O que faz uma matriz da raça Nelore valer cerca de R$ 8 milhões

Desde o “Vale quanto pesa! É só carne” do ex-presidente Getúlio Vargas a pecuária brasileira evoluiu de forma assombrosa, elegendo o Nelore como grande protagonista

O mercado pecuário tem valorizado cada vez mais os zebuínos com avaliações genéticas positivas, os leilões ocorridos durante a ExpoZebu 2022 movimentam cerca de R$ 100 milhões. As competições da 87ª ExpoZebu também foram um show, recorde de animais e público. Somando os exemplares que se submeteram aos julgamentos, controle leiteiro e exposição nos pavilhões comerciais, cerca de 2.200 animais participaram da maior feira da pecuária zebuína no mundo. O número é cerca de 15% maior na comparação com a última edição presencial do evento.

A Expozebu conta com o prestígio de pecuaristas e políticos há mais de 80 anos. A feira tem a tradição de reunir presidentes desde a época de Getúlio Vargas, inclusive com uma história bastante curiosa do ex-presidente do Brasil como protagonista.

Conta a história que nos anos 50 o gado Zebu desfrutava de grande prestígio no mercado brasileiro, com aceitação crescente, o que elevara a altos patamares o preço de suas matrizes e touros. Convidaram o, então Presidente da República, Dr. Getúlio Vargas. Lá chegando, Dr. Getúlio com seu tradicional chapéu, terno jaquetão e charuto na mão, foi levado pelos organizadores diretamente à baia de um majestoso touro Zebu e, desejando inflar o preço do excelente exemplar, perguntaram ao Dr. Getúlio quanto ele achava que valia. Dr. Getúlio, após dar uma longa baforada, lhes respondeu: – “Vale quanto pesa! É só carne”.

De lá pra cá, tudo mudou. O gado zebu se tornou, de fato, a melhor opção para produção de carne no Brasil, a combinação perfeita entre o Nelore e Brachiaria nos fez um dos maiores produtores e exportadores de carne do mundo.

Se fôssemos avaliar uma vaca Nelore com os olhos de Getúlio, teríamos a seguinte conta. A arroba da vaca gorda, praça São Paulo, é de R$ 280,00. Uma matriz Nelore pode pesar cerca de 1.000kg, com um rendimento de carcaça de 55% nos traria aproximadamente 37@. O que renderia ao pecuarista o valor de R$ 10.360,00. Mas não é o caso.

Viatina-19 FIV Mara Móveis - recorde
Foto: Divulgação

Durante a Expozebu 2022, a vaca Viatina-19 FIV Mara Móveis fez história e é a nova recordista mundial de preços da raça Nelore. A fêmea da Casa Branca Agropastoril e do Nelore Mara Móveis teve 50% de sua propriedade vendidos por R$ 3.990.000,00 para a Agropecuária Napemo (Uberaba, MG), projetando valorização total para R$ 7.980.000,00. É a maior valorização já alcançado por um animal da raça Nelore no mundo.

Viatina 19 campea da Expozebu
Foto: Divulgação

“Estou há dois anos tentando animais desse porte e não consegui porque realmente são animais únicos, você não tem uma dezena de animais desse no mercado, são singulares”, comenta Ney Pereira a revista Globo Rural, da Agropecuária Napemo – mais novo sócio-proprietário da vaca mais cara do mundo. Novo no negócio, ele vinha disputando esses animais com criadores experientes, com mais de trinta anos na atividade.

Viatina 19 ainda bezerra
Viatina-19 FIV Mara Móveis ainda bezerra / Foto: Leandro Souza | Acervo Nelore

“A valorização se deu porque é um indivíduo superior, é uma vaca de conformação praticamente perfeita, bonita de raça, feminina como uma fêmea deve ser e com uma carcaça extraordinária, um comprimento e volume de musculatura impressionante. Considero isso o mais importante, a raça Nelore basicamente é criada a campo e ela transmitirá sua genética para as próximas gerações. Produzir mais carne em menos tempo e espaço deixando a pecuária ainda mais eficiente” – palavras do zootecnista Heitor Lutti Pinheiro Machado, assessor técnico da Casa Branca Agropastoril e quem descobriu a fêmea ainda bezerra.

