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Venda de gado gordo: “Audiência” de um técnico de campo

A pecuária de corte passa por transformações em todos os setores, é preciso ficar atento para alguns pontos na venda do gado gordo

Por Fernando Furtado Velloso

A comercialização do gado para abate é um tema importante e decisivo para a viabilização dos sistemas pecuários, desde os mais simples, extensivos e familiares de pequeno porte, até as operações mais empresariais, de grande tecnificação e escala.

Não me refiro somente ao valor obtido pelos animais, mas também ao sistema de comercialização, liquidez e agilidade na venda e diferenciação de valores para produtos diferenciados. Vou tentar abordar alguns temas de minha vivência e “audiência” como técnico de campo no RS.

Escala

Como em tantos negócios, quem tem mais negocia melhor. No gado gordo não é diferente. O volume de animais abatidos anualmente é um importante diferencial de um fornecedor para uma indústria ou intermediário (corretor). Não se iluda: quem tem grande volume de animais de qualidade média deve estar negociando melhor (ou sendo mais bem pago) do que quem tem poucos animais de qualidade superior. Pode não ser sempre assim, mas deve ser na maioria das vezes. O volume e a constância de abates são atributos que põem valor no gado antes de falarmos da qualidade dos animais (idade, raça, terminação etc).

Peso vivo ou rendimento

A maioria das indústrias do RS trabalha (preferencialmente) com a compra “a rendimento”, ou seja, pagando pelo valor do peso da carcaça na indústria (ex.: R$ 10,00/kg de carcaça do novilho). Frigoríficos menores, abatedouros e açougues ainda compram rotineiramente animais para abate pelo peso vivo, ou seja, pelo peso de fazenda (ex.: R$ 5,00/kg vivo).

Pergunta: “Mas, Velloso, se um novilho médio rende 52% ou mais, é melhor vender a rendimento, pois o preço do kg vivo passa para R$ 5,20 ao invés de R$ 5,00.” Não é verdade?

Resposta: É verdade, mas nem sempre acontece assim. Ocorre de alguns animais do lote não atingirem o rendimento e também de procedimentos realizados nos frigoríficos não serem padronizados entre as diferentes indústrias, levando à uma grande variação no rendimento de carcaça. Entram aí temas antigos como esfola, retirada da ferida de sangria, remoção de contusões, pesagens etc. Logo, são frequentes as frustrações ao receber o romaneio de abate. Depois do gado abatido, carcaças reprovadas ou rendimentos baixos, não há muito o que fazer. Não há como recuperar ou discutir essa informação do passado. Aí reside grande parte da relação de desconfiança entre produtor e indústria.

Peso vivo ou classificação de carcaças

Naturalmente, a venda a peso vivo não pressupõe classificação de carcaça. Pesa-se o gado na fazenda e o valor da venda está definido. A rendimento, além do peso final da carcaça, consideram-se também itens relacionados à classificação de carcaças e à remuneração final (dentição, conformação e cobertura de gordura). Essa classificação também é tema gerador de grandes discussões, pois, apesar de serem padrões com limites bem definidos, são avaliações feitas visualmente por profissionais das indústrias, sendo assim, passíveis de erros, diferenças de critérios e até de erros de processamento ou lançamentos de dados.

A teoria nos diz que bons lotes (acima da média) deveriam ser vendidos a rendimento para alcançarem remuneração superior ao peso vivo. Porém, essa situação somente ocorre quando os animais são bem apartados e a classificação, realizada de forma correta. Para não criticar somente as práticas dos frigoríficos, gosto de citar um ditado que diz que alguns pecuaristas “se aprontam” antes do gado. Deve-se levar em conta também que a exigência de cobertura de gordura (terminação) de um frigorífico exportador é diferente de um voltado ao mercado doméstico, que também se diferencia de um comércio local (supermercado, açougue etc). Logo, a vaca gorda dos grandes frigoríficos é diferente da vaca gorda do comércio local. Nenhum dos dois está errado. Cabe ao produtor entender qual negócio é mais conveniente ou mais remunerador.

Produto diferenciado e venda diferenciada

Existe uma queixa comum entre pecuaristas em relação a produtos diferenciados. “Meu gado era todo Angus, dente de leite, engordado em confinamento e padronizado, e não consegui valor superior a um novilho comum”. Pois bem, essa é uma situação frequente para quem oferece um produto superior sem ter um canal diferenciado de comercialização. Esse não é o tipo de produto para negociar a balcão, mas muitos tentam fazer. Os fornecedores desse produto (normalmente com custo de produção mais elevado) obtêm sucesso na venda desses animais premium quando possuem algum tipo de contrato ou acerto especial com seus clientes, sejam frigoríficos, sejam comércios locais. Volta-se a ter a necessidade de uma escala mínima que permita abates rotineiros (semanais, quinzenais etc). Logo, a minha impressão pessoal é que novilho premium não é o modelo para pecuaristas pequenos ou médios em escala de abate.

Não são incomuns situações de produtores que estão obtendo em acordos ou contratos especiais de 20 a 25% mais por novilhos de qualidade do que para um novilho padrão, todavia, nesse negócio, estão sendo comercializados vários itens: volume de oferta, constância de abate, programação de abates, qualidade superior à média etc. Portanto, não estamos falando de um negócio parecido com a tradicional venda balcão de boi gordo (o gado está pronto e vou ofertar).

Considerações finais

  • Não invente moda na comercialização. Avalie qual a característica de seu produto e trabalhe pela colocação mais adequada para ele.
  • Se a venda é de lotes grandes (totalizando altos valores por operação) e a rendimento, organize-se para acompanhar os abates diretamente ou por uma pessoa qualificada para tal função. Os eventuais problemas serão acompanhados (visualizados), a classificação de gordura será assistida e o custo desse dia de trabalho justifica-se financeiramente. Os antigos dizem que a faca fica mais leve em um abate assistido.
  • Se a venda é de lotes pequenos (totalizando valores não tão significativos por operação), priorize a venda a peso vivo.
  • Se a pretensão do pecuarista é direcionar a produção para produtos especiais, diferenciados etc., busque antecipadamente canais e garantias para colocação diferenciada, pois esses produtos têm custos agregados e necessitam maior remuneração.
  • A qualidade segue sendo imperativa nesse negócio. Dedique-se a compreender o que é qualidade para o seu cliente

Espero que este texto tenha contribuído para algumas reflexões sobre o assunto venda de gado gordo. São apenas algumas reflexões e percepções de alguém que pode presenciar, vivenciar e ser “audiência” de carregamentos, abates e discussões calorosas com romaneios em mãos.

* Publicado na coluna Do Pasto ao Prato, Revista AG (Março, 2018)

Fonte: Assessoria Agropecuária

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