tratamento de gases.

Os expositores da Systems & Components mostram duas frentes de otimização:

  1. Pós-tratamento Avançado: Empresas como a Deutz estão refinando componentes-chave para tornar os motores intrinsecamente mais limpos.
  2. Eficiência de Combustão: Conceitos como o “modo de mistura pobre” (que usa excesso de ar) reduzem emissões. Para solucionar a ligeira perda de agilidade desse modo, a Liebherr desenvolveu um sistema que recupera energia hidráulica para acionar um compressor de ar, garantindo que o motor responda instantaneamente quando o operador exigir potência.

Caminho 2: A Ponte dos Biocombustíveis

A rota mais rápida para uma redução drástica de CO₂ é a adoção de combustíveis renováveis. Essas soluções “drop-in” permitem que frotas existentes se tornem mais sustentáveis quase imediatamente.

  • HVO (Óleo Vegetal Hidrotratado): Produzido a partir de resíduos, o HVO é o favorito, podendo reduzir as emissões de CO₂ em até 90% em comparação com o diesel fóssil. A escavadeira Liebherr LH60M, por exemplo, já pode ser abastecida com HVO100.
  • Etanol: Com sua alta octanagem, o etanol é uma solução viável para motores de ignição por faísca de alta potência, como demonstrado pelo motor conceito de 9,0 L da John Deere.

Caminho 3: Os Sucessores – Hidrogênio e Amônia

A grande aposta para a descarbonização a longo prazo é o hidrogênio verde. Mikael Lindner, da MAN Engines, vê os motores a combustão de hidrogênio (H2-ICE) como uma abordagem promissora para acelerar a transição.

A maior vantagem do H2-ICE é a sinergia com a infraestrutura e a produção existentes:

  • Produção Ágil: A Dra. Petra Mayer, da Deutz, destaca que o novo motor a hidrogênio TCG 7.8 H2 (220 kW) será produzido na mesma linha de montagem dos motores convencionais.
  • Componentes Compartilhados: O motor MAN H4576 (500 hp) compartilha cerca de 80% de seus componentes, como bloco e virabrequim, com sua versão a diesel. Jan-Oliver Röhrl, da Bosch, estima que mais de 90% das tecnologias de fabricação existentes podem ser reaproveitadas.

A amônia também surge como candidata, com a Liebherr desenvolvendo um protótipo bicombustível que usa amônia verde como fonte primária de energia.

A Estratégia Final: A Era da Flexibilidade

O verdadeiro futuro da propulsão não está em um único combustível, mas na flexibilidade. A indústria está migrando para motores “multicombustível” e “bicombustível”, que oferecem aos clientes uma transição segura. Um motor pode operar com diesel ou HVO hoje, e ser adaptado para hidrogênio ou metanol no futuro.

A inovação em componentes, como os novos injetores AFI-LP da Bosch, é o que torna isso possível, permitindo que um mesmo sistema lide com diferentes combustíveis. Essa adaptabilidade garante que a robusta maquinaria pesada possa continuar operando enquanto o mundo caminha, passo a passo, para um futuro livre de emissões.

Escrito por Compre Rural

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ℹ️ Conteúdo publicado pela estagiária Ana Gusmão sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira

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