Após anos de crescimento de casos, estudo dos EUA confirma que a alergia desencadeada pela picada de carrapato pode ser fatal e exige mudanças permanentes na alimentação.
A ideia de ser picado por um carrapato e nunca mais conseguir comer carne vermelha parece enredo de ficção científica. Mas essa condição é real, crescente e já tem consequência fatal confirmada. Trata-se da Síndrome Alfa-Gal, uma alergia desencadeada pela picada de determinadas espécies de carrapatos, especialmente o carrapato-estrela-solitário, capaz de reprogramar o sistema imunológico humano e transformá-lo em um detector permanente de uma molécula presente na carne de mamíferos.
Nos últimos anos, a doença deixou de ser considerada restrita ao sudeste dos Estados Unidos e passou a ser reconhecida como uma condição global, com registros em diversos continentes. O avanço preocupa cientistas e autoridades sanitárias, sobretudo após o primeiro caso de morte confirmado em decorrência de uma reação alérgica ao alfa-gal.
A síndrome ocorre quando um carrapato infectado injeta na corrente sanguínea humana uma molécula chamada galactose-alfa-1,3-galactose (alfa-gal) — um carboidrato presente em mamíferos, mas não produzido pelo organismo humano. A partir daí, o corpo passa a enxergar essa substância como um invasor.
Picada inicial do carrapato
Ao picar, o carrapato libera saliva contendo alfa-gal, desencadeando o processo de sensibilização.
Reprogramação do sistema imunológico
O organismo, ao identificar a molécula estranha, passa a produzir anticorpos IgE específicos contra o alfa-gal, como explicam o DermNet e a National Geographic.
Reação ao consumo de carne
Meses depois, quando o indivíduo ingere carne bovina, suína, ovina, laticínios ou medicamentos que utilizam gelatina de origem animal, o corpo identifica novamente o alfa-gal e dispara uma resposta alérgica que pode ir de leve a fatal.
As manifestações podem ocorrer de 2 a 6 horas após o consumo de carne, o que dificulta o diagnóstico e aumenta o risco de negligência médica inicial.
Sintomas leves
- Urticária
- Coceira
- Inchaço
- Náuseas
- Cólicas abdominais
- Diarreia
Sintomas graves (Anafilaxia)
- Dificuldade para respirar
- Queda brusca da pressão arterial
- Inchaço da garganta
- Perda de consciência
A anafilaxia pode levar à morte caso não haja intervenção imediata.
Um estudo dos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) mostra que os casos suspeitos de síndrome alfa-gal aumentaram substancialmente desde 2010, inclusive em estados onde o carrapato-estrela não era considerado comum. Isso indica que:
- a espécie pode estar expandindo sua área de ocorrência;
- outras espécies de carrapatos também são capazes de transmitir a condição — hipótese reforçada por estudos internacionais;
- a síndrome está subdiagnosticada e pode ser mais comum do que se imagina.
A professora Lee Rafuse Haines, da Universidade de Notre Dame, reforça que já não se trata de uma alergia regional: “Espécies de carrapatos em outros continentes também foram identificadas como capazes de causar sensibilização ao alfa-gal”, escreveu em artigo no The Conversation.
Caso chocou os EUA e reforça gravidade da condição
Pesquisadores da UVA Health, liderados pelo renomado alergologista Thomas Platts-Mills, identificaram o primeiro óbito diretamente causado pela síndrome alfa-gal.
A vítima era um homem de 47 anos, saudável, morador de Nova Jersey, que morreu poucas horas após comer um hambúrguer em uma reunião familiar, em 2024. O caso havia sido registrado como “morte súbita e inexplicada”, mas a família buscou nova análise.
A sequência dos fatos envolvendo a picada do carrapato
- Duas semanas antes da morte, o homem teve um episódio agudo após comer carne bovina durante um acampamento.
- Acordou com fortes dores abdominais, vômitos e diarreia, mas melhorou pela manhã.
- Após o óbito, amostras de sangue foram reavaliadas.
- O especialista Thomas Platts-Mills identificou altíssimos níveis de anticorpos anti-alfa-gal, compatíveis com uma anafilaxia fatal.
Esse é o primeiro caso confirmado em que a reação alérgica ao alfa-gal levou diretamente à morte, consolidando o alerta para médicos e autoridades.
O único tratamento eficaz é eliminar completamente carne vermelha e produtos de mamíferos da dieta, o que inclui:
- carne bovina, suína e ovina
- gelatina
- alguns laticínios
- medicamentos com estabilizantes de origem animal
Em muitos casos, a alergia pode durar anos ou nunca desaparecer, mantendo o indivíduo permanentemente vulnerável.
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