Por que a “Síndrome do Fundador” e a recusa em adotar a governança estão ativamente sabotando o futuro de milhares de propriedades rurais no Brasil
No agronegócio brasileiro, impérios são frequentemente construídos com suor, visão e um profundo vínculo com a terra. O setor é, em sua essência, familiar. Segundo dados do Censo Agropecuário do IBGE, mais de 80% das propriedades rurais no Brasil são classificadas como agricultura familiar ou são geridas diretamente pelo produtor e sua família.
No entanto, há um dado estatístico alarmante que assombra esse modelo: pesquisas de consultorias globais, como a PwC e a Deloitte, indicam que apenas 30% das empresas familiares sobrevivem à transição para a segunda geração. Dessas, somente 15% chegam à terceira, e menos de 5% alcançam a quarta. Siga a leitura e acompanhe o Compre Rural, aqui você encontra informação de qualidade para fortalecer o campo!
Onde falharam os 70% que não passaram o bastão? Embora fatores de mercado existam, a causa raiz de muitos desses fracassos não está na lavoura ou no preço da commodity. Está na psicologia do fundador e na falha de um processo vital: a sucessão.
A “Síndrome do Fundador” e a Ausência de Planejamento
O perfil é clássico: um líder, muitas vezes o patriarca, que ergueu o negócio do zero. Ele é visionário, resiliente e trabalhador, mas com o tempo, o apego visceral ao negócio se transforma em ego. O fundador passa a acreditar que é, e sempre será, indispensável.
Essa mentalidade se reflete em números: um estudo da consultoria Deloitte aponta que menos de 10% dos fundadores de empresas familiares têm um plano de sucessão formalizado e comunicado. O “não largar o osso” é a manifestação de um líder que, por vaidade, se recusa a preparar a própria saída.
Os sintomas dessa síndrome são claros:
- Centralização Absoluta: Nenhuma decisão relevante é tomada sem seu aval, tornando a operação lenta e dependente de um único gargalo.
- Resistência à Inovação: Novas ideias, especialmente de herdeiros ou gestores mais jovens, são vistas como “afrontas”. Enquanto a agricultura 4.0 (IoT, IA, drones) pode gerar aumentos de produtividade superiores a 20%, o gestor centralizador prefere o método “que sempre funcionou”, minando a competitividade da fazenda.
- Micromanagement: O líder se apega a detalhes operacionais mínimos, usando seu conhecimento do passado não para ensinar, mas para justificar seu controle.
O Custo da Vaidade: O Risco Financeiro do Ego
O ego não é apenas um problema de relacionamento; é um risco financeiro tangível. Empresas familiares com gestão centralizada e sem planejamento sucessório claro são vistas como mais arriscadas por credores e investidores. Isso resulta em acesso mais caro ao crédito e menor valuation (valor de mercado) do negócio.
Estudos de mercado indicam que empresas familiares com regras claras de governança e um conselho consultivo formal podem apresentar um desempenho financeiro até 20% superior às que operam de forma centralizada. O ego, portanto, custa caro ao caixa.
Além disso, o custo humano é imenso. Líderes com ego inflado não criam sucessores; eles eliminam a concorrência. Filhos e funcionários talentosos são desmotivados e abandonam o negócio. O resultado é uma “fuga de cérebros” familiar, deixando o fundador isolado e a empresa sem futuro.
O Ponto de Fratura: A Sucessão Impossível
Este é o momento onde os 70% falham. O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) aponta que as principais causas de mortalidade de empresas familiares não são fatores externos, mas sim conflitos internos e a falta de preparo dos herdeiros.
Ambos são sintomas diretos de um fundador que, por ego, não preparou seus sucessores nem mediou conflitos.
Quando esse líder centralizador adoece ou falece, ele leva consigo todo o “mapa da mina”. Sem um plano, o que se segue é o caos:
- O patrimônio pessoal se mistura com o da empresa.
- O inventário se arrasta por anos, paralisando a operação.
- Herdeiros despreparados assumem o controle, muitas vezes em conflito aberto, levando a decisões desastrosas.
A fazenda, que valia milhões, é rapidamente dilapidada, vendida por uma fração do seu valor ou fatiada para pagar dívidas e disputas judiciais.
O Antídoto: Governança como Remédio para o Ego
A cura para o ego destrutivo chama-se Governança Corporativa. Ela substitui o “eu” pelo “nós” e as “regras da minha cabeça” por regras claras e combinadas.
- Separar Família e Empresa (e Patrimônio): O primeiro passo é criar acordos societários e protocolos familiares. O que é da família e o que é da empresa? Herdeiros não são automaticamente gestores; precisam provar competência.
- Planejamento Sucessório Real: A sucessão não é um evento; é um processo. Especialistas recomendam que ele comece de 5 a 10 anos antes da saída efetiva do fundador. Envolve mentoria, delegação de poder real e a aceitação de que o sucessor terá um estilo diferente.
- Criação de um Conselho: Implementar um conselho consultivo, com membros externos, é a ferramenta mais eficaz para “diluir” o poder absoluto do fundador. O conselho força o líder a justificar suas decisões com dados e serve como mediador imparcial.
O maior legado de um produtor rural não é uma fazenda que vale milhões. É uma fazenda capaz de prosperar por gerações sem ele. O sucesso verdadeiro é medido pela transição bem-sucedida. A passagem do “eu” (que resulta nos 70% de falha) para o “nós” (que garante a continuidade) é o único caminho para que o ego não acabe com a fazenda.
Escrito por Compre Rural
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ℹ️ Conteúdo publicado pela estagiária Ana Gusmão sob a supervisão do editor-chefe Thiago Pereira
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