“A Viatina 19, fêmea jovem, tem em seu pedigree os seis grandes genearcas da raça Nelore: Karvadi, Ludy da Garça, 1646 da MN, Rambo da MN, Fajardo e Iguaçu. Linhagem materna da matriarca Ryatna 12 da Sabiá (bisavó), uma das melhores matrizes da raça de todos os tempos” – disse o selecionador e ex-presidente da ABCZ, Arnaldo Manuel Machado Borges. 

De fato existe mercado para esse tipo de venda. Podemos fazer uma analogia com os jogadores de futebol, eles são negociados por milhões de dólares pois existe um mercado disposto a pagar pelo alto valor do atleta. Óbvio que as biotecnologias tornaram isso possível e facilitaram que as fêmeas tivessem essa valorização, até então só conquistadas pelos machos que sempre tiveram no sêmen, uma grande fonte de receita. Hoje as fêmeas vendem prenhezes, embriões, tudo isso conta na hora da comercialização de uma matriz de alto valor genético.” – explicou o Médico Veterinário Fernando Tannus da Simplesgen Reprodução Animal.

O que faz uma matriz valer tanto?

Se fosse pra responder com uma única palavra, seria: Tecnologia. A transferência de embriões em bovinos tem sido uma importante ferramenta para o melhoramento genético. É por isso também que vem ganhando cada vez mais relevância e espaço no mercado mundial. Basicamente, a técnica consiste na multiplicação do material genético de fêmeas de alto valor, de forma rápida do que o convencional. Além disso, ela facilita o transporte e comercialização de material genético por meio de embriões congelados.

A TE, como é comumente chamada, possibilita a coleta e a transferência de embriões de fêmeas doadoras (animal com maior valor genético) para as receptoras (chamadas de barrigas de aluguel). Dessa forma, uma fêmea que naturalmente produziria apenas um bezerro ao ano, tem a possibilidade de aumentar sua produção em mais de 10 produtos anuais, sem a necessidade de gestação e parto.

Vantagens da transferência de embriões em bovinos

  • possibilidade de gerar mais bezerros anualmente;
  • seleção e aprimoramento genético dos filhotes gerados;
  • multiplicação do material genético de fêmeas de alto valor;
  • comercialização de material genético por meio de embriões congelados;
  • obtenção de descendentes mesmo quando a doadora estiver morta, a partir da criopreservação;
  • aumento das características mais importantes para a produtividade e para a melhoria da caracterização racial do plantel.

Em vez de a vaca produzir o embrião, ele é produzido no laboratório

Outra tecnologia bastante usada é a fertilização in vitro (FIV). Com a transferência de embrião, uma boa vaca consegue produzir em média até os 15 anos de idade. Usando a técnica de FIV, ela produzirá pelo menos, em média, até os 20. Nas duas técnicas, os filhos não se desenvolvem na barriga da matriz de alta qualidade, que é muito cara. Os embriões são transferidos para as chamadas receptoras, ou “mães de aluguel”, que os parem sem transmitir nenhuma característica genética aos bezerros.

A transferência de embriões, fertilização in vitro, juntamente com as demais biotecnologias são as grandes responsáveis pela aceleração o melhoramento genético em bovinos, o caminho da seleção e do melhoramento genético pode ser encurtado em pelo menos três gerações ou cerca de 10 anos de seleção, permitindo rápidos saltos na produção e na qualidade do gado. Transformando uma única fêmea em mãe de centenas de filhos sem precisar necessariamente parir. É por isso que uma matriz pode valer milhões de reais.

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