Proposta do Governo de taxar LCIs e LCAs pode encarecer o crédito rural e afetar o preço dos alimentos

“Essa medida pode desestruturar o financiamento agrícola e afetar toda a cadeia produtiva, do campo à mesa do consumidor”, diz advogada.

Uma nova proposta do Governo Federal de taxar os rendimentos de Letras de Crédito Imobiliário (LCIs) e Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs) tem gerado preocupação entre especialistas e produtores rurais. O impacto pode ir além do mercado financeiro, atingindo diretamente o bolso do consumidor e toda a cadeia produtiva do agronegócio.

“Essa medida pode desestruturar o financiamento agrícola e afetar toda a cadeia produtiva, do campo à mesa do consumidor”, diz a advogada especialista em Direito Agrário e do Agronegócio Márcia de Alcântara, integrante do escritório Celso Cândido de Souza Advogados.

Pesquisadora da EPAMIG explica as vantagens da varrição do café

Atualmente, as LCAs representam uma das principais fontes de financiamento para o setor agropecuário. Segundo dados do Banco Central, somente na safra 2023/2024, esse mecanismo respondeu por 38,9% do crédito agrícola concedido no país — um setor que representa quase um terço do Produto Interno Bruto (PIB) nacional.

Com a proposta do governo de tributar em 5% os rendimentos das LCAs, a expectativa é de fuga de investidores, aumento no custo de captação dos recursos e, consequentemente, encarecimento do crédito para os produtores rurais. Economistas estimam que o custo final para o produtor pode subir de 0,5 a 1,5 ponto percentual.

O que são LCIs e LCAs e por que isso importa para o agro

As LCIs e LCAs são títulos de renda fixa emitidos por instituições financeiras para captar recursos destinados, respectivamente, aos setores imobiliário e agropecuário. No caso das LCAs, o funcionamento é simples: o investidor empresta dinheiro ao banco, que o repassa em forma de crédito a produtores rurais, cooperativas e empresas do agronegócio.

Além das LCAs, o setor conta com outros instrumentos financeiros, como o CRA (Certificado de Recebíveis do Agronegócio), CDCA (Certificado de Direitos Creditórios do Agronegócio) e o CDA e WA (Certificado de Depósito Agropecuário e Warrant Agropecuário), que são emitidos em conjunto. Todos esses mecanismos compõem uma engrenagem essencial para sustentar o financiamento do setor.

Embora o impacto atinja todo o setor, pequenos e médios produtores tendem a sentir os efeitos de forma mais severa. “O produtor rural depende desses mecanismos para ter acesso a crédito em condições viáveis. Sem isso, o custo de produção sobe, e a capacidade de investimento e competitividade diminui, principalmente para quem já enfrenta maiores dificuldades de acesso ao crédito”, explica Márcia.

A especialista lembra ainda que o encarecimento do crédito rural pode comprometer a produção de alimentos e, em última instância, afetar o preço final ao consumidor, com reflexos diretos na inflação e na segurança alimentar do país.

Risco à segurança alimentar e à economia

Para Márcia, a proposta de taxação também fere princípios constitucionais e legais que garantem o direito à alimentação, à saúde e ao desenvolvimento nacional. “O crédito rural é reconhecido na legislação brasileira como um instrumento fundamental para o bem-estar social e a paz no campo”, destaca.

Estudos internacionais reforçam a preocupação. Segundo dados da FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), o fortalecimento do setor agrícola é essencial para garantir a segurança alimentar mundial, em um cenário de crescimento populacional e aumento da demanda por alimentos.

A advogada destaca que a diversificação de produtores e alimentos fortalece redes locais, estimula a economia regional e protege a soberania alimentar. “Pequenos agricultores, com apoio técnico e políticas públicas adequadas, podem ser verdadeiros guardiões da biodiversidade e da segurança alimentar”, diz.

O que os produtores podem fazer

Diante desse cenário, a mobilização do setor é vista como essencial. “Os produtores precisam se unir, fazer valer a voz do agro e pressionar o Congresso Nacional a rejeitar essa medida”, defende Márcia, lembrando que a proposta só entra em vigor após aprovação legislativa.

Além disso, alternativas financeiras como o barter — modalidade de troca por insumos ou produtos — e o crédito rural tradicional, devem ser avaliadas com cautela, sempre considerando o custo-benefício e o impacto no planejamento da safra.

Para enfrentar esse período de incertezas, contar com assessoria jurídica especializada é mais do que recomendável, segundo a advogada. “Existem muitas entrelinhas nos contratos de financiamento. Um bom suporte jurídico pode evitar surpresas desagradáveis, garantir a revisão de cláusulas abusivas e orientar o produtor na busca por soluções seguras e sustentáveis”, conclui.

VEJA TAMBÉM:

ℹ️ Conteúdo publicado por Myllena Seifarth sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira

Quer ficar por dentro do agronegócio brasileiro e receber as principais notícias do setor em primeira mão? Para isso é só entrar em nosso grupo do WhatsApp (clique aqui) ou Telegram (clique aqui). Você também pode assinar nosso feed pelo Google Notícias

Não é permitida a cópia integral do conteúdo acima. A reprodução parcial é autorizada apenas na forma de citação e com link para o conteúdo na íntegra. Plágio é crime de acordo com a Lei 9610/98.

Siga o Compre Rural no Google News e acompanhe nossos destaques.
LEIA TAMBÉM