
“Em tempos de crise, não sobrevive o maior, mas quem melhor se adapta”; o pecuarista brasileiro deve adaptar-se e saber se reinventar
Por Alexandre Bispo* – A partir de 1º de agosto de 2025, os Estados Unidos aplicarão uma tarifa de 50% sobre todas as importações de carne bovina brasileiras — o que, somado à alíquota já existente (cerca de 26,4%), resultará em uma carga efetiva de 76% sobre os produtos do Brasil.
Essa decisão impactou rapidamente o comércio. Entre abril e julho, as importações de carne brasileira despencaram aproximadamente 80%, de 47.800 toneladas para apenas 9.700 toneladas. Estimativas da ABRAFRIGO apontam que, no segundo semestre de 2025, o Brasil poderá perder cerca de US$ 1,3 bilhão em vendas de carne para os EUA.

Rebanho em queda histórica
A pecuária Norte Americana tem desacelerado brutalmente. O rebanho bovino total dos EUA atingiu 86,7 milhões de cabeças em janeiro de 2025, o menor nível desde 1951, a quantidade de fêmeas de corte caiu para 27,9 milhões, o nível mais baixo desde 1961 e apenas 2,92 milhões de novilhas estão prenhas em 2025, um recuo de 1,7% frente ao ano anterior.
Nessa condição de escassez de oferta, o preço da carne disparou. A carne moída, principal insumo para os hamburgers ultrapassou US$ 6,10 por libra (R$ 70/kg) e os cortes nobres já se aproximam dos US$ 11,50 por libra.
Além disso, o bloqueio à entrada de bezerros mexicanos devido à praga New World screwworm (ou bicheira) agravou a crise no abastecimento e fechou a porteira de entrada de um potencial fornecedor por questões agora sanitárias. O parasita infecta animais e até humanos, tem causado preocupação tanto para a saúde animal quanto para a economia. A mosca põe ovos em feridas de animais, e as larvas se alimentam do tecido vivo, podendo levar à morte se não tratadas.
Nos EUA, há um rigoroso controle para evitar a reintrodução dessa praga, erradicada no país desde os anos 1960, mas surtos no México exigem medidas de quarentena e inspeção de gado e animais de estimação na fronteira.

Futuro da pecuária americana
O cenário de recuperação da pecuária americana aos seus melhores patamares anteriores a crise não ocorrerá da noite para o dia.
Analistas indicam que sinais de recuperação devem aparecer apenas a partir de 12 meses, com retenção de novilhas e aumento de nascimentos e a normalização total do mercado pode levar de 2 a 4 anos, considerando o tempo necessário para recompor o rebanho e recuperar áreas de pastagem.
A Realidade Brasileira – Volumes recentíssimos (2023–2024)
- Em 2023, o Brasil exportou cerca de 2,29 milhões de toneladas de carne bovina in natura, estabelecendo um novo recorde.
- Em 2024, a produção total de carne bovina está estimada em 11,365 milhões de toneladas (carcaça equivalente), com exportações previstas em aproximadamente 2,955 milhões de toneladas (cerca de 30% da produção).
Produção por sistema: confinamento x pasto
- Aproximadamente 84% dos bovinos abatidos no Brasil são criados em pasto aberto, enquanto cerca de 16% são confinados ou semi-confinados para acabamento final.
- Para efeito ilustrativo, considerando exportações de ~2,3 milhões de toneladas (2023):
- Exportações de animais criados a pasto seriam cerca de 1,93 milhão de toneladas (~84%).
- Exportações de animais confinados seriam cerca de 0,37 milhão de toneladas (~16%).
No contexto do cenário americano desafiador, esses dados reforçam a capacidade do Brasil de atender tanto às demandas por carne de alto volume e preço competitivo (vinda principalmente da produção a pasto) quanto às exigências de mercados que buscam qualidade superior, maciez e marmoreio (frequentemente provenientes do confinamento ou semi-confinamento).
Palavra final aos pecuaristas brasileiros
Mesmo em um cenário global de instabilidade, o Brasil segue como protagonista no mercado mundial de proteína animal. As tarifas impostas pelos EUA são desafiadoras, sim, mas passageiras. O mundo precisa de carne — e poucos países têm a capacidade produtiva, tecnológica e ambiental que o Brasil possui.
A recomendação para o pecuarista é clara: mantenha o foco na qualidade do rebanho, na gestão eficiente e na rastreabilidade da produção. A valorização da carne brasileira virá, e quem estiver preparado vai colher os melhores frutos.
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O momento exige resiliência, mas a colheita virá para quem plantar com visão de futuro. Quando o mercado se reequilibrar — e isso acontecerá —, as oportunidades serão abundantes para quem manteve a excelência mesmo nos tempos mais desafiadores.
“Em tempos de crise, não sobrevive o maior, mas quem melhor se adapta.” E o produtor rural brasileiro sempre soube se reinventar.
Alexandre Bispo é Economista e Pecuarista
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