O império do Avestruz Master: o golpe de R$ 1 bilhão que enganou 40 mil brasileiros

Com sede em Goiás, a Avestruz Master prometia riqueza com a criação da ave africana, mas revelou-se uma das maiores pirâmides financeiras da história do país, deixando prejuízo estimado em R$ 1 bilhão e milhares de vítimas sem ressarcimento.

O que começou como um sonho de prosperidade no campo terminou como um dos maiores escândalos financeiros do país. No fim dos anos 1990 e início dos 2000, a Avestruz Master Agropecuária Importação e Exportação Ltda. prometia transformar Goiás no centro mundial da criação da ave africana, símbolo de uma nova era da agropecuária brasileira. Mas por trás da promessa de lucro rápido, estava um elaborado esquema de pirâmide financeira, que deixou mais de 40 mil pessoas com prejuízos que somam R$ 1 bilhão.

Em 1998, a empresa inaugurou uma fazenda em Bela Vista de Goiás, com 3,8 mil aves e investimentos iniciais de R$ 50 milhões, além de R$ 16 milhões para a construção de um frigorífico que nunca foi concluído. À época, o cenário era favorável: o Brasil ainda enfrentava os reflexos da crise da “vaca louca” na Europa, e o avestruz despontava como alternativa lucrativa — a carne era tida como saudável, o couro e as penas valorizados, e até os ossos tinham uso comercial.

A Avestruz Master aproveitou esse entusiasmo. Por cerca de R$ 4,6 mil, o investidor podia comprar um casal de aves de seis meses e, em 18 meses, receber R$ 12 mil. A promessa de retornos de até 10% ao mês era suficiente para convencer famílias inteiras a vender propriedades e aplicar todas as economias. Cerca de 30 mil investidores eram goianos, enquanto o restante se espalhou por outros estados.

Em pouco tempo, a empresa afirmava possuir dez filiais, 22 franquias e 30 fazendas em todo o país, além de fábrica de ração, frigorífico e até escritório nos Estados Unidos. Era o auge da euforia.

A Polícia Federal revelou que, em 2004, a Avestruz Master gastou mais de R$ 4 milhões em publicidade, enquanto destinava apenas R$ 100 mil à alimentação das aves. A empresa aparecia em comerciais de TV, jornais e outdoors, exibindo uma imagem de solidez e prosperidade.

No entanto, os pagamentos começaram a atrasar e os lucros prometidos deixaram de ser depositados. O Ministério Público Federal (MPF) iniciou uma investigação e descobriu que o grupo operava um esquema de “lucros fictícios”: as dívidas eram contabilmente convertidas em lucros, permitindo que os sócios retirassem dinheiro do caixa.

Em dezembro de 2004, por exemplo, a empresa pagou R$ 6,9 milhões aos sócios, todos provenientes de “lucros” inexistentes. Era, nas palavras do perito da Polícia Federal, “o negócio perfeito no papel, mas sem dinheiro em caixa para honrar dívidas”.

Com o avanço das investigações, o MPF solicitou o bloqueio de contas, sequestro de bens e apreensão de veículos de luxo — incluindo um Hummer avaliado em R$ 1,5 milhão e uma moto Harley-Davidson. Foram confiscadas seis fazendas, cinco em Bela Vista de Goiás e uma em Senador Canedo.

Mesmo negando os problemas financeiros e alegando falhas operacionais, a Avestruz Master não resistiu. Em 2006, a Justiça decretou a falência da empresa e ordenou a prisão temporária de sete dirigentes, entre eles o fundador Jerson Maciel da Silva, seus filhos Jerson Júnior e Patrícia Áurea, e o genro Emerson Correa.

Jerson Maciel morreu em 2008, aos 68 anos, enquanto cumpria prisão domiciliar. Dois anos depois, seus herdeiros foram condenados em primeira instância a penas que chegavam a 38 anos, posteriormente reduzidas em 2013. Em 2019, os dois filhos e o genro voltaram a ser presos por crimes contra o sistema financeiro.

Em abril de 2022, o Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) extinguiu o processo criminal contra 18 acusados por fraudes na gestão da empresa em processo de falência, alegando prescrição dos crimes após mais de 14 anos de tramitação. A decisão encerrou qualquer possibilidade de punição aos envolvidos.

Império do “ouro das penas”

Hoje, o que resta do império do “ouro das penas” são alguns imóveis em disputa judicial e cerca de R$ 400 mil depositados em conta vinculada à massa falida. A atual administradora, Juliana Tomazini, informou que ainda existem trabalhadores a serem ressarcidos, com limite de 150 salários mínimos, mas o pagamento depende de decisões judiciais.

Mais de duas décadas depois, o caso da Avestruz Master continua sendo lembrado como um alerta sobre o perigo dos investimentos sem transparência. O que começou como uma promessa de modernização agropecuária se transformou em um símbolo de ambição desmedida, ausência de fiscalização e fragilidade jurídica.

Para milhares de vítimas, restaram apenas os documentos de contratos e a memória amarga de um sonho frustrado — aquele em que o avestruz, símbolo de um futuro próspero, acabou enterrando economias, famílias e esperanças em um dos maiores golpes financeiros da história do Brasil.

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