Protestos de agricultores na França podem afetar o Brasil; entenda

Caso essas manifestações ganhem força, há previsões de possíveis riscos para as relações comerciais, adicionando obstáculos ao acordo entre o Mercosul e a União Europeia; entenda

Os contínuos protestos dos agricultores na França podem resultar no aumento do protecionismo na Europa, impactando as transações de produtos agropecuários do Brasil para o continente. Caso essas manifestações ganhem força, há previsões de possíveis riscos para as relações comerciais, adicionando obstáculos ao acordo entre o Mercosul e a União Europeia.

Marcos Jank, coordenador do centro de pesquisa Agro Global do Insper, expressa a crença de que os protestos poderiam conduzir ao acréscimo de barreiras não tarifárias por parte da França, visando evitar a entrada de produtos agrícolas estrangeiros. Isso agravaria a situação para o acordo comercial entre a UE e o Mercosul.

Os agricultores franceses protestam contra o aumento dos custos de produção, especialmente o diesel utilizado nas máquinas agrícolas, e as exigências ambientais decorrentes do Pacto Verde. Eles argumentam que as regras são mais rigorosas para os agricultores franceses do que para seus colegas brasileiros e de outros países com os quais mantêm relações comerciais, conforme afirmado por Jank.

Essas mesmas queixas resultaram em manifestações similares na Bélgica, Polônia e Romênia na semana passada.

REUTERS/YVES HERMAN

Ontem, com a disseminação dos protestos em Paris, o Ministério da Agricultura e o presidente Emmanuel Macron buscaram acalmar a situação, indicando que vão examinar as reivindicações dos agricultores.

Na tarde desta terça-feira (30), o primeiro-ministro da França, Gabriel Attal, comunicou que os agricultores receberão subsídios relacionados à Política de Apoio Agrícola (PAC, na sigla em francês) até 15 de março. Além disso, ele terá reuniões com representantes da Federação Nacional dos Sindicatos dos Agricultores (Fnsea) nesta noite.

Entretanto, o panorama permanece incerto, colocando o governo francês diante do desafio de conciliar as demandas dos produtores com as expectativas dos consumidores, conforme avaliação da professora e pesquisadora do Agro Global do Insper, Camila Dias.

Ela destaca que a agricultura desempenha um papel crucial na geração de receitas para a economia francesa, o que pode angariar maior apoio popular e sustentar a intensificação dos protestos, ao contrário do que ocorreu na Alemanha, onde a adesão da população foi limitada por um período curto.

No caso de adesão, a pesquisadora também identifica uma ameaça ao acordo Mercosul-União Europeia. Segundo ela, o risco pode aumentar à medida que os protestos se disseminem e ganhem força em toda a Europa. Ela destaca que a aceitação popular pode ter um papel crucial no desdobramento dos protestos.

Outras demandas que podem impactar as negociações do acordo comercial incluem a busca pela soberania alimentar por parte dos mais de 12 mil agricultores franceses que participam dos protestos, bem como a alegada falta de interesse de Macron no comércio entre os blocos, de acordo com as observações de Dias.

No que diz respeito ao Brasil, é prematuro prever as consequências, mas a pesquisadora não exclui a possibilidade de uma perda de competitividade na França caso as reivindicações dos agricultores locais sejam atendidas nos próximos dias pelo governo. No entanto, ela ressalta que o interesse significativo dos consumidores europeus por alimentos orgânicos e sustentáveis também pode complicar os planos do setor agropecuário francês.

“Neste momento, surge um paradoxo, onde os produtores franceses expressam incômodo e insatisfação diante do aumento das demandas ambientais, temendo a perda de competitividade para os produtos nacionais. Contudo, emerge uma questão mais filosófica sobre o que significa ser sustentável para a Europa”, observa Dias.

Por outro lado, o economista-chefe da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), Antônio da Luz, percebe os protestos como mais um episódio, não sendo o fator principal para obstaculizar o acordo Mercosul-UE. Segundo ele, os agricultores franceses têm criticado o acordo há bastante tempo.

Uma consequência secundária e problemática seria a imposição de mais barreiras ao Brasil em um futuro próximo. “Quanto maior o subsídio concedido aos produtores europeus, em geral, mais requisitos os países do bloco impõem. Isso resulta em um aumento, a curto prazo, das imposições para países em desenvolvimento, como Argentina e Brasil”, afirma.

O governo francês busca aplacar as manifestações

“Competição justa” foi a justificativa apresentada pelo primeiro-ministro da França, Gabriel Attal, nesta terça-feira, ao anunciar medidas mais rigorosas de controle sobre produtos estrangeiros. Essa iniciativa, que visa acalmar os ânimos dos agricultores que persistem nos protestos em Paris e outras cidades da França, ocorre enquanto manifestações com reivindicações semelhantes ganham força na Bélgica e podem se estender para a Espanha na quarta-feira (31/01).

Em visita de Estado à Suécia também nesta terça-feira, o presidente Emmanuel Macron contribuiu para suspender as negociações do maior acordo comercial da União Europeia, que o Parlamento Europeu havia encaminhado em 2019 após 20 anos de negociações.

Na ocasião, Macron argumentou que não existiam condições políticas para prosseguir com o acordo diante dos protestos. Enquanto isso, barricadas persistem nas vias de acesso à capital francesa.

Na semana passada, após o Ministério da Agricultura da França anunciar medidas para o setor numa tentativa de conter a intensificação dos protestos, os agricultores aumentaram a presença de tratores nas rodovias e, por meio da FNSEA, indicaram que tais ações são insuficientes para atender às demandas do setor.

Escrito por Compre Rural

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ℹ️ Conteúdo publicado pela estagiária Ana Gusmão sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira

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